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Isolada no PT e protegida por amigos: o círculo de Janja | podcast Janja #5

do UOL

Do UOL, em São Paulo

24/12/2024 05h30

Desconhecida entre petistas históricos e lideranças feministas até ficar famosa, Janja é cercada pelos amigos que fez nos últimos sete anos, quando passou a circular como companheira de Lula.

Esses amigos contam com o apoio da primeira-dama para obter influência no governo federal e no Judiciário.

"Foguete não tem ré", quinto e último episódio de "Janja", podcast original UOL Prime, mostra que os novos amigos apoiam a primeira-dama em momentos de deslize.

Uma dessas ocasiões foi quando ela disse "Fuck you, Elon Musk", durante o G20 Social, no Rio, em novembro.

O podcast está disponível a partir desta terça-feira (24) no YouTube do UOL Prime, no Spotify, Deezer, Apple Podcasts e demais plataformas de podcast.

'De vista'

"Eu me reconheço como feminista desde 1999 e nunca tinha ouvido falar nela", disse ao UOL Junéia Batista, ex-secretária nacional de mulheres da CUT (Central Única dos Trabalhadores).

"Pode ser que ela fosse conhecida no Paraná", afirmou.

"Conhecia Janja de vista", disse Regina Cruz, vice-presidente do PT no Paraná e uma das coordenadoras da vigília Lula Livre, acampamento montado em frente à Polícia Federal no tempo em que Lula esteve preso em Curitiba.

"Janja era filiada ao PT, mas eu não tinha uma relação com ela", disse.

Antes de ser preso, em abril de 2018, Lula esteve com Janja em encontros entre aliados, como uma Semana Santa na casa do deputado estadual Emídio de Souza (PT-SP) em Maresias, no litoral paulista.

Janja ao lado de Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas - Divulgação/Prerrogativas - Divulgação/Prerrogativas
Janja ao lado de Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas
Imagem: Divulgação/Prerrogativas

Foi nessa época que Janja se aproximou da advogada Gabriela de Araújo, esposa de Emídio, e do casal de advogados Marco Aurélio de Carvalho e Alessandra Costa.

Carvalho é coordenador do Prerrogativas, grupo de advogados que se fortaleceu durante a Lava Jato, a favor de Lula, e hoje conta com mais de 30 integrantes no governo, além de quadros no Judiciário.

Em 6 de dezembro, o Prerrogativas homenageou Janja em sua festa de fim de ano. Um dos motivos da reverência foi a pressão da primeira-dama pela indicação de mais mulheres para cargos na Justiça.

Entre as escolhidas estão advogadas do Prerrogativas, como Gabriela Araújo, nomeada desembargadora do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, em São Paulo, em outubro passado.

Outra é Daniela Teixeira, que tomou posse no STJ (Superior Tribunal de Justiça) em novembro de 2023.

Há ainda Edilene Lobo e Vera Araújo, nomeadas para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 2023.

Briga de casal

Na festa em sua homenagem, Janja discursou pela primeira vez após o xingamento contra Elon Musk, e disse que estava nervosa. No palco, pediu por mais mulheres na Justiça.

Lula compareceu ao evento, que ocorreu na mesma data da festa de encerramento de um seminário do Partido dos Trabalhadores, em Brasília.

O presidente apareceu no seminário virtualmente, em um vídeo gravado no qual criticou a comunicação do PT e do governo.

A escolha de Lula pela festa dos advogados desagradou quem viu no ato uma mostra de que o presidente está afastado de seus antigos aliados.

Outros pontos importantes do episódio:

  • Fontes contaram ao podcast que, após o xingamento da primeira-dama a Elon Musk, ela e Lula brigaram. O presidente teria chamado a atenção da esposa pela quebra do decoro, naquele que seria, segundo relatos, o desentendimento mais sério do casal desde que começaram a se relacionar.
  • Janja acredita que entende de comunicação e se cerca de auxiliares que não contrariam suas recomendações. A influência da primeira-dama na Secom, a Secretaria de Comunicação, cria tensões entre ela e assessores pessoais do presidente. Essa tensão ficou evidente na internação de Lula em São Paulo para conter uma hemorragia.
  • Ao contrário do planejado pelo PT, a primeira-dama teve atuação nas campanhas eleitorais de 2024. Pesquisas mostraram que Janja tinha mais rejeição do que aceitação entre o eleitorado.

JANJA

Episódio 05: Foguete não tem ré

Fabíola Cidral
Era madrugada de 6 de setembro quando uma foto começou a ser encaminhada com frequência em grupos de políticos, jornalistas e integrantes do governo: a imagem de Janja beijando a testa de Anielle Franco.

No dia anterior, 5 de setembro, o governo viu estourar uma enorme crise do terceiro mandato de Lula. Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos, foi acusado de importunar sexualmente a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. A denúncia saiu no portal Metrópoles.

Fazia pelo menos três meses que os boatos envolvendo Silvio Almeida e Anielle Franco circulavam na Esplanada dos Ministérios e no Palácio do Planalto. Mas só começaram a ser investigados quando viraram notícia.

Silvio Almeida veio a público negar as acusações. Disse que tinha uma campanha orquestrada para afetar a sua imagem e atribuiu o fato a um grupo que, segundo ele, queria diminuir a sua existência.

Silvio Almeida
Falsos defensores do povo, pessoas que acolhem denúncias falsas por interesses pessoais. Vocês têm um caráter vil, baixo, são comprometidos com o atraso e a mentira.

Fabíola Cidral
Anielle Franco, por outro lado, permaneceu em silêncio. Não negou e nem confirmou a notícia. O país se mantinha assim, na expectativa pra saber se Lula aceitaria as explicações de Silvio Almeida.

