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Organização tem 40 fundadores e uma meta: Brasil sem fome até 2030

Juliana Plaster, diretora de Parcerias e Relações Institucionais do Pacto Contra a Fome - Divulgação
Juliana Plaster, diretora de Parcerias e Relações Institucionais do Pacto Contra a Fome Imagem: Divulgação
do UOL

Marina Filippe

Colaboração para Ecoa, em São Paulo

13/12/2024 05h30

A fome é um paradoxo no Brasil. Ao mesmo tempo em que cerca de 9 milhões de brasileiros passam fome e 64 milhões estão em algum grau de insegurança alimentar, 55 milhões de toneladas de alimentos são desperdiçadas por ano, desde a colheita até o consumo final. Os dados, organizados pelo Pacto contra a Fome, mostram que há um árduo caminho para ser percorrido de modo que o problema seja solucionado. Ainda assim, a organização fundada em 2023 com quarenta participantes - então liderados pela economista e empresária Geyze Diniz - espera erradicar a fome em 2030 e ter todas as pessoas bem alimentadas, do ponto de vista nutricional, até 2040.

Para isso, a organização trabalha com a influência em políticas públicas, atuações de engajamento nas empresas, divulgação de conteúdos de conscientização da sociedade civil, entre outras práticas, detalhadas por Juliana Plaster, diretora de Parcerias e Relações Institucionais do Pacto Contra a Fome, em entrevista ao UOL Ecoa.

"Trabalhamos em quatro pilares: inclusão produtiva ou renda, de modo a formalizar e incluir em posições de trabalho pessoas que hoje passam fome, a transição dos sistemas alimentares, que é o entendimento de como os alimentos chegam nas casas das pessoas e como elas se alimentam, visto que é preciso garantir o recebimento de frutas e verduras, a inteligência de dados e as políticas públicas em si. Com a articulação dessas frentes e o engajamento de todos, podemos superar um problema basal no desenvolvimento socioeconômico", afirma.

O que motivou a criação do Pacto Contra a Fome?

O Pacto Contra a Fome foi pensado em 2021, quando o Brasil vivia a pandemia da Covid-19 e os brasileiros sentiam o agravamento da fome. Ali, Geyze Diniz - viúva de Abílio Diniz - percebeu o movimento de doações e mobilizou pessoas e empresas para a doação de cestas básicas. Naquele momento, duas coisas chamaram a atenção: o poder de articulação quando as pessoas se unem em um propósito e resultados absurdamente impactantes.

Foi então encomendado um estudo sobre a fome no Brasil e chegou-se ao dado de 33 milhões de pessoas em insegurança alimentar grave. Geyze e outros co-fundadores buscaram criar uma organização que fosse olhar a questão de maneira estrutural, apoiando quem está na ponta, atuando rápido e sem vinculação partidária.

O Pacto tem quarenta co-fundadores, que trabalham juntos oficialmente desde maio de 2023, sendo que boa parte deles faz parte do dia a dia da operação com o objetivo de acelerar as articulações. Sabemos que a fome não é uma causa prioritária quando se fala de investimento social, mas, ao mesmo tempo, é uma causa basal para o desenvolvimento socioeconômico do país, pois uma nação bem alimentada é bem desenvolvida, com melhores índices de saúde e educação.

Qual o cenário da fome no Brasil?

Em 2022, 33 milhões de brasileiros e brasileiras viviam em uma situação de insegurança alimentar grave. Ou seja, pessoas com fome, que não sabem se vão comer hoje ou amanhã. E mais da metade dos brasileiros vivia algum grau de insegurança alimentar. Isto é, quando é possível fazer no máximo duas refeições ao dia ou trocas alimentares por não conseguir arcar com todos os custos.

Agora, temos um cenário com cerca de 9 milhões de brasileiros vivendo uma situação de insegurança alimentar grave e 64 milhões de pessoas com algum grau de insegurança. De fato, temos uma melhora pela retomada de programas sociais e a diminuição do desemprego, mas são necessários outros esforços para termos um cenário realmente positivo.

Como o Pacto visa combater a fome?

Atuamos, por exemplo, junto aos governos ao propor e implementar políticas públicas que façam sentido no combate à fome. Temos um olhar sistêmico para a causa raiz, o desperdício, e outros fatores. Nossa meta é termos um Brasil no qual, em 2030, nenhuma pessoa passe fome e, em 2040, todas estejam bem alimentadas do ponto de vista nutricional.

