Organizações vão à OEA contra Tarcísio e Derrite por violência policial
Entidades e movimentos negros foram à OEA (Organização dos Estados Americanos) contra o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e o secretário de segurança pública do estado, Guilherme Derrite. O documento foi protocolado nesta sexta-feira (20).
O que aconteceu
As entidades pediram à OEA a responsabilização do governador e do secretário. O documento foi entregue em audiência online com a presença de Ivan Marques, secretário de Segurança Multidimensional da OEA, e de Tânia Renaun, Secretária Executiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Segundo a acusação, houve agravamento da violência policial em São Paulo na gestão do governador e do secretário. As entidades argumentam que é necessário que a OEA acompanhe as denúncias e recomende ações do estado brasileiro para conter os casos.
São 70 entidades assinando o manifesto. Movimentos negros, como o MNU (Movimento Negro Unificado) e Uneafro, e organizações da sociedade civil como Grupo Tortura Nunca Mais e Sindicato das Advogadas e Advogados do Estado de São Paulo - SASP listam entre os grupos envolvidos na denúncia.
As entidades argumentam que houve um aumento significativo no número de casos de letalidade policial no estado de São Paulo nos últimos dois anos. Em 2023, 460 pessoas foram mortas pela Polícia Militar de São Paulo.
Até novembro deste ano, foram 676 mortes decorrentes de letalidade policial em São Paulo. De acordo com a acusação, a atuação do governo paulista, "à margem dos princípios constitucionais democráticos", estimulam a violência .
O documento diz, ainda, que as ações policiais são violentas e racistas. De acordo com as entidades, a maioria das mortes provocadas pela polícia são de negros.
Há uma nítida percepção de que não é uma atuação isolada de um grupamento policial e sim a atuação violenta da estrutura policial sob o comando de Guilherme Derrite. Transformar esse cenário exige ruptura com esse modelo violento. É urgente implementar políticas públicas que estejam alinhadas com os valores democráticos e constitucionais para garantir políticas que valorizem a proteção à vida, combate ao racismo e garanta a transparência e o controle social sobre as instituições de segurança pública.
Ofício enviado à OEA
"A obrigatoriedade do uso de câmeras corporais com gravação em tempo real têm sido ignoradas pelo governo estadual, demonstrando o desinteresse em fortalecer a política já instaurada". De acordo com a denuncia, posicionamentos de Tarcísio de de Derrite acabam por influenciar na atuação da Polícia Militar — incentivando ações violentas em operações como a Escudo e Verão.
Números mostram PM mais violenta
A SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública) divulgou dados sobre a redução no número de homicídios dolosos em comparação ao aumento significativo da letalidade policial no estado e especialistas alertam para uma falsa correlação entre os números. Procurada, a SSP disse não compactuar com o que chamou de 'desvios de conduta' de policiais.
Apesar da diminuição no número de homicídios e roubos, os crimes de latrocínio e estupro tiveram um aumento. Os números foram levantados pelo UOL com informações da transparência da SSP-SP.
O número de homicídios registrados em 2024, até então, reduziu de 2.127 em 2023 para 2.065 em 2024. Em contrapartida, aumentou o número de latrocínios, com 133 registrados no ano passado e 144 neste ano.
Os registros de estupro também aumentaram, segundo a SSP. Foram 12.319, frente aos 12.079 registrados no ano passado, representando um aumento pelo terceiro ano seguido, levando em consideração que no ano de 2022 foram registrados 11.140 estupros.
Casos de lesão corporal seguida de morte também aumentaram, passando de 84 ocorrências em 2022 para 103 em 2024. Tentativas de homicídio passaram de 2.873 casos em 2022, 2.952 em 2023 e 2.897 em 2024.
O governador Tarcísio de Freitas e o secretário Guilherme Derrite têm defendido ações da pasta, argumentando uma forte queda nos indicadores de mortes, por exemplo. Contudo, o clima de instabilidade e insegurança na Polícia Militar já afeta a gestão.
