Fux aceita denúncia contra Bolsonaro, mas sinaliza discordância sobre 8/1
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luiz Fux acompanhou o voto do ministro relator Alexandre de Moraes para aceitar a denúncia contra Jair Bolsonaro (PL) e aliados no segundo dia do julgamento na Corte - a decisão foi unânime. Ele, porém, anunciou que vai fazer revisão da pena de cabeleireira que participou dos atos golpistas no dia 8 de janeiro de 2023.
O que aconteceu
Fux começou o voto com ponderações e sinalizando divergência. O ministro citou o caso da cabeleireira Débora Rodrigues Santos, 39, que pichou com batom a estátua da Justiça durante os atos golpistas de 8 de Janeiro. "Temos toda a liberdade e respeito pela opinião dos colegas. Vou fazer uma revisão dessa dosimetria", disse. "Em determinadas ocasiões, me deparo com uma pena exacerbada e foi por essa situação que pedi vista desse caso. Quero analisar o contexto que essa senhora se encontrava."
Apesar de pontuar discordâncias, Fux parabenizou o trabalho de Moraes na elaboração da denúncia. "Quero acompanhar o eminente relator e, ao mesmo tempo, dizer que nós devemos ainda manter a grande, extraordinária esperança de que o nosso país continuará a viver um Estado democrático de Direito onde se garante justiça, segurança, justiça, verdade e liberdade."
Moraes respondeu a Fux e disse que respeita a liberdade dos ministros. Moraes acrescentou ainda que ele e outros ministros também divergem em relação à dosimetria das penas. "É um absurdo as pessoas quererem comparar aquela conduta de uma ré que estava há muito tempo dentro dos quartéis, pedindo intervenção militar, que invadiu junto com toda a turba e, além disso, praticou esse dano qualificado, com uma pichação de um muro."
Ministro afirma que "não se pode dizer que não aconteceu nada" em referência aos atos do 8 de Janeiro. "Esses episódios contra a nossa democracia e o Estado de direito são marcantes. Então, todos os dias serão dias da lembrança de tudo o que ocorreu. E, por isso, não se pode, de forma alguma, dizer que não aconteceu nada."
Fux comentou que o tamanho da denúncia criou certa dificuldade. "Mas o ministro Alexandre esclareceu quem fez o quê. Isso é muito importante para nós nesse momento que a lei determina autoria e materialidade.
Ele fez considerações sobre tentativa de golpe e crime consumado. "Se o legislador cria um crime tentando como consumado [...] todo crime tem atos preparatórios, todo crime tem tentativa, está na lei. Tudo isso vai ser avaliado", disse ele. "A minha crítica a essas figuras penais é exatamente a falta de verificação desses antecedentes técnicos científicos, de que, na medida em que se coloca a tentativa como crime consumado, no meu modo de ver, há um arranhão na Constituição Federal e também não se cogitou nem atos preparatórios nem de tentativa de crime tentado."
Ministro disse que quer receber denúncia completa. "Estamos numa fase de verificação dos indícios de autoria e materialidade dos delitos. Vou me reservar para analisar melhor. Necessito efetivamente receber a denúncia para que eu possa aprofundar em todas essas questões que citei aqui como observações", disse Fux.
Fux suspende julgamento de mulher que pichou estátua
Ministro terá 90 dias para retomar julgamento. A cabeleireira Débora é ré por cinco crimes: abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa armada. Dos 14 anos, são 12 anos e seis meses de reclusão, um ano e seis meses de detenção e mais cem dias-multa.
Moraes disse no voto que as provas mostram que Débora se aliou conscientemente ao grupo que planejava o golpe de Estado. Ela também permaneceu na organização em frente ao quartel-general do Exército em Brasília e escolheu participar dos atos de 8 de Janeiro. Débora confirmou as acusações em interrogatório.
A cabeleireira está na cadeia desde março de 2023. Ela foi presa preventivamente na Operação Lesa Pátria e segue detida no interior de São Paulo. Os investigadores confirmaram a identidade dela graças aos registros fotográficos feitos no dia. A obra pichada foi avaliada pelo STF entre R$ 2 milhões e R$ 3 milhões. "A Justiça" é uma das principais obras do artista mineiro Alfredo Ceschiatti.
Ela escreveu "Perdeu, mané" na estátua, em referência a uma fala do presidente do STF, o ministro Luís Roberto Barroso. O magistrado respondeu a um manifestante bolsonarista com essa frase ao ser abordado na rua, durante uma viagem a Nova York, em novembro de 2022.
Bolsonaristas têm usado o caso da cabeleireira para falar em excessos do STF. Para argumentar que ela não deveria ser presa, eles dizem em protestos e no Congresso que Débora não cometeu crime e que usou "como arma apenas um batom vermelho". Alguns dos que se manifestaram nesse sentido foram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o senador Flávio Bolsonaro (PL).
Presa escreveu carta com pedido de desculpas. Ela fez uma solicitação de próprio punho pedindo desculpas ao ministro Alexandre de Moraes e dizendo que desconhecia a simbologia da estátua e seu valor material. Os advogados dela falam em vulnerabilidade afetiva e emocional das crianças, ausência de antecedentes criminais de Débora e inexistência de risco de que ela reincida em crimes.