Em ato, Bolsonaro pouco cita anistia e defende sua candidatura em 2026
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) falou hoje em manifestação na avenida Paulista em defesa da anistia dos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro, onde reciclou a declaração que fez quando se tornou réu por tentativa de golpe de Estado e disse que violação à democracia foi sua derrota na eleição de 2022.
O que aconteceu
Apesar da temática do evento ser o perdão aos acusados de participarem dos atos golpistas, Bolsonaro pouco falou sobre o assunto nos quase 25 minutos em que discursou. Na maior parte do tempo, o ex-presidente defendeu a própria inocência e uma eventual candidatura nas próximas eleições. "Eleições 2026 sem Jair Bolsonaro é negar a democracia, escancarar a ditadura no Brasil. Se o voto é a alma da democracia, a contagem pública do mesmo se faz necessária", afirmou.
O voto no Brasil é seguro e auditável, como já mostraram relatórios do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e TCU (Tribunal de Contas da União). Desde 1996, início da utilização da urna eletrônica, nunca houve fraude comprovada.
Ex-presidente também disse que não houve "ato preparatório" para um eventual golpe, apesar de já ter admitido que "discutiu hipóteses" com militares. "O primeiro movimento para um estado de sítio, de defesa, é convocar os conselhos. Nenhum conselho foi convocado, então, nem ato preparatório houve", declarou.
"Só um psicopata para falar que aquilo que aconteceu no dia 8 de janeiro foi uma tentativa armada de um golpe militar", disse Bolsonaro. Para ele, golpe foi a eleição de seu adversário, o atual presidente Lula (PT). "O golpe foi dado, tanto é que o candidato deles está lá", disse. "Vamos falar quem deu o golpe: quem tirou Lula da cadeia? [...] Quem descondenou o Lula para ele fugir da Lei da Ficha Limpa e se tornar candidato?".
Ato teve 1/4 da participação de manifestação de 2024
Segundo estimativa do Monitor do Debate Político, vinculado à USP e ao Cebrap, ato reuniu 45 mil pessoas. A contagem foi feita no momento de pico da manifestação, às 15h44, a partir de fotos aéreas analisadas com software de inteligência artificial.
Isso é um quarto do ato em apoio a Bolsonaro no ano passado. No dia 25 de fevereiro, o ato que também aconteceu na avenida Paulista reuniu 185 mil pessoas.
Após o protesto esvaziado no Rio e com o assunto travado na Câmara, a estratégia do bolsonarismo é mostrar que a anistia tem força nas ruas. Apesar da pressão bolsonarista, os caciques da Câmara sinalizam que a anistia não é prioridade. O presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) tem focado em outros assuntos, como a comissão que vai discutir a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 por mês, e foi alvo de alguns dos discursos no ato deste domingo.
Pesquisa mostra que maioria dos brasileiros rejeita proposta de anistia. Levantamento Genial/Quaest publicado hoje mostrou que 56% acham que os envolvidos no 8 de Janeiro devem continuar presos. Já 34% defendem que eles sejam soltos: 18% acreditam que eles nem deveriam ter sido presos e 16% pensam que devem ser soltos porque já estão presos há tempo demais.
Batom foi símbolo do ato
Vários dos manifestantes levam batons ou cartazes em referência ao caso de Débora Rodrigues dos Santos, que está em prisão domiciliar depois de passar mais de dois anos presa preventivamente. Bolsonaro chamou a mãe e a irmã da cabeleireira para subirem no trio elétrico durante o discurso dele. Elas não falaram.
Débora ficou conhecida por pichar com batom a estátua da Justiça em frente ao STF, mas a acusação contra ela não se limita a esse único ato. Segundo a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República), a mulher participou do quebra-quebra e se associou conscientemente aos demais participantes dos atos golpistas de 8 de Janeiro.
Julgamento de Débora ainda não foi concluído. Manifestantes exibem cartaz com batom, dizendo "usar essa arma te condena a 14 anos", mas isso não é verdade: Débora ainda não foi condenada. O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, sugeriu uma pena de 14 anos de prisão por cinco crimes: abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa armada.
Sete governadores foram à manifestação
São eles:
- Romeu Zema (Novo-MG),
- Jorginho Mello (PL-SC),
- Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP),
- Ronaldo Caiado (União-GO),
- Wilson Lima (PL-AM),
- Ratinho Jr. (PSD-PR) e
- Mauro Mendes (União-MT).
Cláudio Castro (PL) havia confirmado presença, mas cancelou após fortes chuvas desabrigarem centenas de pessoas no Rio. Mais de 300 pessoas tiveram de deixar suas casas em Angra dos Reis, onde o volume de chuva em dois dias foi mais que o dobro da média para o mês inteiro.
Ratinho Júnior (PSD) disse que não iria, mas apareceu. Depois de almoçar com Bolsonaro em Curitiba na sexta-feira, o governador paranaense falou que não poderia vir ao evento porque viajaria aos Estados Unidos. Ontem, ele participou do lançamento de um livro junto com o presidente do PSD, o ex-governador Gilberto Kassab, como mostrou a coluna de Mônica Bergamo no jornal Folha de S.Paulo.
Ronaldo Caiado lançou pré-candidatura à Presidência na sexta, dois dias antes de dividir palco com Bolsonaro. Tanto o ex-presidente quanto o governador goiano estão atualmente inelegíveis. Decisão da Justiça Eleitoral de Goiás de dezembro passado condenou Caiado a oito anos de inelegibilidade por abuso de poder político, mas ele ainda pode recorrer da decisão.
Reunião de governadores acontece em meio a disputa por protagonismo na direita. Com Bolsonaro inelegível, os nomes de vários dos presentes hoje na manifestação têm sido aventados como eventuais substitutos. O mais competitivo, segundo pesquisa Datafolha divulgada hoje, é o governador paulista Tarcísio de Freitas —que tem repetido, em público, que não será candidato ao Executivo federal no ano que vem.