Até que o post de Janja selou o destino do então ministro dos Direitos Humanos.

A foto não tinha legenda. Era apenas a imagem que descrevemos na abertura do episódio — e, bom, Janja sabe muito bem o valor das imagens.

Horas depois, Silvio Almeida foi demitido. Anielle, então, se pronunciou. Disse, pelas redes sociais, não ser "aceitável relativizar ou diminuir episódios de violência". E só.

Adriana Negreiros
Para além das denúncias de importunação, todo mundo sabia nos bastidores que Silvio Almeida e Anielle Franco vinham acumulando desentendimentos no governo.

Os dois tinham visões diferentes sobre a condução da agenda racial dentro dos ministérios. Pouco antes da denúncia, eles chegaram a trocar mensagens de WhatsApp sobre a disputa.

Anielle perguntava se tinha algo na relação profissional entre eles que poderia ser aprimorado. Dizia que tinha ouvido fofocas de que ele não gostava do trabalho dela.

Silvio respondeu que não era verdade, que nunca tentou excluí-la das ações que realizava no governo. Mas o fato é que, sim, havia uma tensão no ar.

Até setembro de 2023, Silvio Almeida integrava um grupo de advogados e acadêmicos. Já mencionamos esse grupo aqui no podcast.

Mix de trechos de notícias sobre o grupo Prerrogativas

Adriana Negreiros
Ativo desde 2014, o Prerrogativas é coordenado por Marco Aurélio de Carvalho, amigo pessoal e advogado de Janja. O grupo se fortaleceu e se aproximou de Lula na época da Lava Jato e durante a prisão do então ex-presidente.

Silvio Almeida deixou o Prerrogativas após uma discussão com colegas, no grupo de WhatsApp da turma. Não gostou de ser cobrado por projetos do ministério.

Horas depois da saída de Silvio, no mesmo dia, o Prerrogativas ganhou uma nova integrante: Anielle Franco.

A matéria do Metrópoles mencionou também outras denúncias contra Silvio Almeida feitas à ONG Me Too Brasil, que tem integrantes no Prerrô, como eles são conhecidos.

No fim, a queda do ministro foi vista como uma vitória de Anielle, de advogados do grupo - e de Janja.

Nesse episódio, vamos mostrar como Janja é uma figura central na relação entre o marido e o mundo exterior. A influência da primeira-dama no afastamento do petista da velha guarda do partido; e o fortalecimento da relação do presidente com a nova turma em Lula III. Gente que aos olhos de muitos não diz para Lula o que ele precisa ouvir.

Fabíola Cidral
Vamos mostrar como esses novos aliados protegem Janja em momentos de deslizes, como quando ela disse "fuck you Elon Musk".

Como eles fortalecem Janja sabendo da influência que ela tem no governo; na expectativa de que, um dia, ela também tenha sua própria posição de poder — não necessariamente vinculada a Lula.

Fabíola Cidral
Eu sou Fabíola Cidral.

Adriana Negreiros
Eu sou Adriana Negreiros.

Fabíola Cidral
E este é Janja, um podcast original UOL Prime.

Episódio 5: Foguete não tem ré

Adriana Negreiros
Algumas semanas antes daquela sexta-feira, 6 de dezembro, fiquei sabendo que o grupo Prerrogativas organizaria a sua tradicional festa de fim de ano. Tentar conversar com parte daquela turma, por si só, já renderia novas informações pro nosso podcast.

Então, mandei uma mensagem pro Marco Aurélio de Carvalho pedindo um convite. Ele, muito gentilmente, me enviou um QR Code liberando o meu acesso à casa de shows.

Pra tornar a festa ainda mais imperdível, tinha sido anunciado que a homenageada da noite seria Janja.

Foi assim que pedi um Uber com destino com destino à Casa Natural Musical, no bairro de Pinheiros, aqui em São Paulo, e rumei pra festa do Prerrô.

O quarteirão da Casa Natura estava bloqueado, com seguranças posicionados para receber o presidente da República.

Depois de apresentar meu QR Code, fui conduzida por um corredor e subi um lance de escadas que me levou à pista da casa.

Me posicionei ao lado de uma caixa de som, para captar melhor o áudio.

Janja e Anielle Franco em evento do grupo Prerrogativas, que homenageou a primeira-dama - Divulgação/Prerrogativas - Divulgação/Prerrogativas
Janja e Anielle Franco em evento do grupo Prerrogativas, que homenageou a primeira-dama
Imagem: Divulgação/Prerrogativas

Fabíola Cidral
O Prerrogativas tem em seus quadros nomes de peso do poder, como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Ao todo, o grupo tem mais de 30 integrantes em cargos no governo, além de outros no Judiciário.

A festa de fim de ano, com a presença do presidente da República e de nove ministros foi vista por muitos como mais uma demonstração de força do grupo.

No palco, Marco Aurélio discursou.

Marco Aurélio de Carvalho
Independentemente de onde e quanto, o Prerrogativas estarão sempre na vanguarda e nas trincheiras da resistência, estaremos sempre na luta por uma sociedade verdadeiramente democrática, em favor de um Brasil que assegure respeito trabalho e Vida decente a todos e todas nós e esse Brasil é obriguei o Brasil do presidente Lula é o Brasil da Janja é o Brasil dos ministros do estado que nos orgulham e estão aqui em cima. [tapete, pra não ficar tão brusca a interrupção]

Fabíola Cidral
Depois das formalidades, Marco Aurélio brincou sobre o que considera um talento de Janja para os assuntos jurídicos. Não é só ele quem vê Janja assim.