É importante dizer que são dois trabalhos distintos quando falamos de fome e boa alimentação. Muitos dos brasileiros hoje não têm acesso aos alimentos. O papel dos governos, mas também da iniciativa privada, é olhar para todos os espectros da sociedade a fim de mitigar esses gargalos. Outra frente de trabalho é a produção de conteúdo e a formação de opinião a partir de dados e pesquisas que construam um lugar seguro em relação às necessidades e práticas do tema.

Quais os resultados do Pacto em pouco mais de um ano de atuação?

Consideramos resultados ações diversas. Em maio do ano passado, por exemplo, lançamos um prêmio que buscou incentivar as ações que estão ocorrendo na ponta do combate à fome e têm o potencial de crescimento e articulação. Foram premiadas seis causas com R$ 100 mil e o apoio para o desenvolvimento institucional. No apoio técnico, oferecemos um minidocumentário para que a organização utilize em outras campanhas e editais. Em novembro, acontece a segunda edição do prêmio e, desta vez, para além dos negócios sociais estamos buscando soluções de tecnologia para o combate à fome.

Outra entrega importante é o Hub do Pacto Contra a Fome, uma plataforma que mapeia e promove conexões entre iniciativas, pessoas e instituições do Brasil inteiro focadas em combater à fome e o desperdício de alimentos, com o objetivo de dar visibilidade aos projetos. Hoje há mais de mil organizações e negócios sociais conectados ao hub, que olham para onde ocorrem os desperdícios e quais as formas de evitá-lo.

Quando falamos do trabalho com governos, atuamos mais fortemente no Pará, Maranhão e Ceará assinando termos de cooperação técnica. A intenção é fortalecer a estruturação das políticas públicas para a superação da fome e a garantia da segurança alimentar.
Já no fim do ano passado, tivemos uma influência na reforma tributária da cesta básica ao montarmos um grupo para discutir um texto aparentemente superado, de 1938, e trazer questões como a saudabilidade e o preço dos alimentos. Ficamos felizes com o fato de que o texto do grupo foi implementado, e continuamos com o advocacy para pensar em quais são os elementos dessa cesta básica e como o preço dela é importante para o desenvolvimento do país, devendo conter alimentos saudáveis, regionais e que caibam no bolso do brasileiro.

Como as empresas e a sociedade civil podem apoiar o combate à fome?

O primeiro ponto é o apoio financeiro para que as organizações consigam operar, investir na produção de dados e em soluções. No caso do Pacto, temos, por exemplo, ações pro bono que vão de análise tecnológica para a redistribuição de alimentos ao apoio jurídico. O aporte tecnológico, por exemplo, é essencial para entender qual a maneira inteligente de fazer a distribuição sem que não haja sobreposição de doações.

As empresas também podem engajar a partir das políticas de responsabilidade social ao pensar na segurança alimentar dos funcionários e das comunidades onde atuam. Além de utilizar suas expertises de negócio, como logística, administração, etc, para a atuação no combate à fome.

Já a sociedade civil pode ter atitudes simples, como não estocar alimentos em casa, evitar o desperdício e doar. Outro ponto: escolher alimentos que estão próprios para o consumo, mas podem não estar com um formato ou cor entendido como adequado.

Como pretendem atingir a meta de erradicação da fome em 2030?

Para que isto seja possível, é preciso olhar três pilares: dificuldade do acesso aos alimentos, pobreza e desigualdade social. Pensando nisto, trabalhamos em quatro pilares: inclusão produtiva ou renda, de modo a formalizar e incluir em posições de trabalho pessoas que hoje passam fome; a transição dos sistemas alimentares, que é o entendimento de como os alimentos chegam nas casas das pessoas e como elas se alimentam, visto que é preciso garantir o recebimento de frutas e verduras; a inteligência de dados; e as políticas públicas em si.

Temos trabalho em múltiplas ações, que vão desde o letramento e formação de pessoas para o entendimento da causa até o lançamento de documentos. Entre eles, está o Guia de Desperdício, que apresenta dados como o de que o Brasil produz 161,3 milhões de toneladas de alimentos por ano. Estima-se que, deste total, 55,4 milhões de toneladas sejam desperdiçadas anualmente, do campo até casa do consumidor.

Estamos também começando agora um projeto com os Ceasas para melhorar o aproveitamento ao encaminhar as sobras para bancos de alimentos. Temos, no país, alguns exemplos de Ceasas com boas práticas, mas não é a regra.

De modo geral, para chegarmos em 2030 sem brasileiros passando fome precisamos articular as frentes de trabalho, com engajamento de governos, setor privado e sociedade civil.

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