[Coluna] Futuro do agro do Brasil está na qualificação profissional
[Coluna] Futuro do agro do Brasil está na qualificação profissional - Eficiente, dinâmica e flexível, agricultura do país é líder global do setor. Mas para garantir posição terá que aumentar produtividade. Isso só é possível se agricultores investirem mais nos funcionários.A agricultura brasileira não tem boa reputação na Europa. As palavras-chave são: falta de proteção da floresta tropical, excesso de pesticidas proibidos, favorecimento de latifundiários em detrimento de pequenos agricultores.
Essa imagem teima em permanecer, mas é apenas parte da realidade. Nenhum setor no Brasil é tão bem-sucedido quanto a agricultura, tão dinâmico e flexível na reação às mudanças mercadológicas e conjunturais.
Alguns fatos: atualmente, quase metade das exportações do Brasil consiste em produtos agrícolas. Em quase meio século, os agricultores mais do que dobraram sua área cultivada (+114% desde 1977). Ao mesmo tempo, eles mais que quintuplicaram a produtividade (+537%). No mesmo período, a produtividade dos agricultores aumentou em 2,5% ao ano – nos EUA, outra potência agrícola mundial ao lado da Europa, a alta foi de apenas 1% ao ano.
Durante esses períodos, o setor agrícola se transformou enormemente: antes do boom no oeste do país, o Brasil foi durante séculos um exportador de açúcar e café para o mercado mundial. Nesse meio tempo, a soja se tornou muito mais importante.
Adaptação rápida à demanda global
Os agricultores brasileiros conseguiram abrir novos mercados em um curto espaço de tempo e adaptar seu fornecimento aos desejos dos clientes estrangeiros ou às mudanças na demanda global. Três exemplos atuais:
Trigo: Nos últimos três anos, o Brasil se tornou um exportador do produto. O país sempre foi um grande importador da mercadoria, mas se adaptou após o declínio dos papéis de Ucrânia e Rússia no mercado global.
Algodão: Por muitos anos, o Brasil também teve que importar esse produto básico para o setor têxtil mundial. Hoje, porém, o país é o maior exportador do mundo, com a mais alta qualidade e uma produtividade por hectare duas vezes maior do que a dos EUA. Cada feixe de algodão pode ser rastreado até a plantação de onde se originou.
Carne bovina: Dez anos atrás, os produtores brasileiros de carne exportaram durante um ano 115 toneladas de carne bovina para a China – não muito mais do que dois caminhões grandes cheios. Nos últimos dois anos, foram mais de um milhão de toneladas anuais. O setor se adaptou às exigências exatas da China. Os matadouros brasileiros agora vendem cerca de metade de suas exportações para a nação asiática.
Esses exemplos mostram a rapidez com que os agricultores brasileiros, suas organizações e também o governo em Brasília podem reagir às mudanças nas condições do mercado mundial.
E o futuro?
Mas o que acontecerá em seguida? Três perguntas precisam ser respondidas:
Como a agricultura brasileira pode aumentar ainda mais sua produtividade?
Como a agricultura pode produzir produtos de maior valor para o mercado mundial, em vez de apenas matérias-primas que são processadas posteriormente?
E como os agricultores podem conquistar novos mercados, especialmente na Ásia, fora da China e da África?
Fácil não será: os aumentos de produtividade dos últimos 50 anos foram alcançados com o uso de tecnologia, pesquisa genética, fertilizantes e pesticidas, diz Marcos Jank, professor de agronegócio global do Insper, instituição de ensino superior e pesquisa sediada em São Paulo. Agora, para que haja mais progresso, é necessário o uso de inteligência artificial, tecnologia blockchain, drones e robôs.
Fuga de cérebros, escassez de pessoal qualificado
Mas o setor não está bem preparado para isso. Há uma escassez de pessoal qualificado em toda parte. Isso se aplica também à pesquisa agrícola, onde institutos e universidades estão sofrendo uma gigantesca fuga de cérebros. Os especialistas brasileiros em pesquisa agrícola são procurados em todo o mundo.
Mas isso também se aplica àqueles que trabalham nas fazendas. Desde 2012, o número de postos de trabalho caiu 20%. Não é de se admirar, pois são mal remunerados pelos padrões nacionais: o salário médio na agricultura em 2023 era de apenas R$ 1.814. Mas como as complexas máquinas de colheita, drones e robôs autônomos podem ser operados se durante anos quase nenhum investimento foi feito em treinamento de pessoal? A falta de pessoal bem treinado é atualmente um dos principais obstáculos ao aumento da produtividade na agricultura.
Penso que os agricultores brasileiros precisam mudar de atitude, pagando e treinando melhor seus funcionários. Essa é a única maneira de manterem sua liderança global.
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Há mais de 30 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.Autor: Alexander Busch