Eletronuclear avalia que saída da Eletrobras não inviabilizaria Angra 3, diz CEO
Por Rodrigo Viga Gaier
RIO DE JANEIRO (Reuters) - Uma esperada venda da fatia minoritária da Eletrobras na Eletronuclear não vai inviabilizar financeiramente a retomada do projeto Angra 3, nem criaria dificuldades econômico-financeiras para a geradora nuclear, já que a empresa conta com apoio do governo federal, disse à Reuters o presidente da Eletronuclear, Raul Lycurgo.
A declaração acontece em momento em que a Eletrobras dá passos para vender sua participação remanescente representativa de 35,30% em ações ordinárias na Eletronuclear, após a privatização em 2022 ter repassado o controle da empresa nuclear para a estatal ENBPar.
A Eletrobras deve se desfazer da fatia na Eletronuclear por meio da atração de um novo sócio, em operação que conta com o apoio do governo federal, após acordo no Supremo Tribunal Federal que envolveu negociações sobre poder de voto do Estado na ex-estatal.
"A União pode assumir integralmente (a parte da Eletrobras), pode ser vendido para um terceiro que for comprar, que não deve ser uma empresa neófita, deve ser uma empresa de porte", disse o executivo da Eletronuclear à Reuters.
Lycurgo evitou fazer maiores comentários sobre o processo em andamento conduzido pela Eletrobras.
Como parte desse processo de saída da Eletrobras da Eletronuclear, a elétrica anunciou nesta sexta-feira que assinou com a ENBPar para a rescisão do acordo de investimento em Angra 3.
Segundo o executivo, há alternativas, quando a Eletrobras deixar definitivamente a Eletronuclear, para a empresa estatal nuclear seguir fortalecida e para manter o projeto bilionário de Angra 3, seu empreendimento mais desafiador.
Por outro lado, mesmo pelo acordo que foi rescindido, a estatal nuclear já ficaria com a maior parte do financiamento de Angra 3, lembrou o CEO.
"O acordo de investimentos que a Eletrobras tinha com a União, e que foi suspenso agora, não dizia que a Eletrobras tinha que pagar 33% do custo da usina. É só o 'equity' de R$800 milhões. O resto é a Eletronuclear que vai financiar", afirmou.
Conforme Lycurgo, a Eletronuclear se comprometeu a financiar no mercado 90% da retomada da obra bilionária de Angra 3, com custos calculados em cerca de R$23 bilhões, com outros sócios ficando com o restante, pelo acordo rescindido.
Como parte do acordo fechado entre Eletrobras e União, ficou definido que o BNDES deverá estruturar uma nova modelagem para a conclusão da construção de Angra 3.
Além disso, a Eletrobras se comprometeu a apoiar a extensão de vida útil de Angra 1: a Eletronuclear emitirá R$2,4 bilhões em debêntures conversíveis, que serão adquiridas pela Eletrobras de acordo com o andamento do projeto.
PROBLEMAS COM GASTOS
O montante a ser destinado à Angra 3, contudo, parece mais desafiador também pelo fato de a Eletronuclear estar sofrendo com desequilíbrio financeiro, principalmente em função de elevados gastos com pessoal, sem cobertura tarifária de Angra 1 e 2 suficiente para cobri-los.
Lycurgo estima que a Eletronuclear tenha uma receita livre cerca de R$2 bilhões com a geração de energia de Angra 1 e 2, e mais de R$1 bilhão em gastos de pessoal.
Essa situação levou a empresa a implementar recentemente um amplo plano de corte de despesas, inclusive com demissões.
Mesmo sem futuro definido, Angra 3 tem peso significativo nas contas da Eletronuclear. A estimativa é de que, mesmo parado, o projeto custe anualmente mais de R$200 milhões para a empresa nuclear, entre manutenção e profissionais.
O projeto de Angra 3, que data da década de 1980, foi paralisado por diversas vezes ao longo dos anos e ainda não teve sinal verde do governo para ser reiniciado. A expectativa é que o tema volte à pauta na próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
Os gastos com profissionais da Eletronuclear são outra variável relevante nas despesas da geradora: são mais de 3 mil funcionários diretos e indiretos para cuidar das duas usinas em operação, além dos equipamentos já adquiridos e manutenção de Angra 3. O número é considerado acima de parâmetros internacionais.
No ano passado, a empresa abriu um plano de demissão voluntária (PDV) que poderia contemplar quase 500 colaboradores, mas apenas 133 aderiram. Diante da baixa adesão e da necessidade de ajustes econômico-financeiros, a empresa fará este ano um desligamento compulsório de 90 empregados que já estão aposentados e têm salários mais elevados.
Somente com o plano de desligamento compulsório, a Eletronuclear espera economizar R$70 milhões ao ano. Junto com o PDV de 133 empregados, a economia anual deve chegar a R$160 milhões, perto da meta traçada de R$200 milhões ao ano.
A empresa busca ainda outras fontes de redução de custos e aumento de produtividade para conseguir se adequar aos parâmetros de custos com pessoal, material, serviços e outros (PMSO) estabelecidos pela agência reguladora Aneel já em 2026.
"Não vamos reduzir custos ou pessoas na base da marretada... Não faremos nenhum movimento abrupto. Segurança para nós é prioridade 1, 2 e 3", disse o presidente da Eletronuclear, ao frisar não devem ser necessários mais cortes de pessoal após a realização dos últimos planos de demissão.
(Por Rodrigo Viga Gaier)