'Vamos morrer, vamos morrer!': os relatos dos sobreviventes de Suzano
Aluna da Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano, na Grande São Paulo, uma adolescente de 17 anos, que prefere não ter sua identidade revelada, conta que falava ao telefone com o namorado na manhã desta quarta-feira quando o rapaz ouviu cinco estampidos do outro lado da linha. Ele perguntou à namorada: "Isso é tiro?". A jovem só teve tempo de confirmar antes de desligar o telefone.
Ela ainda não sabia, mas a escola estava sob ataque. Dois atiradores haviam entrado no local e mataram cinco estudantes e duas funcionárias. Antes, já tinham alvejado o dono de uma locadora de veículos, que viria a morrer no hospital, e roubado um dos carros do local. Outras nove pessoas ficaram feridas. Até o início da noite, a polícia confirmava as mortes de 10 pessoas, incluindo os criminosos, que cometeram suicídio ao fim do ataque.
A adolescente conta que estava no corredor, na área externa na escola, quando viu o início de uma correria. "Eu me agachei ao lado de um pessoal. Tentei colocar a cabeça mais para baixo, mas não consegui. Então, deixei uma parte do meu braço exposta para cima para que, caso ele [o atirador] me acertasse, o dano não fosse tão grande", conta ela à BBC News Brasil.
Em meio ao pânico e desespero, recorda a jovem, alguns dos estudantes ainda desconfiavam que fosse uma brincadeira. "Nessa hora, o menino com a máscara [um dos autores do atentado] atirou numa menina e disse que não era", diz.
"Logo abriram o portão para a gente correr, mas quem estava abaixando não conseguiu levantar rápido. O pessoal começou a correr por cima da gente, pisando em todo mundo. Meu rosto ainda está sangrando, machuquei o braço. Eu estou toda roxa", diz ela, mostrando os ferimentos.
A adolescente conta que estava quase na rua quando um homem de camisa vermelha entrou armado na escola pedindo para todos voltarem para dentro. "Não sei quem ele era. A gente só obedeceu. Corri para uma sala com a minha amiga. Pedi para ela fechar a porta, mas ela não quis, então, eu fiquei lá no fundo me protegendo. Só saímos depois, quando uma policial falou que a gente podia."
'Vamos morrer, vamos morrer!'
A estudante de enfermagem Débora Rodrigues, de 35 anos, descobriu por um grupo de WhatsApp que a escola onde sua filha de 17 anos estuda estava sob ataque.
A adolescente estava no banheiro na hora em que tudo aconteceu. "Ela escutou o barulho e achou que fosse bombinha, mas os amigos começaram a gritar: 'Vamos morrer, vamos morrer!'. Ela saiu do banheiro e viu tudo", conta Débora.
A menina ligou, então, para a mãe. "Eu não sabia o que fazer. O tempo parou. Até agora não acredito que ela sobreviveu. É um alívio. Mas ela está muito abalada emocionalmente", diz Débora.
O filho de Sandra Regina Ramos também está traumatizado pelo que viveu nesta manhã. José Vitor Ramos, de 18 anos, foi um dos sobreviventes do ataque. O rapaz está bastante abalado e chora muito, conta sua mãe. Diz a todo instante que vê pessoas mortas com tiros na cabeça.
Ela soube que algo havia acontecido com João Vitor por telefone, quando recebeu a ligação de uma atendente do hospital Santa Maria pedindo que ela fosse com urgência ao local, porque seu filho estava internado ali.
Sandra chegou a perguntar o motivo, mas disseram que só poderiam informar quando ela chegasse. Ela não imaginou que fosse algo grave. "Pensei que ele tinha sofrido uma torção", diz ela.
Isso começou a mudar quando ela notou uma grande movimentação de policiais perto da escola. "Tive a certeza de que meu filho tinha morrido", afirma.
Uma vez lá, ela descobriu que seu filho tinha levado um golpe de machadinha durante o ataque. O jovem foi sozinho ao hospital, que fica a dois quarteirões da escola. A arma ainda estava fincada em seu ombro.
"A namorada dele fugiu para tentar pular o muro, e ele foi em direção à porta. Acabou indo ao encontro dos atiradores. Passou por eles e foi atingido de longe (pela machadinha)", diz Sandra.
João Vitor já passou por uma cirurgia para remover a machadinha, conta sua mãe, e não corre risco de morte. "O único problema do meu filho na escola era ser preguiçoso, nada mais", afirma ela.
'Foi carnificina pura', diz pai de aluna
Wendel Machado, de 42 anos, mora a 50 metros da escola e ouviu os tiros. Logo depois, recebeu uma ligação de sua filha de 16 anos, que estuda ali. Ele saiu correndo de casa para ir até o local.
"Imagina o meu desespero de ver aquele monte de crianças correndo. Cheguei a ver as crianças deitadas. Foi carnificina pura", diz ele.
Machado conta que sua filha e outros estudantes estavam no pátio da escola no momento do ataque. As merendeiras agiram rápido e trancaram varios alunos dentro na cantina.
"Colocaram coisas na porta, uma geladeira. Os caras [atiradores] ainda tentaram entrar, mas não conseguiram. Tenho de parabenizar e agradecer as merendeiras, se não fosse por elas, não sei o que teria acontecido. Elas evitaram uma desgraça maior", diz.
Para receber notícias do Brasil e do mundo, acesse o Messenger do BOL, digite "Notícias" e clique em "Sim". É simples e grátis!