Putin evita chamar queda de Assad de 'derrota' para Rússia e fala em 'relações futuras' com a Síria
Pela primeira vez, nesta quinta-feira (19), o presidente russo Vladimir Putin, comentou sobre a queda de Bashar al-Assad, aliado próximo de Moscou, e não quis usar a palavra "derrota" nesse contexto. O líder russo disse que precisa decidir "como serão as relações com as forças políticas que controlam a situação na Síria atualmente e que o farão no futuro".
Com informações de Anissa El Jabri, correspondente da RFI em Moscou e AFP
As declarações foram feitas durante a tradicional sessão anual de perguntas e respostas na televisão russa. Vladimir Putin disse que "os russos foram para a Síria há dez anos para evitar que um enclave terrorista fosse criado, como no Afeganistão, por exemplo". No geral, o chefe de Kremlin acredita que a Rússia "alcançou seu objetivo", mas foi cauteloso sobre as futuras relações com as novas lideranças na Síria.
Vladimir Putin garantiu que a queda de Bashar al-Assad na Síria, um aliado próximo de Moscou, não foi uma "derrota" para Moscou. No entanto, o futuro das duas bases militares russas na Síria, que são cruciais para as operações do país no Mediterrâneo, ainda está no ar. O presidente afirmou que ainda não havia se encontrado com Bashar al-Assad, que se refugiou na Rússia com sua família, mas que "pretende" conversar com ele.
"Temos que decidir por nós mesmos como serão nossas relações com as forças políticas que controlam a situação na Síria atualmente e que o farão no futuro. Nossos interesses devem coincidir. Se ficarmos lá, também devemos agir de acordo com os interesses do país onde estamos. Quais serão esses interesses e o que podemos fazer por eles é uma questão que exige uma pesquisa cuidadosa de ambos os lados", disse Putin. "Mas já podemos fazer algo no futuro imediato, usando essas bases. Já propusemos aos nossos parceiros, principalmente aos que estão em território sírio, e aos países vizinhos, que utilizem, por exemplo, a base aérea de Khmeimim para levar ajuda humanitária à Síria. O mesmo se aplica à base naval de Tartus", disse Putin se referindo às duas bases militares russas em território sírio.
Ele também pediu a Israel que retirasse suas tropas do "território sírio", já que elas estavam posicionadas em uma zona tampão controlada pela ONU que separa os dois países nas Colinas de Golã.
Na frente doméstica
No âmbito doméstico, o líder russo criticou seus serviços especiais por não terem evitado o assassinato, na terça-feira (17), do general russo Igor Kirillov, morto em uma explosão em Moscou, reivindicada por Kiev. "Não devemos permitir tais falhas", insistiu ele.
Na aparição anual, Vladimir Putin falou ainda que estava pronto para se encontrar com o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, "a qualquer momento". Trump recentemente pediu um cessar-fogo e negociações entre a Ucrânia e a Rússia.
"Estou pronto para fazer isso, é claro. A qualquer momento", acrescentando que não conversava com Donald Trump "há mais de quatro anos".
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A longa conferência ao vivo, embora cuidadosamente encenada, foi uma das raras oportunidades para jornalistas e cidadãos do país fazerem perguntas delicadas ao presidente russo. A transmissão, que este ano durou quase 4 horas e meia, ocorreu um mês antes da posse de Donald Trump retornar à Casa Branca, em 20 de janeiro.
O republicano, que já foi presidente de 2017 a 2021, prometeu repetidamente levar a paz à Ucrânia "em 24 horas" e pediu um "cessar-fogo imediato". "Se algum dia nos encontrarmos com o presidente eleito Trump, tenho certeza de que teremos muito o que conversar", confirmou o líder do Kremlin.
Progresso na Ucrânia
Vladimir Putin garantiu que a Rússia estava pronta para um "diálogo" com a Ucrânia, mas somente com base nas "realidades locais", uma forma de dizer que seu país não devolveria os territórios conquistados. Ele rejeitou qualquer trégua que permitisse que o exército ucraniano "fizesse uma pausa" e se rearmasse.
O chefe do Kremlin também demonstrou confiança ao dizer que a situação estava "mudando radicalmente" na frente de batalha na Ucrânia, onde suas tropas estavam progredindo em um ritmo nunca visto desde os primeiros meses de 2022. No entanto, Putin admitiu que não sabia quando seu exército conseguiria expulsar as forças ucranianas da região russa de Kursk, onde elas ainda ocupam várias centenas de quilômetros quadrados, apesar das tentativas das tropas russas de desalojá-las.