Topo
Notícias

OPINIÃO

5 provas de que compramos nossos carros pensando no próximo dono

 Divulgação/Hyundai
Imagem: Divulgação/Hyundai
do UOL

Colunista do UOL

09/01/2025 12h00

O carro que você tem na garagem é exatamente do jeito que você gostaria que fosse? Tenho certeza de que a maioria das pessoas compram um automóvel pensando no próximo proprietário - e você, meu caro leitor, pode ser uma delas.

Você pode até achar que não, que teve o poder de escolha de entrar em uma concessionária e configurar o carro do seu jeito. Mas vou te provar que, mesmo inconscientemente, nossas escolhas tendem a ser as mais conservadoras possíveis - tudo para não ter dificuldade de encontrar compradores no futuro.

Como não é possível saber quem será o próximo dono, as escolhas passam a ser as mais comuns possíveis, para poder atingir o maior número de futuros interessados no carro.

Aqui não cabem julgamentos, pois eu também, por mais que já tenha tido carros um pouco fora do comum, também penso em como seria uma possível revenda antes de fechar um negócio. Carros não são objetos descartáveis, mas sim bens de uso que exigem muitas horas de trabalho para serem adquiridos. Portanto, é natural valorizar aquilo que pagamos e desejar que a depreciação seja a menor possível com o passar dos anos.

Esse comportamento é antigo, e não faltam exemplos que mostram como nós, brasileiros, somos influenciados a ter aquilo que o mercado considera como sendo bom, sempre com o pensamento de que pode facilitar a revenda. Separei cinco exemplos que provam isso.

Fiesta - Divulgação - Divulgação
Fiesta
Imagem: Divulgação

Número de portas

Houve um tempo em que o brasileiro só queria saber de carro com duas portas. Muitos modelos só foram oferecidos assim, mesmo alguns com apelo familiar como Ford Belina e Chevrolet Caravan. Outros que chegaram a ter opção de carroceria quatro portas tiveram vendas pífias nessa configuração, como Volkswagen Brasília e Chevrolet Chevette.

Por mais prática que as portas traseiras fossem, passavam imagem de carro de serviço, como táxis, e o preconceito era forte. Também tinham argumentos infundados, como de que a carroceria perdia resistência com as portas extras ou que as crianças poderiam abrir a porta com o carro em movimento.

Com isso, muitos casais com filhos e a óbvia necessidade de carros com portas traseiras acabavam seguindo a onda do mercado e optavam por modelos com duas portas.

Os anos foram se passando e esse conceito ficou no passado. O carro com duas portas hoje é um mico que ninguém quer ter, mesmo que seja alguém sozinho, que raramente ande com mais pessoas no veículo.

Mas afinal, um carro com quatro portas é melhor do que outro com apenas duas? Depende da necessidade e da vontade do proprietário. Mesmo hoje, muitas pessoas seriam bem atendidas por esses modelos, por simplesmente não transportarem ninguém atrás.

ASX Outdoor - divulgação - divulgação
ASX Outdoor
Imagem: divulgação

Escolha da cor

Para minha tristeza, os recentes lançamentos estão sendo apresentados com opções de cores cada vez menores, e geralmente as mesmas variações de branco, prata ou preto. Até mesmo o clássico vermelho tem ficado fora em muitos casos.

Amarelo, verde, laranja e afins? Essas morreram há décadas. Inclusive, se pudéssemos voltar no tempo, veríamos ruas bem mais coloridas. O que hoje é padrão, no passado era exceção. Quantos Fuscas pretos e pratas o leitor já viu? Provavelmente poucos.

A escolha da cor tem tudo a ver com a preocupação de uma possível dificuldade de revenda. Tenho certeza de que muitos donos de carros pretos, pratas ou cinzas gostariam que seus carros tivessem cores marcantes e exclusivas, mas não escolhem assim por receio de perder valor na revenda.

Isso é uma grande bobagem, pois carro usado em bom estado consegue comprador com qualquer cor de carroceria. Ainda mais com a facilidade de se vender em classificados da internet, onde as negociações não se restringem a cidade ou região onde o vendedor mora, mas sim em todo território nacional.

