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Em julgamento no STF, Bolsonaro repete tática que o levou à derrota em 2022

do UOL

Do UOL, em Brasília

05/04/2025 05h30

Jair Bolsonaro gastou R$ 8 milhões com advogados e ouviu conselhos para não criticar a Justiça durante o julgamento no STF. Transformado em réu, o ex-presidente fez o contrário. Reuniu a imprensa e ofendeu os ministros do Supremo.

O que aconteceu

A atitude de Bolsonaro repete o que aconteceu na eleição de 2022. Seja na corrida eleitoral, seja no julgamento no STF, existe uma bipolaridade entre os aliados que cercam o ex-presidente.

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São duas alas divergentes fazendo pressão para Bolsonaro adotar caminhos completamente opostos:

  • Ala técnica: pragmática, sugere não melindrar a relação com os ministros;
  • Ala ideológica: defende mobilizar a militância e enfrentar o STF.
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Vilardi já defendeu petista no mensalão e empreiteira na Lava Jato
Imagem: Letícia Casado - 25.mar.2025/UOL

O lado que assopra

Bolsonaro deu uma guinada na sua defesa quando contratou o advogado Celso Vilardi. Considerado um dos principais criminalistas do país, ele tem no currículo atuações no mensalão (Delúbio Soares) e na Lava Jato (construtora Andrade Gutierrez).

Recorrer a um profissional deste gabarito sinalizou adotar uma estratégia técnica. Haveria disposição de enfrentar o STF no campo jurídico, mas sem aderir à retórica bolsonarista. Um exemplo desta tática foi a defesa prévia de Vilardi ter explorado supostas falhas no processo e nas investigações da PF (Polícia Federal).

Vilardi também agregou à defesa de Bolsonaro o chamado "trânsito" com o STF. Na prática, o termo se refere a um advogado com facilidade para ser recebido por ministros do Supremo. O acesso facilita expor os argumentos da defesa.

Cabe ressaltar que Vilardi sempre vai sozinho ao Supremo. Nos encontros, ele nunca está acompanhado dos outros defensores do ex-presidente, muitos destes, aliás, afeitos a repetir as declarações do ex-presidente.

A escolha de Vilardi sugeria uma atitude comedida de Bolsonaro. A presença dele no primeiro dia do julgamento e o comportamento equilibrado durante toda a sessão refletiam esta orientação. Era uma decisão política, mas tinha como intenção também mostrar o suposto respeito do ex-presidente pelo Judiciário.

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Posicionado entre Bolsonaro e Flávio, o advogado Paulo Cunha Bueno acompanha o cliente em ataque ao STF
Imagem: Maria Eduarda Bacellar - 26.mar.2025/UOL

O lado que morde

Bolsonaro assistiu ao segundo dia do julgamento no gabinete de Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Foi o senador quem sugeriu a contratação de Vilardi, Foi para o gabinete dele que o advogado se dirigiu depois que o julgamento acabou.

Mas o ex-presidente desceu para falar com a imprensa acompanhado de outro defensor. Paulo Cunha Bueno, que não é refratário ao espírito combativo e agressivo de Bolsonaro, ficou imediatamente atrás do cliente.

Junto à dupla, estavam parlamentares bolsonaristas raiz. Deputados e senadores têm uma proposta antissistema, perfil combativo e apreço por likes nas redes sociais a partir de ofensas a adversários.

Cunha Bueno assistiu inerte ao ex-presidente entrar no "modo cercadinho". Foi uma sequência de teorias conspiratórias e críticas às urnas eletrônicas, à Polícia Federal e aos ministros do STF, justamente o grupo que definirá o futuro do processo.

Alexandre de Moraes foi o maior alvo. O ministro é acusado de comandar o que os bolsonaristas batizaram de "ditadura da toga". O ex-presidente atribuiu ao ministro do STF o fato de estar longe do filho Eduardo Bolsonaro e dos netos —o deputado abandonou o Brasil para morar nos Estados Unidos.

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Ciro Nogueira declarou que Bolsonaro perdeu as eleições por causa de frases erradas durante a campanha
Imagem: Isac Nóbrega/PR

Repeteco das eleições

A alternância de comportamentos ameaça invalidar a defesa jurídica técnica. O esforço para transmitir equilíbrio cai por terra quando Bolsonaro faz discursos mercuriais contra o STF. Só no dia em que virou réu, foram dois.

O momento político é outro, mas o cenário é igual ao das eleições. Durante a tentativa de um segundo mandato, Bolsonaro tinha dois núcleos. Ambos defendiam ações opostas.

O núcleo político tinha como prioridade controlar a língua de Bolsonaro. A intenção era evitar discurso contra as vacina de covid-19, desmerecer os esforços de enfrentamento ao coronavírus e acabar com falas machistas e ofensivas às mulheres.

Este tipo de conselho era ainda mais enfatizado em dias de debates na TV. Os principais representantes do núcleo político eram os então ministros Fábio Faria (PP-RN) e Ciro Nogueira (PP-PI). Passada a eleição, este último disse que Bolsonaro perdeu por causa de frases inapropriadas.

O núcleo ideológico pregava o contrário. Seus integrantes reforçavam que o então candidato deveria se opor ao sistema. O conselho abria margem para falar mal das urnas, das vacinas e da Justiça e incentivava a declarações falsas. Diversas vezes Bolsonaro falou que os cachorros estavam extintos na Venezuela porque a população comeu seus animais de estimação de tão famintos que estavam por causa do comunismo implantado no país.

Acabou em derrota. Ele ficou 2,1 milhões de votos atrás de Lula e se tornou o primeiro presidente a não obter a reeleição no Brasil.

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