A gente já falou disso aqui, quando contamos sobre a participação de Janja no 8 de janeiro. Quem defende que ela foi decisiva para que Lula não decretasse a GLO diz que ela entende de Direito mais do que muitos advogados.

Marco Aurélio de Carvalho
Nós vamos organizar a grande homenagem da nossa grande companheira que deveria carregar uma carteira da OAB porque carrega dentro de si o espírito da advocacia que é o senso da justiça, nós vamos dar um OAB pra ela, (...) em consenso a gente decidiu fazer essa homenagem.

Oradora
Muito barulho para Janja! .

Eu, particularmente, tô bastante curiosa sobre o que a Adriana encontrou por lá, então vou deixar que ela conte pra gente.

Adriana Negreiros
Depois que Marco Aurélio saudou o público, a atriz Roberta Estrela D'Alva subiu ao palco. Ela fez uma homenagem à primeira-dama em formato de slam.

Roberta Estrela D'Alva
Carta a uma mulher de luta. O senhor presidente se apaixonou primeiro, mas todo mundo se apaixonou depois (...) e as minhas palavras ofereço profetizando que está por vir: aliança globais contra a desigualdade e a fome e seu nome ecoando no mundo inteiro.

Janja assistiu à apresentação sentada em uma cadeira, no palco. Lula a observava em um camarote, no mezanino.

Roberta Estrela D'Alva
Tu vai ouvir falar dela, ela que também é guerreira do povo brasileiro. Ela tá aqui ela tá lá, ela tá acolá. Essa mulher é uma ou é mil? Eu só sei que ela é mais que a primeira dama do presidente. Eu só sei que agora ela já é Janja do Brasil. [tapete palmas]

Adriana Negreiros
Janja foi homenageada também por um vídeo com uma sucessão de imagens dela em diferentes ocasiões - diante de um microfone, dançando, falando ao telefone, abraçando Lula, posando para fotos.

Para findar as homenagens prestadas a ela pelo Prerrogativas, Marco Aurélio voltou ao palco, trazendo consigo um presente, sobre o qual fez suspense. Estava embrulhado em plástico bolha. Do lugar que eu tava, na plateia, a poucos metros do palco, demorei a entender do que se tratava.

Pessoa da plateia
É uma boia?

Adriana Negreiros
O presente inusitado era uma obra do artista plástico Eduardo Srur, uma boia salva-vidas estilizada e colorida, feita de material reciclável.

Marco Aurélio de Carvalho
No momento de tanto ódio, de tanta intolerância, Janja e presidente, para vocês levaram para casa, é um presente pessoal.

Adriana Negreiros
Depois, ao circular pela festa, eu ouvi piadas de que o regalo tinha sido apropriado: após as gafes recentes que havia cometido, Janja precisava mesmo de uma boia daquelas.

Mas era chegada a hora da homenageada tomar a palavra.

Marco Aurélio de Carvalho
Janja, agora a palavra é sua, quase nada nesse grupo é difícil, mas foi muito fácil escolher uma homenageada pro dia de hoje.

Adriana Negreiros
Quando pegou o microfone, Janja assumiu que estava nervosa. Disse que se sentia assim por causa da presença do marido -- segundo ela, aquela era uma ocasião rara em que discursava diante dele.

Janja já discursou diante do presidente. Temos registro de pelo menos uma vez, durante a live da campanha "Brasil da Esperança", que ocorreu em setembro de 2022.

Mas essa era a estreia de Janja aos microfones depois do polêmico "Fuck you, Elon Musk", proferido algumas semanas antes.

Janja
Gente, eu vou confessar uma coisa para vocês: eu tô bem nervosa, porque normalmente quando eu falo nos eventos, meu marido não tá. Então eu nunca, ele nunca vê eu falando. Então para mim é mais tranquilo falar quando ele não tá, mas falar com ele me olhando ali tá me deixando bastante nervosa. Mas, enfim. Deixa ele ali, depois ele vai me dizer o que achou.

Adriana Negreiros
Lula acompanhava o discurso de Janja do camarote no piso superior, em pé, com semblante sério e a mão próxima ao queixo.

Deu um sorrisinho quando ela mencionou o nervosismo; mas parecia, ele mesmo, um pouco tenso. Ele acompanhou o discurso atentamente, sem conversar com ninguém, sem tirar os olhos da esposa.

Janja disse que estava emocionada. Brincou dizendo que não sabia se merecia tudo aquilo

Janja
Olha só, vou começar agradecendo vocês por já ter arrumado minha maquiagem aqui, a gente, mulher é um inferno, né? Passar a tarde inteira se arrumando e daí chega aqui e chora eu já sei que eu vou chorar mais ainda gente. Boa noite, boa noite. Boa noite pro meu amor ali em cima, boa noite ministros.

Adriana Negreiros
Nove ministros estavam ali prestigiando Janja. Dentre eles, Fernando Haddad, da Fazenda; Anielle Franco, da Igualdade Racial; e Cida Gonçalves, do Ministério das Mulheres.

Janja
Então, eu, esse foi um ano difícil, mas também foi um ano em que a gente tá colhendo muitas sementes, como o meu marido disse, o presidente Lula diz, tão começando a colher as sementes.

Adriana Negreiros
As dificuldades do ano de 2024 -- algumas delas abordadas por esse podcast -, foram lembradas pela primeira-dama no discurso, mas sem entrar em detalhes. Ela preferiu falar do futuro.

