Oposição na Turquia desafia governo e convoca novos protestos, apesar de multiplicação de prisões
Os protestos continuam nesta terça-feira (25) na Turquia, onde quase 1.200 manifestantes foram presos desde o início, há seis dias, de uma grande revolta desencadeada pela prisão do prefeito de Istambul, Ekrem Imamoglu, principal rival do presidente Recep Tayyip Erdogan. Estudantes se mobilizam em várias partes da cidade, preparando cartazes para um grande comício planejado para esta noite, enquanto o governo faz novas prisões.
"Erdogan, demissão!" ", é o slogan repetido à exaustão pelas dezenas de milhares de manifestantes reunidos no distrito de Fatih, em Istambul, relata a enviada especial da RFI, Céline Pierre-Magnani.
A Turquia vem sendo abalada por manifestações sem precedentes desde 2013. Pela manhã, as autoridades anunciaram a prisão de 43 "provocadores" após mais uma noite de protestos em diversas cidades do país.
Um promotor de Istambul pediu, nesta terça-feira, a prisão de sete jornalistas, incluindo o fotógrafo da AFP Yasin Akgül. Eles foram detidos em suas casas, na segunda-feira (24).
No tribunal de Caglayan, em Istambul, o clima era de tensão, de acordo com um correspondente da AFP, onde, além dos sete jornalistas, cerca de 200 pessoas detidas por participarem de atos públicos, proibidos pelas autoridades, aguardavam para saber sobre o seu destino.
A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) pediu a libertação dos jornalistas detidos, dizendo estar "profundamente chocada".
O Conselho da Europa, que deve discutir a situação na Turquia ainda nesta terça-feira, condenou o "uso desproporcional da força" durante os protestos no país. "Peço às autoridades turcas que respeitem suas obrigações de direitos humanos em relação à liberdade de reunião pacífica, liberdade de expressão e liberdade de mídia", disse o Comissário de Direitos Humanos do Conselho da Europa, Michael O'Flaherty.
A província de Ancara, a capital, estendeu a proibição de manifestações até 1º de abril. As autoridades tomaram uma decisão semelhante em Izmir, terceira maior cidade do país e um reduto da oposição, até 29 de março. A mesma proibição está em vigor há seis dias em Istambul, onde dezenas de milhares de pessoas desafiaram as ordens do governo, na noite passada, para se reunir em frente à prefeitura. A polícia dispersou os manifestantes violentamente por volta da meia-noite, de acordo com um jornalista da AFP.
Özgür Özel, líder do Partido Republicano do Povo (CHP, social-democrata), a principal força de oposição à qual pertence o prefeito de Istambul preso, convocou uma nova manifestação na noite de hoje terça-feira. Ele apelou a confrontar o "fascismo".
O partido também convocou um boicote a cerca de dez empresas turcas conhecidas por serem próximas ao governo, incluindo uma famosa rede de café: "Podemos fazer nosso próprio café", disse Özel.
"Parem de perturbar a paz dos nossos cidadãos com suas provocações", respondeu o presidente Erdogan à oposição, em um discurso televisionado, na noite de segunda-feira.
Virada autocrática?
A imprensa francesa analisa se a Turquia entra em uma era de autocracia, após a prisão do prefeito de Istambul, Ekrem Imamoglu, acusado de corrupção pela Justiça turca.
O Libération destacou em sua edição de segunda-feira (24) a participação de 15 milhões de eleitores, no domingo, nas primárias do partido republicano do Povo (CHP), ao qual pertence Imamoglu, para a escolha do candidato às eleições presidenciais de 2028 e que funcionaram como um pleito simbólico e contestador.
Do total de participantes, 13 milhões escolheram o principal adversário do presidente Recip Tayyip Erdogan, apesar de Imamoglu estar proibido de concorrer porque o seu diploma universitário foi cassado. Ele continua, no entanto, sendo considerado "um mártir de uma democracia em perigo", analisa o Libé. Face a essa mobilização inédita, o governo Erdogan "endurece a repressão", continua o texto.
Prisão do prefeito de Istambul transforma a Turquia "em uma verdadeira autocracia", avalia o jornal Le Monde. O diário francês lembra que ao longo dos últimos dez anos, o presidente Recip Tayyip Erdogan "multiplicou as prisões e condenações de adversários políticos", principalmente aqueles que têm alguma relação com os curdos. O diário denuncia que o governo turco tem suprimido instrumentos de controle de seu poder. O Le Monde ainda destaca que as eleições no país acontecem em um cenário em que a imprensa é controlada, assim como o aparelho do Estado, mesmo que a oposição apresente os seus candidatos.
O Le Figaro mostra que, enquanto "Erdogan desclassifica seu principal rival, as ruas rejeitam uma Turquia autocrática". A reportagem entrevistou jovens que se sentem roubados: "o poder tenta por vias ilegais roubar o nosso direito de voto e de escolher nossos dirigentes", diz um estudante.
"O presidente quer escolher os seus opositores, eliminando os que podem derrotá-lo", diz outra eleitora turca indignada com a situação política do país.
"Dormimos na Turquia e acordamos na Rússia", afirma o jornalista Yildiray Ogur, citado pelo Figaro, para descrevendo "o colapso da democracia" turca.
(RFI com AFP)