Negociadores da América do Sul e UE se apressam para fechar acordo comercial
Por Lucinda Elliott, Lisandra Paraguassu e Anthony Boadle
MONTEVIDÉU/BRASÍLIA, 4 Dez (Reuters) - O bloco comercial Mercosul se reunirá no Uruguai na quinta-feira, com a possibilidade de o grupo usar o evento para anunciar um acordo comercial com a União Europeia, há muito adiado, após negociações de última hora para que o acordo seja concluído.
O acordo comercial, apoiado pela maioria dos países sul-americanos e defendido por Alemanha e Espanha, tem enfrentado forte oposição da França devido ao temor de que as importações agrícolas para a Europa afetem o poderoso setor agrícola do país.
Negociadores de todos os lados se reuniram no Brasil na semana passada, disseram à Reuters fontes diplomáticas e governamentais de alto escalão, com planos de que as delegações possam viajar para Montevidéu se um acordo for fechado durante as conversas virtuais que continuam nesta semana.
Isso poderia até mesmo fazer com que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, viaje para a cúpula de 5 e 6 de dezembro na capital uruguaia, disseram duas fontes europeias, embora muitos tenham advertido que provavelmente nada será assinado. Uma fonte afirmou que a chefe da UE havia reservado uma passagem de avião por precaução.
A última rodada de negociações trouxe "avanços importantes", disse o secretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty, Maurício Lyrio, na segunda-feira.
Lyrio afirmou ainda que está vendo de "maneira muito positiva" o desenrolar das negociações e que as questões pendentes sobre o acordo serão submetidas aos líderes para finalização.
Bernd Lange, um social-democrata alemão que preside o comitê de comércio do Parlamento Europeu, disse na terça-feira que a situação interna na UE é o principal obstáculo para um acordo e que a decisão de viajar ou não esta semana permanecia incerta.
"Eles estão discutindo no 13º andar (gabinete da presidência da Comissão) sobre pegar a bagagem e ir para o aeroporto ou não. É um pouco complicado", declarou Lange durante um briefing.
Em andamento há mais de duas décadas, o acordo comercial tem sido adiado devido a preocupações europeias com a concorrência agrícola, enquanto Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, todos grandes produtores de soja, milho e carne bovina, criticam o protecionismo europeu.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na semana passada, no entanto, que o acordo estava sendo negociado diretamente com Von der Leyen, enquanto uma nova rodada de conversas presenciais acontecia no Brasil. Ele está confiante de que um acordo será finalizado este ano.
Outros, porém, expressaram ceticismo. "Se Ursula for a Montevidéu, será para mostrar o compromisso da UE com a conclusão do acordo, mas ele não será assinado", declarou um diplomata europeu em Brasília.
Outro diplomata no Uruguai disse: "Ainda tenho uma probabilidade de 60-40 de que o acordo não chegue a lugar algum."
ACORDO OU NÃO ACORDO?
Paris tentou convencer outros membros da UE a formar uma minoria de bloqueio. A Polônia recentemente se uniu à oposição. No entanto, a França precisa de, no mínimo, três países que representem mais de 35% da população da UE para bloquear o acordo.
Outros países da UE, como Alemanha e Espanha, estão liderando uma coalizão de 11 Estados a favor. Eles querem novas rotas comerciais que reduzam a dependência da China e protejam os membros das tarifas comerciais planejadas pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.
Um acordo entre a UE e o Mercosul foi inicialmente firmado em 2019, mas nunca ratificado por conta de exigências da UE de compromissos sobre desmatamento e mudanças climáticas. Algumas autoridades temem que o mesmo possa acontecer novamente agora, mesmo que um texto final seja acordado.
"Apesar de aplaudirmos se algo for assinado em Montevidéu nesta semana, vamos ver quando isso realmente entrará em vigor", disse Ignacio Bartesaghi, da Universidade Católica do Uruguai.
Uma versão final e juridicamente vinculante do acordo também precisaria ser cuidadosamente revisada e traduzida para cerca de duas dezenas de idiomas antes de ser formalmente assinada, disse o negociador brasileiro Lyrio. Isso ainda pode levar meses.
MILEI PODE FAZER SUA ESTREIA
A cúpula de Montevidéu também deve ter o presidente libertário da Argentina, Javier Milei, estreando em um evento do Mercosul, após ameaças veladas de sair do bloco, a menos que tenha permissão para buscar acordos comerciais bilaterais fora dele, inclusive com os Estados Unidos.
Assim como o presidente uruguaio que está deixando o cargo, Luis Lacalle Pou, Milei quer que o grupo seja mais flexível. Sob o comando de Lacalle Pou, o Uruguai entrou em negociações formais para um acordo de livre comércio com a China, uma decisão que seu sucessor provavelmente não tomará.
Alguns diplomatas disseram que as negociações entre a UE e o Mercosul terão impacto sobre a provável abordagem de Milei em relação ao grupo.
Se o acordo UE-Mercosul for adiante, disse Bartesaghi, isso "jogaria água fria" em qualquer plano de Milei de romper os laços com o bloco, porque provaria que ele pode conseguir algo.
Um acordo fortalece o "argumento para manter o grupo unido, ganha tempo e acalma Milei", afirmou ele, acrescentando que, se o acordo fracassar, poderá, no entanto, aumentar o argumento de Milei.
(Reportagem de Lucinda Elliott em Montevidéu, Lisandra Paraguassu e Anthony Boadle em Brasília. Reportagem adicional de Philip Blenkinsop em Bruxelas)