Janja
Então eu acho que se tem uma palavra que a gente pode definir e fechar esse ano de 2024 é Esperança. Então eu acho que esperança é a palavra que nos movimenta para um 2025 com uma colheita melhor ainda, né? Por um país mais justo, solidário e igualitário, isso é o mais importante. Então, gente, muito obrigada pelo Prerrogativas pela homenagem. Eu tô muito feliz, muito emocionada, obrigada mesmo de coração a todos vocês e divirtam-se. Hoje à noite é pra se divertir, eu quero deixar aqui o meu abraço, abraço pro meu marido, abraço pro meu marido, pra todo mundo que veio se divertir aqui essa noite e um beijo enorme pra vocês.

Fabíola Cidral
Aquela sexta-feira, dia 6 de dezembro, estava bastante disputada.

Em Brasília, naquele mesmo dia e naquela mesma hora, acontecia a festa de encerramento de um seminário do Partido dos Trabalhadores.

Como Lula não podia estar nos dois lugares ao mesmo tempo, escolheu comparecer à festa do Prerrô.

Não preciso nem ressaltar que a escolha de Lula pelo evento paulistano gerou ciúmes por parte do partido. E pior: Lula enviou um vídeo a ser exibido no evento do PT que era bem pouco lisonjeiro.

O presidente entrou na festa via chamada de vídeo, gravada previamente.

No discurso, Lula reclamou duramente da comunicação do governo e do PT. Pediu que o partido voltasse à base e, sem citar nomes, deixou bem claro o seu incômodo.

Para aliados e integrantes do governo, foi um recado direto ao ministro Paulo Pimenta da Secom, a Secretaria de Comunicação Social.

Lula
Mas eu sinto que, cada vez eu viajo, converso, que atendo ministro, que nós não estamos entregando de forma adequada para que a sociedade tenha as informações daquilo que nós fizemos.

Fabíola Cidral
Poucos ministros do governo foram à festa do PT.

Fátima Bezerra, do Rio Grande do Norte, representou os governadores petistas. Participaram também alguns deputados, como José Guimarães, líder do governo na Câmara; Zeca Dirceu, e Benedita da Silva.

Ainda estiveram presentes o ex-ministro José Dirceu e Delúbio Soares, ex-tesoureiro do partido.

O fato de Lula ter ido à festa do Prerrô, e não a do PT, foi visto como mais uma demonstração de força do grupo de advogados.

A homenagem à Janja também foi estratégica. Seria esquisito se a primeira-dama não aparecesse em um evento do qual ela era protagonista. E ela estando presente, as chances de Lula ir aumentavam de forma considerável.

A disputa entre a festa do PT e a homenagem a Janja, em São Paulo, são sintomáticas de um incômodo que já vem sendo sentido na comunicação do governo há um bom tempo.

Mas a gente já te conta essa história com mais detalhes.

Adriana Negreiros
Voltemos à festa.

Após os discursos, Maria Rita subiu ao palco para cantar. Lula não ficou para o show, mas Janja, sim. Ela acompanhou a apresentação em um cercadinho próximo ao palco, dançando com a ministra Anielle Franco e com a Gabriela Araújo, desembargadora e uma de suas amigas mais próximas.

Nessa hora, eu me aproximei para tentar algum contato com Janja. Filmava a primeira-dama quando fui abordada por uma mulher.

Eu já tinha notado que essa mulher ficava, a todo instante, tapando a visão que eu tinha de Janja, impedindo que eu a filmasse. Achei que fosse só uma coincidência, mas não era.

A mulher queria saber porque eu estava filmando Janja, e então expliquei que era jornalista. "Adriana?", ela perguntou. Eu confirmei.

Depois, eu ficaria sabendo que a minha presença ali não era exatamente bem quista pela equipe de Janja e que tinha uma porção de gente de olho em mim, medindo todos os meus passos e atitudes.

Naquela noite, o nosso podcast só tinha levado dois episódios ao ar, mas já foi suficiente para provocar desconforto no staff da primeira-dama.

De todo modo, a mulher se apresentou. Disse que era Brunna Rosa, a secretária de Estratégias e Redes do governo. Ela já apareceu neste podcast. Contamos como ela é a pessoa de confiança de Janja na comunicação do governo.

Embora já a tivesse citado aqui, eu não a conhecia pessoalmente. Nem tinha ligado o rosto dela à imagem do WhatsApp, porque a gente já tinha trocado mensagens.

Eu tinha procurado a Brunna pedindo uma entrevista, que ela negou. Depois, ela me mandou mensagens reclamando da minha apuração para o podcast e para as matérias que fiz para o UOL. "Vocês escreveram um monte de coisa que não sei da onde tiraram rs", ela escreveu.

Apesar desse histórico pouco amistoso, eu fiquei feliz de finalmente conhecer a Brunna. Pedi a ela que me apresentasse a Janja, para que eu pudesse entrevistá-la, mas ela não quis me ajudar. Disse que a primeira-dama estava ali para se divertir, não para dar entrevistas.

Janja, Brunna Rosa e toda a equipe da primeira-dama foram embora logo depois dessa conversa.

Eu continuei por ali, conversando com um e com outro, procurando saber o que tinham achado da homenagem à Janja. Um comentário em especial me chamou a atenção.

Um advogado me disse que, na ausência da primeira-dama, de Lula e dos ministros, e já embalados pelo terceiro ou quarto drink, estavam todos à vontade para, finalmente, falar sobre ela sem cerimônias.

Um comentário que ouvi foi de que estavam todos na expectativa de que, a qualquer momento, Janja repetisse a gafe do G-20.

A gente vai falar mais sobre aquele dia que provavelmente Janja quer esquecer.

Fabíola Cidral
Em 16 de novembro de 2024, ocorreu no Rio de Janeiro um evento pré-G20, que é aquela reunião anual entre os líderes das principais economias do mundo. Era a primeira vez que o Brasil recebia o evento.