Flex - Foto: AdobeStock | AutoPapo - Foto: AdobeStock | AutoPapo
Flex
Imagem: Foto: AdobeStock | AutoPapo

Tipo de combustível

Sabe aquele papo de escolher um combustível que seja mais limpo e melhor para o meio ambiente? Papo furado. Convenhamos que a escolha está atrelada, na maioria das vezes, ao que é mais favorável para o próprio bolso.

O Brasil já teve momentos em que quase toda a frota de veículos de passeio era movida a etanol, mas a partir do momento em que ficou desinteressante, os movidos a gasolina voltaram a reinar - isso em um tempo em que nem se falava de diesel em carro de passeio.

A solução para melhor atender as flutuações da economia foi desenvolver um motor que aceitasse os dois tipos de combustível, algo que aconteceu nos anos 2000 com a tecnologia popularmente chamada de flex.

Rapidamente os carros 'não flex' passaram a ser rejeitados, o que forçou a indústria aplicar o padrão até em modelos de luxo, destinados a um público que possivelmente nem se preocupe com os centavos que está economizado com a escolha de um ou de outro combustível. Mesmo quem tenha carro flex e defende uso do álcool por ser mais limpo deve mudar de ideia se em algum momento voltar a ser desfavorável colocar esse tipo de combustível.

Hoje essa tecnologia evoluiu bastante, mas é certo que não tem a mesma eficiência que teria se fosse calibrado para rodar somente com um combustível, fora os problemas mecânicos que surgiram na onda no flex. Basta conversar com um dono de oficina mecânica para atestar isso.

Câmbio automático - Reprodução - Reprodução
Câmbio automático
Imagem: Reprodução

Tipo de câmbio

Cresci escutando que carros automáticos eram para preguiçosos, idosos ou pessoas com deficiência. Modelos manuais reinavam em todas as categorias. Mas eles foram ficando cada vez mais confiáveis, resistentes e acessíveis, portanto, mais aceitáveis. Quem tinha aqueles preconceitos do passado só precisava de alguns minutos ao volante para reconhecer seu conforto no uso diário.

Mais uma vez, o costume mudou a ponto de praticamente eliminar a outra opção. Como 'ninguém' mais quer carro manual, comprar carros assim passou a ser uma péssima escolha pensando na futura revenda. Mesmo quem realmente tem prazer em guiar modelos assim acaba optando pelo automático.

Mas será que todos precisam de carros automáticos? Até mesmo quem vive longe dos congestionamentos dos centros urbanos? Tenho certeza de que muitos brasileiros ainda optariam pelo câmbio manual se não fosse o temor da revenda futura.

Creta - Novo Hyundai Creta Ultimate (Foto: Divulgação/Hyundai) - Novo Hyundai Creta Ultimate (Foto: Divulgação/Hyundai)
Creta
Imagem: Novo Hyundai Creta Ultimate (Foto: Divulgação/Hyundai)

Tipo de carroceria

Os utilitários esportivos estão com tudo, mas quantas pessoas realmente precisam deles? Caros, pesados e beberrões, nem são tão espaçosos como suas infladas carrocerias sugerem. Inclusive, em alguns exemplos, perdem em espaço interno e de bagagem, como no caso do Corolla sedã x seu 'irmão' Cross.

Mas nem sempre foi assim. Quando surgiram, eram associados a carros com apelo familiar e nem todos queriam passar essa imagem. Aí veio o Ford EcoSport e popularizou a categoria, que em pouco tempo passou a ser preferência nacional.

As peruas e hatches médios morreram, os sedãs médios estão agonizando e em breve pode ser que não tenhamos nada que não seja um SUV ou suas derivações.

Lamento que seja assim, mas como nos exemplos acima, é como as coisas funcionam. No fim, compramos carros para o próximo dono. Por isso vemos tantos SUVs com câmbio automático, motor flex, na cor prata e com quatro portas nas ruas.

Notícias