Churrasco ficará mais barato? Veja o que muda com a reforma tributária
A Câmara dos Deputados aprovou nesta semana o projeto que regulamenta a reforma tributária. Um dos destaques é a isenção total de impostos sobre alimentos essenciais na cesta básica, entre eles a carne.
O que aconteceu
Deputados aprovaram projeto após alterações no texto do Senado. Eles votaram a lista de mudanças feitas pelos senadores que serão mantidas —o placar foi de 324 a 123. Já a lista de alterações que não foram aceitas teve 328 a 18. O texto do Senado foi aprovado na semana passada.
Texto vai para sanção do presidente Lula (PT). Agora, cabem a ele a sanção e os eventuais vetos à reforma tributária dentro do prazo de 15 dias úteis. O veto à proposta pode ser total ou em apenas artigos específicos do texto validado pelo Legislativo.
Carnes, peixes, queijos e sal terão isenção tributária garantida. Integram a relação carnes bovina, suína, ovina, caprina e de aves e produtos de origem animal (exceto foie gras), peixes (exceto salmonídeos, atuns, bacalhaus, hadoque, saithe e ovas e outros subprodutos) e os queijos tipo mozarela, minas, prato, queijo de coalho, ricota, requeijão, queijo provolone, queijo parmesão, queijo fresco não maturado e queijo do reino.
Carne ficará mais barata?
Provavelmente não. O setor vem passando por um período complicado de ajustes de oferta, que tem feito os preços subirem. Tem ainda o impacto da estiagem e preço mais alto da soja, por exemplo, que encarece o produto.
Depende de muitos. Allan Couto, economista e fundador da plataforma Gain, explica que o impacto real dependerá de como produtores e varejistas reagirão à mudança. Caso os ganhos sejam repassados ao consumidor, os preços poderão cair, mas fatores como custos elevados de produção ou alta demanda podem neutralizar essa redução.
A própria oferta e demanda é um fator, sendo que menos oferta faz os preços subirem. O preço da ração, composta principalmente por restos de soja, a estiagem, fatores climáticos que se refletem nos pastos e a taxa de câmbio também giram em torno do preço, além de outros custos envolvidos na criação do animal. "Ainda que eles repassem, se a gente tiver pressão em preços dos outros lados da economia, a gente vai continuar tendo preços pressionados", diz a economista Juliana Inhasz, professora no Insper.
A medida pode desencadear efeitos em cadeia no mercado. Segundo Couto, a diminuição no preço da carne pode aumentar o poder de compra dos consumidores, estimulando a demanda por outros bens. "No entanto, se houver um aumento nos custos de produção, isso pode pressionar os preços de outros produtos relacionados à cadeia de suprimentos", explica.
Regiões e classes mais vulneráveis tendem a ser mais beneficiadas. O economista destaca que regiões com alto consumo de carne, como Sudeste e Centro-Oeste, podem sentir maior impacto positivo. As classes de baixa renda, que destinam uma parcela significativa de seus ganhos à alimentação, podem encontrar um alívio financeiro significativo. "Isso ampliaria o acesso a proteínas para esses grupos", avalia.
Isenção da carne poderia afetar imposto de outros bens. A redução ou mesmo isenção de imposto traz uma perda significativa para a nação. "O governo precisa garantir uma arrecadação. Se pôr a carne com alíquota zero impacta outros produtos, ele provavelmente vai distribuir essa tributação, mas a gente não sabe ainda, é difícil dizer se outros produtos de fato vão ser mais impactados", diz a economista.
Na prática, para o consumidor, não dá para esperar grandes reduções de preço. Pode ser que alguns itens tenham impostos reduzidos, mas os produtores têm tido margens de lucro muito apertadas e, nesse momento, vão querer um pouco de ganho com essa medida, diz Inhasz.
Seria ilusório da nossa parte achar que todo corte de tributo vai ser repassado em preços menores. Talvez alguns produtos fiquem um pouco mais baratos, mas é importante lembrar que os preços têm aumentado por outras questões, como oferta, baixa produtividade, riscos elevados e taxa de câmbio alta. Juliana Inhasz, economista
Nem toda redução de tributo resulta em preços menores. Couto concorda que os varejistas podem optar por não repassar integralmente a economia gerada pela isenção ao consumidor. Couto ressalta que aumentos nos custos de insumos ou maior demanda por produtos também podem anular os efeitos esperados. "Isso torna incerto o impacto direto da isenção no bolso do consumidor", diz o economista.
O que se prevê são preços subindo menos. "Mas a dinâmica de preços vai depender da condução das políticas econômicas fiscal e monetária para conter os preços mais baixos", diz Inhasz.
A longo prazo, a medida pode atrair investimentos e estabilizar o mercado. Com o aumento do consumo, a produção pode ser incentivada, gerando maior concorrência e eficiência no setor de carnes. Essa dinâmica pode resultar em preços mais equilibrados, mas depende de políticas que promovam sustentabilidade e equidade. "Sem essas ações, há o risco de pressão sobre recursos naturais e concentração de mercado", afirma Couto.
Qual o objetivo da reforma tributária?
Reforma promete simplificar o sistema e gerar justiça tributária. "No Brasil, os pobres pagam proporcionalmente muito mais da sua renda em impostos do que os mais ricos, porque os impostos no país recaem muito sobre o consumo", diz Inhasz. Visa também tornar mais transparente a arrecadação de impostos.
Quais as perspectivas para a economia do país?
Deve ocorrer um aumento de arrecadação. Inhasz aponta também para uma maior justiça distributiva e tributária a partir da implementação total da reforma. "Isso vai trazer, naturalmente, maior segurança e uma economia um tanto mais sólida", afirma. No cenário ideal, são ganhos em confiança e estabilidade.