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Câmbio favorável deve provocar uma 'avalanche' de turistas argentinos ao Brasil em 2025

02/01/2025 08h48

Todos os anos, os argentinos são os estrangeiros que mais visitam o Brasil, mas, neste verão, as praias brasileiras devem receber uma quantidade que promete ser recorde tanto em quantidade quanto em consumo. A 'avalanche' de turistas começa agora, graças a uma combinação entre o peso argentino valorizado e o real desvalorizado, a vantagem cambial mais favorável aos argentinos nos últimos 26 anos.

Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Este verão de 2025 combina elementos não vistos desde janeiro de 1999, quando o real teve a sua primeira grande desvalorização: naquele 11 de janeiro, o real se desvalorizou repentinamente, quando a maioria dos argentinos já tinha planos de férias.

Desta vez, no entanto, a desvalorização do real aconteceu mais forte no último trimestre de 2024, justamente quando os argentinos decidiam o destino das férias. Por outro lado, enquanto o real se desvalorizava, o peso argentino se valorizava. Ao longo do último ano, a Argentina passou de ser um dos países mais baratos do mundo a um dos mais caros.

Desde a criação do real em 1994, os dois anos nos quais tirar férias no Brasil ficou barato foram 1999 e agora. Segundo um estudo comparativo da Fundação EcoSur, quem tirar duas semanas de férias nas praias da cidade argentina de Mar del Plata, por exemplo, vai gastar o dobro do que duas semanas no Rio de Janeiro.

O engenheiro, Eugenio Forchieri, de 56 anos, um frequente no verão brasileiro, está a ponto de embarcar com a família para Florianópolis. Enquanto fazia a mala com o mínimo necessário para poder voltar cheia de compras do Brasil, Eugenio contou sobre a vantagem de um argentino tirar férias no Brasil nesta temporada.

"Pelos meus cálculos, se eu tirasse férias na costa da Argentina, eu gastaria pelo menos o dobro. Está muito caro por aqui. Eu não via uma situação de câmbio tão favorável para os argentinos desde 1999, quando eu estava no Brasil", compara Eugenio à RFI.

Moedas em sentidos opostos

Ao longo de 2024, o peso argentino foi a moeda que mais se valorizou no mundo (+40%), enquanto o real foi uma das que mais perdeu valor, 21,82% ante o dólar Ptax, taxa de referência do mercado para determinadas operações financeiras. O Brasil ficou barato para quem tem moeda estrangeira, enquanto a Argentina ficou cara.

Essa variação faz estragos na temporada de verão na Argentina, onde os hotéis duplicaram o preço da diária em dólares. O litoral argentino que, nos últimos anos, teve ocupação acima de 90%, agora mal passa de 50%.

A funcionária pública, Paz Puente, de 46 anos, está nos últimos preparativos para viajar com a família às praias de Santa Catarina. Nos últimos seis anos, Paz optou pelo Brasil, mas sempre contendo os gastos, equilibrando as contas, esticando o dinheiro. Desta vez, no entanto, as decisões de compra não vão passar pela calculadora.

"Sempre fomos ao Brasil no modo austero. Neste ano, temos a expectativa de ir no modo 'desfrute', quer dizer, gastar mais", sintetiza Paz à RFI, enquanto checa no computador os últimos detalhes da viagem.

Êxodo argentino

Mesmo em crise, os argentinos representaram, em 2023, 32% do total de estrangeiros no Brasil, triplicando o número de turistas dos Estados Unidos, em segundo lugar com 11%, de acordo com dados do Ministério do Turismo.

Apesar das medidas de choque do governo de Javier Milei no primeiro trimestre de 2024, entre janeiro e março do ano passado, 982.494 argentinos foram ao Brasil. A tendência é que, neste primeiro trimestre de 2025, esse número aumente em, pelo menos, 50%.

A vantagem cambial agora é tanta que a temporada de 2025 pode até bater o recorde de turistas argentinos de 2017, quando o Brasil recebeu 2,622 milhões de argentinos, sendo metade deles no primeiro trimestre.

Os argentinos costumam tirar férias quinzenais a partir do dia 1º de janeiro. Portanto, os aeroportos do país já estão lotados.

Para atender essa demanda histórica de passageiros, as companhias aéreas aumentaram a frequência de voos da Argentina ao Brasil em 30%, em média. São mais de 820 mil assentos, a maior quantidade desde 2008, quando começaram os registros.

Previsões do setor

Mas o transporte aéreo é menos da metade do fluxo. Um pouco mais da metade dos turistas argentinos que aproveitam as praias brasileiras prefere ir de ônibus ou de carro.

A maioria que viaja de carro vai ao litoral de Santa Catarina, onde o governo do Estado prevê um crescimento de quase 70% no turismo estrangeiro.

A comunicadora Candelaria Torres, de 30 anos, preferiu ir de carro com a família rumo a Santa Catarina.

"As praias do Brasil são muito bonitas, mais bonitas do que as da Argentina. Avaliamos viajar ao sul da Argentina, mas os preços no Brasil, o custo do aluguel e a logística inclinaram a balança. E, ao Brasil, temos a opção de ir de carro e de usarmos lá o carro. É um país onde a comida, os aluguéis e as saídas são mais acessíveis do que os preços das coisas aqui na Argentina", conta Candelaria à RFI, enquanto faz as últimas buscas pelos sites de turismo.

Segundo a Turismocity, uma das empresas líderes entre os buscadores especializados na Argentina, a procura por destinos brasileiros aumentou 500% em relação ao ano passado.

O Brasil é responsável por metade de todas as procuras dos argentinos como destino neste verão, segundo a Despegar, líder no setor.

Recorde de consumo

Os argentinos também devem regressar do Brasil com as malas cheias. Um dos maiores objetivos são roupas tanto de vestir como de cama, mesa e banho, itens entre os que impulsionaram a inflação de 2024 que deve fechar em torno de 120%.

Os analistas do setor preveem a volta do "dê-me dois", quando, nas melhores épocas, os argentinos compravam o dobro de tudo. Desta vez, os comerciantes brasileiros devem viver um "boom" de compras.

"Vamos nos permitir alguns luxos e comprar alguma roupa para toda a família", prevê Candelaria Torres, rodeada pelas filhas.

Em 2017, o ano recorde até agora, os argentinos gastaram US$ 1,6 bilhão no Brasil. Ficaram em média 11 dias e gastaram cerca de US$ 620 cada um. Esses números também devem ser superados agora nesta temporada. Pode ser até que não variem tanto em dólares, mas certamente em reais, depois da desvalorização da moeda brasileira.

"Nos anos anteriores, era uma caipirinha na praia a cada dois ou três dias. Agora, será todos os dias e até duas por dia. Comer camarão na praia era um por temporada. Neste ano, se não for todos os dias, será um a cada dois dias. E serão férias mais longas, vamos ficar uma semana a mais, quando sempre ficávamos duas", comemora, ansiosa, Paz Puente.

Eugenio Forchieri também descreve o que implica viajar sem se preocupar tanto com o bolso. "Na prática, que eu tenha mais reais no bolso, serão férias muito mais relaxadas. A gente vai poder sair para jantar, beber uma cervejinha na praia e pedir camarão ou qualquer outra coisa. Vai ser muito mais relaxado", prevê.

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