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"Não haverá paz enquanto Putin estiver no poder", diz Vladimir Kara-Murza, principal opositor russo

14/04/2025 13h44

O opositor russo e ex-preso político Vladimir Kara-Murza, disse nesta segunda-feira (14) em entrevista à RFI que enquanto Vladimir Putin estiver no poder, "não haverá paz". De passagem por Paris, o opositor, que passou mais de dois anos na prisão por denunciar a invasão russa da Ucrânia, disse que os russos têm "sede de democracia".  

Vice-presidente da Fundação Rússia Livre, Kara-Murza é considerado o sucessor de Alexei Navalny, morto em uma prisão na Sibéria em fevereiro de 2024, como principal opositor russo. 

Em abril de 2022, ele foi preso e condenado a 25 anos de prisão por alta traição ao criticar a invasão da Ucrânia, mas foi libertado em agosto do ano passado durante uma troca de prisioneiros entre a Rússia e os países ocidentais.  

"Às vezes ainda parece que estou assistindo a um filme. Porque, para dizer a verdade, eu tinha absoluta certeza de que iria morrer naquela prisão na Sibéria. Essa troca foi um milagre. Foi a primeira desde 1986 que libertou não apenas reféns, cidadãos ocidentais que estavam em prisões russas, mas também prisioneiros políticos russos. Para mim, foi uma mensagem muito importante, muito clara e muito forte dos países ocidentais, especialmente Estados Unidos e Alemanha, de que eles entendiam muito bem que os verdadeiros criminosos estavam no Kremlin, [e eram] as pessoas que começaram a guerra na Ucrânia", disse Kara-Murza. 

Para ele, sua libertação foi também uma mensagem forte de solidariedade dos países ocidentais com o povo russo. "Há um milhão de pessoas na Rússia hoje que são contra esta guerra, que são contra o regime autoritário de Vladimir Putin, e é muito importante que o mundo livre tenha se expressado assim", afirma.  

Para ele, o fim da guerra depende totalmente da saída de Putin do poder na Rússia.

Não podemos falar de paz porque ela não vai existir enquanto Vladimir Putin estiver no poder", afirma.

"A única maneira de garantir a paz, a estabilidade e a segurança do continente europeu a longo prazo, é através de uma Rússia democrática, que respeite as leis, os direitos e as liberdades de seus próprios cidadãos e também que respeite as fronteiras dos vizinhos e as normas de comportamento civilizado no mundo", disse. "Porque na Rússia, a repressão interna e a agressão exterior vão sempre juntas", ressaltou.

Acordo com libertação de reféns

Kara-Murza acredita que um "cessar-fogo é possível". Mas para ele, todo acordo de paz deve também pedir a libertação de todos os prisioneiros políticos. "Até agora vemos as negociações entre representantes da administração Trump nos Estados Unidos e o regime de Putin na Rússia. Eles falam de minérios, de volta de empresas americanas à Rússia, do congelamento de bens russos. Eles falam sempre de dinheiro", diz. "Por isso é importante que a União Europeia questione sobre a libertação de todos os presos desta guerra porque há centenas de milhares de vidas humanas perdidas, mas ainda é possível salvar milhares", insiste. 

Ele lembra que, de acordo com organizações de defesa dos direitos humanos, mais de 1.500 pessoas estão presas na Rússia por razões políticas.

Sobre a política atual dos Estados Unidos, o opositor denuncia uma postura "vergonhosa" e "contraprodutiva", porque normaliza a reaproximação e as relações com Vladimir Putin, um líder que está no poder há 25 anos mediante manobras políticas para driblar o limite constitucional vigente na Rússia de dois mandatos, ressalta. "Além disso, ele é um assassino porque sobre suas ordens dois dos principais líderes da oposição democrática russa, Boris Nemsov e Alexei Navalny, foram assassinados", lembra.  

Sede de democracia 

Segundo Kara-Murza, milhões de pessoas na Rússia são contra a guerra e o regime de Putin e "querem um país normal, civilizado, europeu e democrático". "Isso ficou claro no ano passado, durante a farsa que foram nossas eleições presidenciais. Boris Nadejdin, advogado e ex-deputado do Parlamento russo, se apresentou como candidato antiguerra", conta, em referência ao único tentar rivalizar com Putin nas urnas em de março do ano passado, mas que teve sua candidatura rejeitada pela Comissão Eleitoral do país. "A reação da sociedade foi incrível. Vimos em toda a Rússia filas de espera enormes de pessoas que queriam assinar petições para registrar o candidato", lembra. 

"A propaganda de Putin quer que todo mundo acredite que todos os russos apoiam a guerra e o regime. Eles podem fraudar eleições, podem falsificar pesquisas, mas não podem fazer nada com imagens de milhares de pessoas em toda a Rússia que acreditam em um futuro democrático e pacífico", diz. 

Há uma sede democrática na Rússia", afirma.  

Kara-Murza passou dois anos e três meses na prisão e 11 meses em total isolamento, situação que, de acordo com leis internacionais de direitos humanos, representa tortura.

As condições de detenção do opositor eram tão extremas que ele tinha direito a um papel e uma caneta durante apenas meia hora por dia. Ele também não tinha direito de se comunicar com a família. "Vou ser honesto, é muito difícil, nessas condições, não ficar louco", confessa.  

Para se distrair ele aprendeu espanhol. "Eu tinha um livro que lia todo o tempo de manhã até a noite, eu aprendia espanhol e claro, pensava que nunca iria usar porque, como disse, achava que nunca sairia", relembra. "Mas há algumas semanas eu estava em Madri para me encontrar com deputados espanhóis", conta.

Eu me sentia livre mesmo na prisão porque sempre tive minhas convicções, meus princípios. Eles podem me colocar em prisão fisicamente, mas eles não podem prender meu espírito", diz. 

Kara-Murza diz que prefere não pensar que sua vida pode estar ameaçada do governo russo para não cair na "paranoia". "Eu sei que o que eu faço é o certo e que eu estou do lado certo da história. Então eu sei também que o que fazemos com meus colegas da oposição democrática russa é importante e eu vou continuar a fazer apesar de tudo", afirma.  

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