8/1: Redes sociais continuam meio de propagação de ideias antidemocráticas
Dois anos após a invasão das sedes do três Poderes, as redes sociais têm redutos que são terra de ninguém. Incitação à intervenção militar, pedidos pela derrubada de Lula e desrespeito ao STF continuam engajando em postagens, sem punição.
O que aconteceu
Grupos de direita monitorados pelo UOL clamam por golpe todos os dias. Há pedidos de golpe em grupos de WhatsApp e de Telegram e em canais no YouTube.
Existe até corrente para fazer do 8 de Janeiro o "Dia do Patriota". Os idealizadores desejam ser notados e querem as redes sociais "inundadas com a nossa bandeira VERDE E AMARELA juntamente com a frase SOU PATRIOTA".
Usar letra maiúscula é uma das características nesses grupos. Mas eles têm diferenças significativas. A mais marcante diz respeito ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Para alguns, uma vítima do sistema. Para outros, um covarde.
O WhatsApp diz ter como premissa o sigilo das mensagens. Elas são criptografadas e não podem ser acompanhadas nem moderadas pela plataforma, que entende ser um dever garantir ao usuário que suas conversas são confidenciais.
O Telegram foi procurado e não respondeu. O escritório de advocacia que representa a plataforma no Brasil também foi acionado e não se manifestou.
O YouTube informou que deleta vídeos que desrespeitam as regras. A plataforma respondeu que usa três mecanismos de identificação de conteúdo irregular:
- Sistemas automáticos que vasculham os vídeos;
- Um time de revisores humanos;
- Denúncias de usuários;
A plataforma relatou que removeu 2,4 milhões de vídeos no Brasil ano passado. "Quando um vídeo que viola nossas regras é detectado, agimos para removê-lo rapidamente", informou trecho de nota do YouTube.
Nem Moraes impõe ordem
A menção ao 'Dia do Patriota' é crime de acordo com Alexandre de Moraes. O ministro já afirmou que não se comemora tentativa de golpe, mas as redes sociais ignoram a determinação. As postagens sobre o assunto aumentaram conforme o 8 de Janeiro se aproximava.
O Congresso também não agiu para frear os crimes nas redes sociais. A regulação das plataformas foi discutida de forma intensa nos últimos dois anos e nenhuma lei avançou sobre o tema.
A direita impede a votação de qualquer projeto. Deputados de partidos como o PL e o Novo dizem que é censura proibir posts pregando golpe.
Como o Congresso não tomou uma decisão, o assunto será decidido em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal). Nas redes, a solução é vista como mais uma prova de que o Supremo age para "calar vozes da direita e ajudar o PT a implantar a ditadura do comunismo".
A tendência é que a falta de controle piore. Ontem, a controladora do Facebook e do Instagram, a Meta, anunciou que deixará de verificar a veracidade dos fatos postados em suas redes.
O dia a dia dos grupos
O UOL monitora os grupos há meses. Eles tratam o 8 de Janeiro como uma conspiração do PT em conluio com o STF e o Congresso Nacional.
Nesta realidade paralela, as invasões foram uma continuação da fraude das eleições. As postagens afirmam que o governo Lula sabia de tudo e nada fez para criar um fato que servisse de desculpa para acuar a direita.
Nesses grupos, militares não estão na mira da PF por incitar um golpe, mas por combater o comunismo. As Forças Armadas, no geral, são tratadas de forma pejorativa. As postagens falam em covardia, em se vender em troca de salários maiores e em traição.
Há indícios de ação coordenada nos grupos golpistas. Montagens com figuras e textos iguais invadem WhatsApp e Telegram nas mesma datas. Quase sempre denunciam dobradinhas entre Lula e o STF e é comum se tornarem o assunto do dia.
Também há uma retroalimentação das redes. Links de canais golpistas no YouTube são encaminhados para os grupos de WhatsApp e Telegram, gerando mais visualizações.
Engrenagem de teorias golpistas conta com participação de parlamentares. Nos últimos dias, apareceram, por exemplo, vídeos do deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) falando em censura à direita. Também houve posts do senador Marcos do Val (Podemos-ES) afirmando que governo sabia do 8 de Janeiro e nada fez.
Maioria condena invasões
Apesar de as redes sociais não impedirem publicações golpistas, estes conteúdos são consumidos por uma minoria. Pesquisa Quaest divulgada na segunda-feira revelou que 86% dos brasileiros reprovam as invasões às sedes do três Poderes. Ao Datafolha, 52% disseram achar que Bolsonaro tentou dar um golpe para se manter no poder, mas preferência pela democracia caiu dez pontos percentuais desde 2022.
A minoria que faz parte destes grupos considera os presos de 8 de Janeiro vítimas de uma ditadura. Postagem diárias no WhatsApp e Telegram sustentam que infiltrados de esquerda promoveram a desordem e fugiram, deixando para trás senhores e senhoras inocentes com a Bíblia embaixo do braço.
Resumo do que defendem alguns grupos
O conteúdo padrão são memes depreciativos de Lula e Fernando Haddad. Notícias negativas do governo federal, principalmente de economia, estão na rotina das postagens. Mas há particularidades como se percebe nas descrições abaixo de alguns grupos golpistas.
Siga à direita (WhatsApp)
Apoio a Bolsonaro, defesa da polícia, críticas a Globo e pedidos insistentes de Pix. A administradora justifica que tem problemas de saúde e está desempregada. Algumas pessoas doam.
União dos Conservadores Brasileiros (WhatsApp)
Tem o advogado do deputado Zé Trovão (PL-SC) como administrador. O grupo combate o socialismo, exalta Deus e chama Alexandre de Moraes de torturador.
Marçal presidente - 2026 (WhatsApp)
Crítico a Jair Bolsonaro, abriga posts falando que o ex-presidente se entregou ao sistema. Os militares são tratados como covardes.
Coronel Koury GRUPO B-38 (YouTube)
Ofensas aos militares "melancia" (verdes por fora, mas vermelhos por dentro), ao STF e pedidos de golpe. Os pedidos de Pix acabaram porque o administrador do canal passou a vender armas de choque por R$ 200.
Direita Master (Telegram)
Convocações para o 'Dia do Patriota', militância contra DREX (dinheiro digital brasileiro), defesa de Elon Musk e publicação de vídeos sobre aborto.
Unidos pelo Brasil (Telegram)
Muita repercussão sobre Gusttavo Lima presidenciável, exaltação do presidente da Argentina, Javier Milei, e anúncios de produtos no Mercado Pago.
Brasil (Telegram)
Apoio incondicional a Bolsonaro, críticas a Gusttavo Lima, declarações que Tarcísio de Freitas é centrão e propaganda de Israel.