A celebração paralela, que aconteceu uns dias antes do G2, teve como mestre de cerimônias não oficial a primeira-dama Janja da Silva, que apresentou convidados e comandou algumas mesas temáticas.

O evento reuniu grandes nomes da música nacional como Daniela Mercury, Seu Jorge, Maria Rita e Zeca Pagodinho.

A Imprensa apelidou o evento de "Janjapalooza", em referência ao festival americano, que tem a sua versão brasileira já há alguns anos.

A primeira-dama não gostou da brincadeira. Durante o evento, quando uma apoiadora citou o apelido, Janja prontamente rebateu:

Janja
Não, filha, é Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, vamos ver se consegue entender a mensagem, tá? É isso.

Fabíola Cidral
A reprimenda de Janja repercutiu nas redes sociais. Mas o ponto alto da participação da primeira-dama no evento estava por vir.

Numa palestra cujo tema era o combate à desinformação digital e a defesa da regulamentação das redes, Janja falava ao microfone quando um barulho interrompeu a sua palavra.

Era a buzina de um navio que passava pela Baía de Guanabara. Diante do ruído, ela soltou:

Janja
Eu não tenho medo de você, inclusive, fuck you Elon Musk.

Fabíola Cidral
Parte da plateia deu risada, outra assistiu surpresa ao que tinha acabado de acontecer. A primeira-dama do Brasil, num evento oficial, tinha mandado um dos homens mais poderosos do mundo -- desculpem o palavrão -- "se foder".

O "Fuck you, Elon Musk" pegou muito mal fora do Brasil e ofuscou as pautas importantes do encontro.

Fabíola Cidral
Apenas duas semanas antes do G-20, Musk tinha sido nomeado para liderar o Departamento de Eficiência Governamental do recém-eleito presidente dos Estados Unidos Donald Trump.

Ao ver o vídeo em que era xingado por Janja, o bilionário respondeu ao ataque da primeira-dama e fez um post que dizia: "Eles vão perder a próxima eleição".

A situação foi de desconforto geral. Até o presidente Lula, que nunca tinha feito nenhuma repreensão à esposa em público, comentou o ocorrido no encerramento do encontro. E disse:

Lula
Eu queria dizer pra vocês que essa é uma campanha em que a gente não tem que ofender ninguém, não temos que xingar ninguém. Nós devemos apenas indignar a sociedade.

Adriana Negreiros
A bronca não foi apenas pública. Como a gente vai ouvir daqui a pouquinho.

A imprensa ficou em cima do Janjapalooza por duas razões distintas. Primeiro, não tinha nada que justificasse o festival.

Segundo, o evento torrou dinheiro público num momento em que o país discutia corte de gastos.

A justificativa de que os artistas convidados receberam, cada um, um cachê simbólico de 30 mil reais também não pegou bem.

Entre adversários de Janja no governo, o comentário era de que o Janjapalooza tinha sido criado apenas para promover a figura da primeira-dama.

Ao longo dos três dias de festival Janja subiu várias vezes ao palco fazendo até um feat com a cantora Daniela Mercury.

O deputado federal Ubiratan Sanderson do PL do Rio Grande do Sul enviou ao TCU, o Tribunal de Contas da União, um relatório apontando suposto superfaturamento no festival. Ele também citou os valores de patrocínio pagos por estatais.

Sonora Tribunal de Contas
"O Tribunal de Contas da União vai apurar o caso de uso de dinheiro público no Janjapalooza. Aquele festival que foi feito lá, de forma paralela, ao G20, no Rio de Janeiro."

O documento elaborado pelo deputado mencionou que mais de 33 milhões de reais foram pagos pela Itaipu Binacional e pela Petrobras.

O segundo evento paralelo de Janja também não teve a boa repercussão esperada por ela. O CRIA G20 foi pensado para que comunicadores digitais levassem mais engajamento para as redes do governo. Mas o assunto mais comentado do dia acabou sendo a primeira-dama.

Fabíola Cidral
No dia 20 de Novembro, baixada a poeira, Brunna Rosa fez um post em seu instagram. Enalteceu a independência da sua equipe em uma foto com a primeira-dama e outros integrantes do time.

A legenda dizia que elas vieram para transformar ocupando espaços que por muito tempo foram negados às mulheres.

Afirmou que quando uma mulher brilha, ela não ofusca ninguém, ela ilumina.

Finalizou com a frase motivacional "foguete não tem ré", aqui usada de maneira irônica.

Musk é diretor da SpaceX, empresa que criou o foguete SuperHeavy, que — pasmem — dá ré.

O xingamento a Elon Musk foi o ápice de um dia particularmente desastrado da primeira-dama.

Minutos antes, além de reclamar do apelido Janjapalooza, Janja falava do trabalho do ministro Alexandre de Moraes no combate à desinformação e ao impacto das notícias falsas.

Ela dizia que o ministro tinha cancelado sua presença no painel por causa do ataque terrorista ao STF. Sobre o incidente, falou:

Janja
O ministro Alexandre de Moraes que tem sido um grande parceiro nessa questão das fake news, por mais que seja difícil, ele está enfrentando. E por conta do que aconteceu em Brasília, inacreditavelmente aconteceu em Brasília essa semana e o bestão lá acabou se matando com fogo de artifício. Mas enfim. Incrível. (...) A gente ri, mas é sério gente. Olha só o que faz as redes sociais na mente das pessoas, né?

Adriana Negreiros
Voltando ao Prerrogativas, o grupo se tornou um aliado leal de Janja. São eles e o presidente Lula que amenizam o desamparo político e as críticas sofridas pela da primeira-dama como este comentário de Octavio Guedes na Globonews.

