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Tecnologia usa som da chuva na Amazônia para prever desastres

O meteorologista e pesquisador Rodrigo Xavier - Divulgação/Instituto Mamirauá
O meteorologista e pesquisador Rodrigo Xavier Imagem: Divulgação/Instituto Mamirauá
do UOL

Colaboração para Ecoa

20/12/2024 13h35

O som da chuva na floresta amazônica pode ajudar a prever desastres no bioma. É o que mostrou um estudo do Instituto Mamirauá ao monitorar o barulho das gotas atingindo a superfície da floresta, em Tefé, a 550 km de Manaus. A organização criou uma técnica com gravadores de som, na qual a acústica pode ser uma aliada na geração de dados sobre chuvas intensas em regiões sem infraestrutura de monitoramento climático.

O meteorologista Rodrigo Xavier, pesquisador que executou a primeira fase do estudo, explica que a proposta de investigar o som da chuva partiu do próprio instituto, que já fazia um trabalho de monitoramento bioacústico. Até então, o som da floresta era utilizado para identificar a fauna da região.

Com a nova iniciativa, o apelo está na necessidade de ampliar as informações sobre as chuvas, que ainda são um evento de difícil medição na Amazônia. "Os pluviômetros para monitorar a chuva na região ficam posicionados ao longo de rios e existe uma diferença entre o quanto chove no rio e o quanto chove na floresta", frisa o pesquisador. Hoje, a única forma de fazer essas medições em áreas onde não é possível instalar pluviômetros é por meio de satélite.

Treino com milhares de áudios

Em parceria com o Instituto Francês de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD), a investigação fez uso de um modelo de aprendizagem computacional que estabeleceu uma relação entre gravações do som da chuva e a intensidade delas.
Xavier observa que nessa tecnologia, que representa um passo antes da Inteligência Artificial, os modelos costumam definir a relação entre diferentes fenômenos por meio de métodos estatísticos.

"Nós fazemos um processamento de áudio, mostramos que em determinado áudio choveu tanto, e passamos centenas de milhares de áudios para a máquina. O modelo aprende essa relação e passamos um novo dado, sem falar o quanto choveu. O modelo dá a resposta de acordo com o que aprendeu", detalha o pesquisador. O treinamento desse modelo de aprendizagem contou com áudios sem chuva e com chuva leve, moderada, pesada e violenta.

Todos os dados gerados pelo novo método foram validados com dados gerados por satélites, revelando um potencial que surpreendeu a equipe envolvida no projeto. Isso porque, ao contrário da maioria das pesquisas na área, o estudo coletou áudios em ambientes com diferentes tipos de vegetação, a 30 quilômetros de distância um do outro.

O primeiro foi uma floresta tropical secundária no campus do Instituto Mamirauá, caracterizada por ser uma área desmatada e que foi regenerada, e o segundo, uma floresta virgem, que alaga, dentro da reserva de desenvolvimento sustentável do instituto. O método desenvolvido foi capaz de prever com sucesso a intensidade das chuvas nas duas áreas. "O modelo previu melhor do que a estimativa de satélite para a chuva no acumulado em hora, o que prova que existe um potencial grande para explorarmos", salienta Xavier.

Ainda são necessários ajustes

O novo modelo de previsão meteorológica tem como vantagens não só a possibilidade de uso em áreas sem grande infraestrutura de monitoramento, aumentando, assim, a cobertura espacial dessas medições, mas também o baixo custo.

Enquanto um pluviômetro digital com datalogger e painel solar para alimentar a bateria custa em torno de R$ 30 mil, cada gravador usado na pesquisa saiu por cerca de R$ 3 mil. Na época, foram usados no estudo apenas três gravadores alocados nas árvores e um computador de baixo desempenho. Ao todo, foram nove meses de coleta de dados e mais quatro meses de análises, entre 2023 e 2024. Os resultados foram publicados em outubro, na revista científica Geophysical Research Letters.

De acordo com Xavier, novos testes devem ser feitos antes de aplicar o modelo em uma escala maior. Agora, os pesquisadores do Instituto Mamirauá querem comparar a relação entre o som da chuva e a intensidade das precipitações em áreas onde não há floresta tropical, como no estado do Ceará, e fora do Brasil - na França e na Costa do Marfim. O objetivo é compreender se, de fato, a densidade da floresta ajudaria na amplificação do som das chuvas.

Monitoramento mais frequente

Os pesquisadores também buscam desenvolver uma forma de filtrar sons de animais das gravações e estimar a intensidade das chuvas na Amazônia a cada 5 minutos - e não no intervalo de uma hora, como vem ocorrendo no modelo.

Essa última medida é importante quando se considera o volume de chuvas, especialmente na Amazônia. "Geralmente, em 10 minutos cai um balde d'água nessa região", comenta Xavier. Com esse ajuste na pesquisa, o meteorologista acredita ser possível desenvolver uma rede de monitoramento em tempo real de chuva na Amazônia a cada 5 minutos. Isso poderia auxiliar, por exemplo, no gerenciamento de casos de chuvas extremas em encostas e outras áreas mais vulneráveis no bioma.

Xavier assinala que, mesmo com a onda de secas extremas que o bioma vem enfrentando, essas chuvas intensas ainda devem voltar. "As últimas cheias também aconteceram na última década, eventos extremos têm acontecido. Então, quanto mais dados tivermos, mais isso poderá contribuir para previsões melhores", enfatiza.

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