Topo
Notícias

Esquerda acusa Lira de influenciar avanço de cassação de Glauber Braga

Carolina Nogueira, Felipe Pereira e Maria Eduarda Bacellar
do UOL

Do UOL, em Brasília, e colaboração para o UOL, em Brasília

09/04/2025 22h51Atualizada em 09/04/2025 22h51

Partidos de esquerda afirmam que o processo de cassação do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) no Conselho de Ética teve interferência de Arthur Lira (PP-AL), ex-presidente da Câmara dos Deputados. Ele nega.

O que aconteceu

Parlamentares de esquerda dizem que já havia um 'roteiro' para aprovar a cassação. Foram 13 votos a favor e cinco contra. Não houve abstenções.

Publicidade

Glauber virou desafeto de Lira por fazer denúncias sobre o chamado 'orçamento secreto'. O parlamentar chegou a chamar o deputado alagoano de "bandido" e prestou depoimento à Polícia Federal na ação que investiga uma manobra do ex-presidente da Câmara para liberar R$ 4,2 bilhões em emendas.

Relator do processo foi escolhido por Lira. O ex-presidente é reconhecido por usar a força para fazer valer seus interesses e colocar aliados em postos chaves. Deputados ouvidos pelo UOL relatam que Paulo Magalhães (PSD-BA) foi beneficiado pela influência de Lira. Ele teria combinado emendas de acordo com Glauber.

'Bombeiros' tentaram amenizar a punição, sem sucesso. Deputados da oposição, centrão e esquerda atuaram para que a recomendação de Magalhães não fosse a cassação. Houve sugestões de suspensão por alguns meses, mas o relator foi irredutível.

PSOL tentou uma estratégia de tentar adiar a votação por falta de quórum. Contudo, logo no início da sessão já havia deputados suficientes para seguir com o processo. Se eles conseguissem postergar a análise por mais duas semanas, haveria mudança na composição do conselho, já que o atual mandato do colegiado termina no dia 19. Com os novos integrantes, as relatorias dos processos em tramitação seriam redistribuídas.

Tinha um script preestabelecido para que a cassação se operasse. Eles estavam esperando o melhor momento para fazê-lo e, evidentemente, hoje ficou mais do que explícito que a decisão de não convocar a ordem do dia por parte do presidente o envolve também nessa articulação de cassação do mandato operada pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira.
Glauber Braga, ao final da sessão que decidiu pela aprovação do relatório sobre sua cassação

Motta seguiu passos de Lira

O alinhamento do atual presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), com Lira se materializou ao longo do dia. Ele prometeu começar a votar a pauta da Câmara no plenário às 16h. Mas isso levaria à interrupção do Conselho de Ética e livraria Glauber.

Iniciava-se um esforço de enrolar. Deputados de esquerda faziam discursos, entravam com manobras para prolongar a sessão do Conselho de Ética. No plenário, a pauta de votações não era iniciada. A prática também foi adotada por Lira no período em que comandou a Casa.

Motta também adotou o modo offline. A líder do PSOL, Taliria Petrone (RJ), ligou seis vezes para o presidente da Câmara e não foi atendida. Ele cessou a comunicação com a deputada às 11h.

O grupo dos líderes da Câmara também ficou inoperante. Talíria escreveu e ficou sem respostas. Outro ponto que chama a atenção foi o sumiço dos líderes do centrão na terça. Eles não apareceram no plenário nem depois do fim da sessão do Conselho de Ética.

Lira nega acusação de ter interferido na sessão de cassação. Em nota enviada ao UOL, a assessoria do parlamentar ressalta que o processo foi aberto a partir de representação do partido Novo. Acrescenta que Glauber responde a uma "gravíssima acusação". Ele expulsou das dependências da Câmara, aos chutes, um integrante do MBL (Movimento Brasil Livre) em abril de 2024 e foi aberto um processo por quebra de decoro.

Relator teve 'total liberdade'. Segundo a nota de Lira, Magalhães está em seu sétimo mandato e ele teve total liberdade para agir.

Glauber resiste a retratação

O PSOL tentou um acordo com punição diferente. Seria necessário o apoio do MDB ou PSD, partidos que poderiam ter apresentado um relatório alternativo no Conselho de Ética.

As negociações envolviam uma possível suspensão de três meses. As siglas pediram uma retratação de Glauber. Mas o deputado não aceitou.

Time pró-Glauber tinha 20 deputados e reforço do Planalto. Sua defesa incluía toda a bancada do PSOL (14 parlamentares), petistas como Lindbergh Farias e Maria do Rosário, o líder do PSD, Antônio Brito, e a ministra Gleisi Hoffmann.

A sessão durou quase seis horas. Quase só falaram deputados da esquerda, sempre em defesa de Glauber. O único de oposição que se pronunciou contra foi Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que também integra o MBL. O Novo, autor da representação, não compareceu. Bolsonaristas só foram à sessão mais perto do final, quando houve xingamentos e gritaria.

A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), mulher de Glauber, classifica os acenos de acordo como falácia. Ela diz que foi uma cortina de fumaça em um jogo em que as cartas já estavam marcadas.

Agora o risco de perda de mandato é alto. Glauber anunciou que vai fazer uma greve de fome até que o processo seja encerrado.

Ainda cabem recursos. Ele ainda pode recorrer na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), o que disse que vai fazer com a ajuda de seus advogados. Se o colegiado rejeitar seu recurso, o caso será analisado pelo plenário.

Cassação exige maioria absoluta da Casa. São necessários pelo menos 257 votos favoráveis no plenário da Câmara para que alguém perca o mandato. Ainda não há data marcada.

Deputados dizem que cassação de Chiquinho Brazão e Glauber Braga podem ser analisadas juntas em plenário. Lira deixou a presidência da Casa sem pautar a perda de mandato do deputado acusado de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista Anderson Gomes. A tese é que há a intenção de mostrar que existe punição para os dois campos políticos. A decisão, no entanto, cabe a Motta, que, questionado por jornalistas, disse apenas que a cassação de Brazão disse vai tratar do assunto no "momento certo".

PL pode ser afetado no futuro

Outros parlamentares também tem processos no Conselho de Ética. A eventual cassação de Glauber pode abrir uma jurisprudência para futuros casos semelhantes serem tratados de forma semelhante, com punições duras.

Gustavo Gayer (PL-GO) é um dos que correm risco de perder o mandato. Ele ofendeu a ministra Gleisi Hoffmann e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).

publicidade

Notícias