Octávio Guedes
"Eu vejo como um ato de deslumbramento, o poder deslumbra as pessoas. Você viu a quantidade de puxa-saco que tava rindo? Se ela estivesse numa roda de samba, com a camisa do PT, cerrando os punhos e xingando o Elon Musk, ok. Mas ela é a primeira-dama e a primeira-dama carrega, em grande parte, a imagem do governo e a imagem do Estado. Ou seja, você nem precisa ser recatada. Mas você não pode ser desbocada.

Adriana Negreiros
Um comentário frequente entre observadores do governo é de que, em Lula III, o presidente está cercado de gente que não diz a ele o que ele precisa ouvir. Gente mais nova, que já o conheceu no poder, e por isso é reverente a ele - bem diferente dos antigos companheiros que tavam perto de Lula desde antes da fundação do PT.

Essa reverência também cerca a primeira-dama.

No primeiro ano do governo, Janja tinha uma assessora de imprensa com bom trânsito entre jornalistas,Christina Charão. Conhecer quem está nas redações, entender como funciona o jornalismo são pré-requisitos fundamentais para o cargo.

Mas Cristina deixou o cargo e Janja passou a ser assessorada por pessoas próximas a ela. Gente que está mais investida em proteger a amiga do que atuar como assessora, como a Neudi Oliveira, que ela conheceu durante a vigília.

Eu tentei entrevistar a Christina e a Neudi. Nenhuma delas quis falar comigo.

Já Lula conta com uma equipe de comunicação que o acompanha há anos. Fazem parte dela o fotógrafo Ricardo Stuckert, que é secretário de Produção e Divulgação de Conteúdo Audiovisual. Também integra o time o secretário de imprensa José Chrispiniano. Em Lula III, o recém-chegado Paulo Pimenta se juntou à Secretaria de Comunicação do Governo.

Janja acredita que entende muito de comunicação. E, muitas vezes, Por isso, muitas vezes, como já demonstramos aqui, age por contra própria, contrariando as recomendações de quem trabalha com o presidente há anos. é do ramo.

As reiteradas tentativas de Janja de interferir na comunicação do governo criaram um ambiente de disputa entre ela e gente importante da equipe. Ela e Ricardo Stuckert, por exemplo, têm uma relação distante, protocolar.

Em outubro de 2024, Lula sofreu um acidente doméstico. Caiu no banheiro e bateu a cabeça. Em dezembro, precisou ser internado no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para drenar uma hemorragia.

Quando Lula foi hospitalizado, Janja impediu que qualquer informação sobre o estado de saúde do marido fosse divulgada pela SECOM. Os únicos autorizados a falar com os jornalistas eram o médico Roberto Kalil Filho e a assessoria de imprensa do hospital.

Aqui o Roberto Kalil, falando à imprensa antes de o presidente passar pelo procedimento para evitar novos sangramentos.

Roberto Kalil
Nós iamos divulgar pra vcs (...) mas a dona Janja ?.

Adriana Negreiros
De qualquer maneira, as poucas informações solução centralizadora sobre o estado de saúde do presidente desorientaram ou a imprensa e afligiramu o mercado.

Débora Bergamasco (CNN)
"Quando saiu o boletim começou a ter muito burburinho na imprensa, e aí, sem as informações precisas a coisa vai ganhando uma proporção que vai saindo do controle. O Dr Kalil e a Dra Ana Helena desceram rápido pra fazer esse quebra-queixo tão rápido pra tentar estancar este problema. Porque de fato é uma questão muito séria, foram poucas as informações nesse boletim, mas eles desceram correndo pra prestar essa informações porque? Porque o melhor método, o melhor remédio e a melhor vacina contra fake news é a transparência e a informação."

Adriana Negreiros
Eu conversei com o ministro Paulo Pimenta, responsável pela SECOM, sobre essa decisão de centralizar as informações na equipe médica. Ele negou que Janja fosse a responsável pelo pedido. E afirmou que a decisão foi tomada em comum acordo entre a Secom e Lula.

Fabíola Cidral
Apesar das gafes de Janja, o G20 terminou com saldo positivo. Lula conseguiu que todos os membros se comprometessem na Aliança Contra a Fome, uma de suas principais promessas de campanha.

Segundo a revista Veja, o Instituto Nexus fez um levantamento sobre o impacto de Lula e Janja no G20 a pedido do governo. Eles analisaram mais de 9 mil abordagens na imprensa nacional e mais de 2 mil na imprensa internacional. As mais de 90 mil menções nas redes sociais também se somaram a essa pesquisa.

As 15 mil menções a Elon Musk foram majoritariamente negativas. Mesmo assim, o bilionário brilhou no G20 por causa de Janja.

Em apenas dois dias, ele teve o mesmo nível de exposição do atual presidente dos Estados Unidos, Joe Biden e só perdeu em destaque para Lula que, afinal, era o anfitrião do evento.

Adriana Negreiros
No dia seguinte ao insulto afrontoso, a ressaca moral pairava no G20 Social. Isso teria afetado também a relação do casal Lula da Silva.

Fontes me disseram que essa foi a primeira vez em dois anos que Lula ponderou sobre o comportamento da Janja. O presidente teria chamado a esposa para conversar no sábado à noite, logo após o ocorrido, e o casal brigou.

Lula teria chamado a atenção de Janja sobre o comportamento dela.

No dia seguinte, Janja voltou a cumprir sua agenda dentro do G20. Marcou presença na Cúpula de Líderes e se sentou em lugar de destaque.

Janja não assumiu que errou, pelo menos não naquele momento. Em sua defesa, seus aliados disseram que Janja falou o que muita gente já queria ter dito antes.