Entre os anos de 2022 e 2024, a letalidade policial em São Paulo registrou um salto. De acordo com os dados da SSP, as mortes em ações policiais aumentaram de 331 em 2022 para 676 em 2024, o que representa um crescimento de mais de 100%.
Em um período de um mês, pelo menos quatro episódios envolvendo violência policial ganharam o noticiário nacional, ilustrando os dados apresentados pelo levantamento.
- 3 de novembro: Gabriel Renan da Silva Soares, um homem negro de 26 anos, foi alvejado com 12 tiros após furtar sabão em um mercado.
- 5 de novembro: o pequeno Ryan da Silva Andrade, de 4 anos, foi morto com um tiro durante um confronto policial em uma comunidade de Santos.
- 20 de novembro: o estudante de medicina Marco Aurélio Cardenas, 22, foi morto com um tiro de um policial em um hotel na zona sul de São Paulo.
- 1º de dezembro: um policial foi flagrado jogando um homem de cima de uma ponte na periferia de São Paulo.
Associar a queda de homicídios ao aumento da letalidade policial seria uma falsa premissa, de acordo com especialistas. Para Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, advogado criminalista e ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, a polícia tem matado mais, mas sido menos eficiente. Mariz narra que a segurança pública tem sido baseada muito mais na repressão a partir da violência, do que por meio de inteligência e atividades de estratégia. De acordo com o Instituto Sou da Paz, houve queda no número de homicídios solucionados, por exemplo, demonstrando a tendência os homicídios resolvidos representavam 47% em 2023, indo para 40% em 2024.
A PM está matando, está agredindo de forma injustificada, atirando a esmo, matando via bala perdida gente alheia ao crime. Eu entendo que a PM está vivendo um momento difícil de desvio de rota e missão para proteger. O que a gente tem de concreto é que a PMs, em seu grande contingente, estão agindo em absoluto desvio de suas funções, violenta e agressiva. Basta que um PM se sinta ameaçado para que agrida.
Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, criminalista e membro da Comissão Arns e ex-secretário de Segurança Pública
Outro lado
A SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) informou, em nota, que "não compactua com excessos ou desvios de conduta". A pasta argumentou, ainda, que nos dois primeiros anos da gestão Tarcísio houve redução de 32,2% em mortes por intervenção policial se comparado aos dois primeiros anos da gestão anterior. (Veja nota completa abaixo)
"A SSP se mantém atenta à variação dos indicadores criminais e tem concentrado esforços para combater todas as modalidades criminosas no estado, incluindo os casos de estupro, que muitas vezes ocorrem em uma dinâmica familiar que dificulta não só a prevenção por parte da polícia, mas a denúncia por parte da vítima.
Deste modo, a pasta tem desenvolvido campanhas para as vítimas denunciarem os agressores e ampliando os canais para comunicação deste tipo de crime, que funcionam 24h por dia. A atual gestão ampliou em mais de 80% as salas de Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) para atendimento por videoconferência em plantões policiais, contanto hoje com 143 unidades, além de outras 141 DDMs territoriais e a DDM Online para o registro de ocorrências e solicitação de medidas protetivas que pode ocorrer a partir de qualquer dispositivo conectado à internet. Há, ainda, o aplicativo SP Mulher Segura, que reúne as principais funcionalidades para facilitar o registro de ocorrências e o acionamento da Polícia Militar em um único lugar.
Quanto aos latrocínios, a pasta tem monitorado o indicador por meio do SP Vida para desenvolver políticas de enfrentamento, e também atuado em outra frente, que é o combate aos roubos - crime que dá início ao latrocínio. Neste caso, os assaltos tiveram redução de 14,9% em todo o estado, nos dez primeiros meses do ano. O número é o menor em 24 anos. Esse resultado foi obtido por meio do reforço no efetivo e investimentos para melhor equipar as polícias, aliando também tecnologia e inteligência às atividades policiais, o que permitiu, em igual período, aumentar em 26,7% a quantidade de armas ilegais retiradas das mãos de criminosos e prender/apreender cerca de 168 mil infratores".
Secretaria de Segurança Pública, em nota