"Quero abrir caminhos", diz Kirsty Coventry, primeira mulher a presidir o COI; especialista aponta avanço
Pela primeira vez na história, o Comitê Olímpico Internacional (COI) terá uma mulher no comando da instituição, que tem 130 anos de existência. A ex-nadadora e medalhista olímpica, Kirsty Coventry, do Zimbábue, foi escolhida esta semana para o cargo de presidente em eleição que aconteceu em Costa Navarino, na Grécia.
Renan Tolentino, da redação da RFI em Paris
Aos 41 anos, ela também é a mais jovem e a primeira africana a ocupar a posição, sucedendo o alemão Thomas Bach. Em seu discurso, Kirsty ressaltou o peso da representatividade feminina na liderança do COI e agradeceu a outras mulheres que a inspiraram a lançar sua candidatura.
"Em termos da importância de ser a primeira mulher, de ser a primeira africana, devo dizer que houve mulheres incríveis que vieram antes de mim. Uma delas que está sentada na sala hoje, e que talvez me emocione um pouco, é Anita deFrantz, uma grande inspiração para mim e para muitas mulheres. E fiquei muito orgulhosa por poder deixá-la orgulhosa. Ela foi a primeira mulher a concorrer a esse cargo e, como eu disse, ela me inspirou e tem sido uma grande mentora para mim desde que entrei no movimento olímpico em 2013 [...] mulheres como ela abrem caminho para mulheres como eu, e eu quero abrir caminho para a geração mais jovem, especialmente porque tenho duas filhas pequenas", celebrou a ex-nadadora.
"Uma boa notícia para o COI"
A vitória de Kirsty Coventry foi encarada com certa surpresa no cenário olímpico, não só porque ela não era a favorita entre os sete candidatos, mas também porque ela venceu ainda no primeiro turno, com uma larga margem de 49 votos contra 28 do seu principal rival, Juan Antonio Smaranch Jr. É o que aponta Jean-Loup Chappelet, professor emérito da Universidade de Lausanne, na Suíça, que estuda o movimento olímpico há mais de 50 anos.
"Foi uma verdadeira surpresa, pois com sete candidatos, todos esperavam mais turnos de votação, e ela venceu no primeiro turno por maioria absoluta, o que é um feito e tanto. E é uma notícia muito boa para o COI", avalia Chappelet.
"O britânico Sebastian Coe era outro apontado como favorito, principalmente pela imprensa (em geral) e pela imprensa britânica em particular, porque ele fez uma campanha voltada para os meios de comunicação e para as redes sociais. Mas quem vota não são os jornalistas, não são as pessoas que usam as redes sociais. Quem vota são os membros do COI, e a metade é composta por mulheres. Há também uma incontestável força dos atletas entre os membros e de pessoas mais jovens. Acho que a idade teve um papel importante. No passado, para ser jovem no comando do COI, era preciso ter 60 anos mais ou menos, mas hoje Kirsty se elegeu aos 41", detalha o acadêmico da Universidade de Lausanne.
Avanço no cenário olímpico
Para o professor, a eleição de Kirsty e sua representatividade enquanto mulher e africana podem ser consideradas um avanço para o COI, para os próprios atletas e para o movimento olímpico, em geral.
"Sim, acredito que depois de muito tempo o COI evolui. Não estamos mais no tempo do Barão de Coubertin, estamos no século XXI, e no século XXI o poder dos atletas é cada vez maior. Kirsty Coventry ganhou sete medalhas (olímpicas), sendo dois ouros. Isso a torna a presidente do COI com mais medalhas", destaca Chappelet.
A vez da África?
Ao longo de seus oito anos de mandato, Kirsty Coventry terá pela frente os Jogos de Los Angeles, nos EUA, em 2028 e de Brisbane, na Austrália, em 2032. Já para as Olimpíadas de 2036, a sede ainda não foi escolhida. Com uma presidência do Zimbábue à frente do COI, seria o momento do maior evento esportivo do planeta desembarcar pela primeira vez no continente africano?
"Pode acontecer, mas estamos longe de ter uma previsão, já que nenhum país africano lançou sua candidatura até o momento para os Jogos de 2036. Talvez o próximo passo seja justamente termos uma candidatura, por exemplo, da África do Sul, do Marrocos, ou de outros países da África. Mas também temos candidaturas na Ásia. Há uma rotação de continentes, após a Europa, após Paris 2024, será os Estados Unidos com Los Angeles, e depois a Austrália com Brisbane em 2032. Então, depois poderá ser a vez da Ásia ou da África", avalia o especialista.
Neste cenário, será interessante observar a relação dos países africanos com Coventry, que há mais de seis anos ocupa o cargo de Ministra da Juventude, dos Esportes, das Artes e do Lazer do governo do Zimbábue, considerado autoritário.
Além das metas de tornar os Jogos mais acessíveis às novas gerações, ela terá grandes desafios pela frente, como a reintegração dos russos e ucranianos às Olimpíadas, questões de transidentidade e transgênero nas modalidades olímpicas e problemas ambientais ligados aos Jogos de Inverno. Temas com os quais ela terá que lidar a partir de junho, quando toma posse na sede do COI, em Lausanne, na Suíça.