Foi essa a análise, por exemplo, do ex-ministro das relações exteriores Celso Amorim, assessor especial de Lula - muito embora ele tenha feito uma importante ressalva. Uma coisa é o que ele pensa. Outra é o que ele deve dizer.

Celso Amorim
"Não atrapalha em nada, é um julgamento pessoal. Aliás, o meu não seria muito diferente. Mas como eu sou diplomata, sou obrigado a usar palavras suaves."

Pelo menos publicamente, a primeira-dama é estimulada por aliados e integrantes do governo a acreditar que qualquer crítica às suas ações não passa de tentativa de calar uma mulher independente.

E, com uma agenda ligada ao protagonismo das mulheres, Janja parecia a figura perfeita para alavancar as candidaturas femininas do PT. A Fabíola vai falar mais sobre isso.

Fabíola Cidral
Nas eleições municipais de 2024, o PT Mulher montou um plano de colocar Janja para rodar o país apoiando candidaturas femininas de destaque pelo partido.

Gustavo Uribe (CNN)
A atenção dada à primeira-dama tem inclusive tem feito com que o PT programe uma agenda de viagens pra Janja durante as eleições municipais de 2024. A ideia é que ela atue como uma espécie de cabo eleitoral e divida com o presidente Lula a presença em palanques considerados estratégicos.

Fabíola Cidral
É inegável que Janja tem vontade de ter maior participação em eventos que são propriamente políticos. Estar nos comícios significa se inserir no mundo eleitoral, universo com o qual ela tem pouca intimidade.

O plano, anunciado pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann, definiu que Janja iria marcar presença nos palanques de capitais como Porto Alegre, Natal e Campo Grande; e de cidades importantes de médio porte, como Uberlândia.

Janja
"Nessas eleições vote nas candidatas do PT! Aumentar a participação feminina na política é um desafio diário e constante. Onde nós mulheres, devemos sempre nos encorajar e nos fortalecer. Somos a maioria da população e a maioria dos eleitores no nosso país. Precisamos lembrar da grandiosidade do nosso papel e da nossa presença em todos os espaços. Eleger mulheres para as prefeituras e para as câmaras municipais é ter certeza de uma gestão que cuida com mais atenção das famílias brasileiras."

Fabíola Cidral
A ideia era cumprir dois objetivos do PT: o primeiro, representar Lula em cidades importantes politicamente e que ele não pretendia visitar durante a campanha. O segundo, ajudar a popularizar a imagem de Janja, relacionando a primeira-dama ao eleitorado jovem e feminino.

Janja tem como bandeira a defesa de mais mulheres em espaços de poder.

E, na campanha de 2022, ela militou por essa causa. Acabou chamando a atenção de lideranças do PT que enxergaram nela um ativo entre as mulheres que poderia ser acionado quando preciso.

Em entrevista à Adriana, o Edinho, prefeito de Araraquara e coordenador da campanha do governo em 2022, disse que isso aconteceu de forma espontânea.

Edinho Silva
Nunca teve uma reunião, uma deliberação, de um papel pré-estabelecido pra Janja. A Janja é a Janja, com a autenticidade dela, com a personalidade dela, e ela foi atuando na campanha de forma autêntica e natural.

Fabíola Cidral
A estratégia do PT nas eleições municipais não funcionou em nenhuma das frentes.

Lula, amargou largas derrotas nas cidades em que havia mulheres apoiadas por ele na disputa. Maria do Rosário perdeu em Porto Alegre; Camila Jara perdeu em Campo Grande; Dandara Tonantzin perdeu em Uberlândia.

Até em Natal, onde o presidente chegou a comparecer e subir no palanque, Natália Bonavides foi derrotada por um candidato do União Brasil.

A circulação da imagem de Janja também não vingou. Quando a campanha começou e as candidaturas foram lançadas, ela se retraiu.

Dentro do PT, rapidamente se entendeu que Janja não iria trazer o resultado esperado e que nenhuma candidatura iria se beneficiar de sua presença no palanque.

Pesquisas internas do partido e externas publicadas pela imprensa apontavam que a primeira-dama tinha mais rejeição do que aceitação entre o eleitorado.

Quinze dias antes do primeiro turno, Janja tinha aparecido em poucas campanhas eleitorais das candidatas do PT.

Uma candidata que usou o apoio da primeira-dama em sua campanha foi Camila Moradia, que concorreu ao cargo de vereadora no Rio de Janeiro.

Janja
Vote, Camila Moradia!

Fabíola Cidral
Além de Janja, Camila também contou com o apoio da ministra da Igualdade Racial Anielle Franco na sua campanha.

Ainda assim, a ativista teve apenas dois mil e setecentos votos e não se elegeu ao cargo.

Sem apoio moral e político, Janja abdicou dos palanques mas não desceu do palco que lhe é familiar: as redes sociais.

Janja
"Nesse domingo, nós, mulheres, temos a oportunidade de votar em quem valoriza nossas vidas. E em quem caminha do nosso lado pelo fim da violência contra mulheres"

Fabíola Cidral
Na véspera do segundo turno da prefeitura de São Paulo, Janja se juntou a um grupo seleto de mulheres para gravar um vídeo pedindo votos para o candidato Guilherme Boulos.

Chamado "Carta Aberta às Mulheres", o vídeo trazia personalidades como Vera Iaconelli, Bela Gil e Sâmia Bonfim relembrando o boletim de ocorrência por agressão feito pela esposa de Ricardo Nunes em 2011.

O tom alarmista da mensagem desagradou — e muito.

Baleia Rossi, presidente do MDB, comentou com integrantes do governo que ficou incomodado com o conteúdo e a divulgação do vídeo na véspera da principal disputa do partido.

