Ato mostra que não existe 'frente ampla' pela anistia, dizem analistas
O ex-presidente Jair Bolsonaro não conseguiu demonstrar, no ato hoje em Copacabana, que tem o apoio de uma "frente ampla" para aprovar a anistia aos golpistas de 8 de janeiro de 2023, segundo analistas políticos ouvidos pelo UOL,
Sem a multidão aguardada na praia de Copacabana e com a participação somente de parlamentares bolsonaristas, a manifestação foi marcada por críticas ao governo Lula e ao Judiciário e apelos vazios em nome dos "inocentes" já julgados ou à espera de julgamento.
Para conseguir aprovar uma lei que anistie os golpistas que invadiram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, Jair Bolsonaro precisa reunir ao menos 257 votos na Câmara dos Deputados e 41 no Senado. E força popular para forçar os presidentes de ambas as Casas a pautar a proposta.
Em seu discurso, o ex-presidente tentou mostrar que tem apoio de líderes partidários para votar e aprovar o projeto — chegou a citar nominalmente o presidente do PSD, Gilberto Kassab —, mas não levou nenhum deles ao ato, com exceção de Valdemar Costa Neto, presidente de seu próprio partido.
Procurado para confirmar o apoio, Kassab não respondeu.
"A manifestação foi muito aquém da capacidade de mobilização já demonstrada pelo bolsonarismo. Foi uma aposta que não deu certo e que até mesmo ajudou o governo Lula. Com a proximidade do julgamento, essa força política tende a se esvair ainda mais", destacou o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV.
Para a professora Silvana Krause, do departamento de Ciência Política da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), ficou claro hoje que não existe uma frente ampla pela aprovação da anistia aos golpistas de 8 de janeiro.
"Mesmo os governadores que compareceram não têm feito nenhum movimento claro neste sentido. Eles se apresentam não para defender uma pauta, mas para marcar posição com o eleitorado bolsonarista", afirma.
Segundo Silvana, a participação dos governadores aliados é imprescindível para a pauta avançar. "Se estivessem envolvidos mesmo já estariam convocando suas bancadas."
STF decide se torna Bolsonaro réu no dia 25
Os deputados federais Rodrigo Valadares (União-SE), relator do PL da Anistia, e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do partido na Câmara, tentaram passar otimismo, afirmando que a votação do PL da Anistia pode ocorrer já na próxima semana, em caráter de urgência.
A pressa decorre do calendário do STF. O Supremo marcou para o dia 25 de março o julgamento da denúncia que pode tornar Bolsonaro réu pela tentativa de golpe.
"O ato deste domingo não traz nada de novo do ponto de vista político ou jurídico. E comprova que foi organizado não para pedir anistia aos demais envolvidos, mas para o próprio Bolsonaro", destaca o cientista político Rodrigo Prando, do Mackenzie.
Ao assumir a presidência da Câmara, no início de fevereiro, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou que caberá ao Colégio de Líderes a decisão sobre pautar ou não o projeto. Isso apesar de ser de competência do presidente da Casa a definição do que entra em pauta.
Segundo o analista político Adriano Oliveira, da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), o ex-presidente deveria ter optado por trabalhar nos bastidores pela tramitação do projeto e não partir, de novo, para o enfrentamento.
"Foi uma decisão equivocada. Bolsonaro não consegue mais mobilizar as massas e ainda volta a despertar desconfiança no mercado ao atacar as instituições", afirma.
Para Oliveira, a manifestação ainda apresentou Tarcísio como um representante direto do bolsonarismo, o que pode prejudicá-lo em uma eventual campanha presidencial em 2026. "Isso só beneficia Lula."
Maioria é contra anistia
Pesquisa Datafolha realizada em dezembro mostra que 62% dos brasileiros são contra a aprovação de um projeto de lei que conceda anistia aos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Outros 33% se mostraram a favor e 6% não souberam responder ou se classificaram indiferentes.
O apoio à anistia é maior entre os homens -nesse grupo, atinge 37%, em comparação a 29% entre as mulheres. Entre elas, 64% são contra o afastamento da punição, enquanto a mesma porcentagem para os homens é de 59%. A margem de erro do segmento é de três pontos.
A concordância com a anistia é maior entre os que declararam voto no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2022 (45%), entre os assalariados sem registro (38%) e os empresários (37%) e entre os evangélicos (37%). Também ganha espaço entre aqueles que têm de 35 a 44 anos (36%), que concluíram o ensino médio (36%) e que ganham de dois a cinco salários mínimos (36%).