Especialmente porque o MDB é o partido de Ricardo Nunes e está à frente de três ministérios no governo Lula III.

"Carta Aberta às Mulheres" também não teve o impacto esperado. Nunes venceu a eleição com quase 60% dos votos.

Além do fracasso eleitoral, a denúncia contra o prefeito tampouco engajou a pauta de violência doméstica.

Os comentários no vídeo chamavam as mulheres de "ridículas" por execrar Nunes e ignorar o caso de Luiz Cláudio, filho de Lula, acusado de agressão física contra sua namorada.

Alguns também acusavam a campanha de "hipócrita", por não ter gravado vídeos sobre a denúncia de importunação sexual do ministro Silvio de Almeida que tinha vindo a público no mês anterior — história que abriu o nosso episódio.

Adriana Negreiros
Ao longo de todo o podcast, a gente ouviu que a primeira-dama se envolve em muitos assuntos do governo, e se declara uma articuladora política.

Essa postura rende a ela também uma enxurrada de críticas. E quando perguntada do porquê desse comportamento Janja é enfática:

Janja
Porque eu quero ouvir o que eles estão falando. Porque essas reuniões são muito fechadas. O que sai dali é um fiapinho e eu acho importante isso. Eu acho que as mulheres dos presidentes tem uma voz que pode ser ouvida, que pode reverberar, eu sempre falo isso, né? E eu tô aliando tudo isso a minha visão de mundo, as coisas que eu acredito, então estar nesses espaços, aprendendo também e dialogando.

Fabíola Cidral
Desde o começo desse podcast, a gente quis entender aonde Janja quer chegar.

Josias de Souza
Eu enxergo a Janja como um personagem de outro tipo. Ela tem pretensões políticas. Ela tá se equipando para ostentar essa candidatura publicamente.

Fabíola Cidral
A primeira-dama já reiterou por várias vezes que não tem interesse em se candidatar a algum cargo.

Como nessa entrevista para a CNN, em novembro de 2024.

Janja
Não tá no meu sonho, sendo bem sincera, não tá no meu sonho entrar pra carreira política.

Fabíola Cidral
Mas na conversa, quando perguntada diretamente pela repórter, saiu pela tangente. Não disse nem que sim, nem que não.

Janja
Não tenho pretensão a isso. Pode ser que eu tenha vocação, mas eu não tenho muita paciência.

Fabíola Cidral
Por ser casada com o presidente Lula, Janja não pode concorrer a cargos políticos na próxima eleição. Mas, se Lula renunciar ao cargo, Janja poderia se candidatar, como fez Rosinha Garotinho na eleição ao governo do Rio de Janeiro em 2002.

Adriana Negreiros
Alguns aliados apostam que ela deve buscar trabalhar nas pautas que lhe são caras -- a igualdade de gênero e o combate à fome, só para citar algumas. Outros poucos, acreditam que ela e Lula vão curtir uma aposentadoria conjunta, longe dos holofotes.

Mas tem também quem aposte que, quando for legalmente possível, Janja vai tentar a sua vez no mundo político.

O Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Prerrogativas - o grupo de advogados que homenageou a primeira-dama na festa que narramos nesse episódio - foi taxativo.

Marco Aurélio de Carvalho
Ela tem toda a condição de se projetar nacionalmente com uma liderança autônoma independente. A forma como ela trabalha essas pautas que são caras pro Partido dos Trabalhadores a habilita, né, a credencia a disputas futuras, não tenho a menor dúvida. Acho que seria pro país um luxo ser presidido novamente por uma mulher caso, eventualmente, ela se credencie como uma eventual postulante a essa posição, né? Mas tem outras tantas né? Deputada, senadora, tem tanta coisa, enfim, que ela poderia disputar, se ela quisesse.

Fabíola Cidral
Como aqui no UOL as previsões ficam a cargo de Márcia Sensitiva, cabe a gente esperar pra ver.

No que diz respeito ao nosso jornalismo, os passos da atual primeira-dama — e das próximas ou próximos — nunca deixarão de estar sob o nosso radar.

Afinal, mesmo sem cargo oficial, são elas ou eles quem estão permanentemente ao lado das pessoas mais importantes da República.

Fabíola Cidral
Esse foi Janja, um podcast original UOL Prime.

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Adriana Negreiros
O prazer foi todo meu, Fabíola. Obrigada a você que ouviu a gente até o final. Até o nosso próximo encontro!

Créditos:

Apresentação: Fabíola Cidral e Adriana Negreiros
Reportagem: Adriana Negreiros, Lucas Borges Teixeira e Carla Araújo
Roteiro: Clara Rellstab e Helena Dias
Pesquisa: Adriana Negreiros, Clara Rellstab, Helena Dias, Bárbara Falcão e Lucas Borges Teixeira
Coordenação: Ligia Carriel, Bárbara Falcão e Carla Araújo
Montagem: Danilo Corrêa
Desenho de som e finalização: João Pedro Pinheiro
Trilha sonora original: João Pedro Pinheiro
Trilhas adicionais: Epidemic Sound
Direção de voz: João Pedro Pinheiro
Design: Kiki Thomé
Motion design: Santhiago Lopes
Direção de arte: Gisele Pungan e René Cardilho
Redes sociais: Arthur Belotto, Luca Machado e Laís Montagnana
Gerente geral de reportagens especiais: Diego Assis
Gerente geral de UOL Notícias: Alexandre Gimenez
Supervisão: Murilo Garavello, diretor de conteúdo do UOL

Podcast Janja

Você pode ouvir os cinco episódios do podcast sobre Janja nos links abaixo.

Janja está disponível no YouTube de UOL Prime, no Spotify e em todas as plataformas de podcast.

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