O que representa a ofensiva de jihadistas a Aleppo, após quatro anos de calma relativa na Síria
Jihadistas e seus aliados lançaram uma ofensiva fulminante contra o regime de Bashar al-Assad no noroeste da Síria, que deixou até agora ao menos 255 mortos. Os extremistas entraram em Aleppo, segunda maior cidade do país nesta sexta-feira (29), segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), organização que mantém uma rede de informantes no país.
"Eles entraram nos bairros oeste e sudoeste", disse Rami Abdel Rahman, diretor do OSDH. Duas testemunhas confirmaram à AFP que viram homens armados e relataram pânico nesta grande cidade do norte da Síria. Os combatentes "assumiram o controle de cinco bairros" e as forças do regime "não ofereceram muita resistência", segundo o diretor da ONG.
Conforme a organização, sediada no Reino Unido e que conta com uma vasta rede de fontes na Síria, o grupo jihadista Hayat Tahrir al-Sham (HTS) e grupos aliados, alguns próximos da Turquia, chegaram na sexta-feira às portas de Aleppo "depois de realizar dois ataques suicidas com carros-bomba".
O exército sírio, que enviou reforços para a cidade, segundo uma autoridade de segurança, garantiu ter repelido "a grande ofensiva de grupos terroristas" e recuperado várias posições.
O OSDH tinha anunciado um pouco mais cedo nesta sexta-feira que cerca de 50 localidades foram conquistadas pelos jihadistas desde quarta-feira. Estes combates, que segundo a ONG causaram mais de 255 mortos, são os mais violentos desde 2020 no noroeste da Síria, onde a província de Aleppo, em grande parte nas mãos do regime de Bashar al-Assad, é vizinha de Idlib, o último grande reduto rebelde e jihadista.
Poder de fogo
Os combatentes bombardearam Aleppo pela primeira vez em quatro anos e visaram o campus universitário da cidade, onde quatro civis foram mortos, segundo a agência oficial Sana. "Obuses de artilharia atingiram uma residência universitária (...) causando pânico", indicou o OSDH.
"Pelo que podemos ver, a ofensiva em si não depende principalmente de armamento pesado. Temos a impressão de que se trata sobretudo de unidades muito móveis e bastante bem equipadas. Falo de equipamentos de combate individuais, que utilizam muitos veículos de grande porte. Há um pouco de artilharia, lançadores de foguetes e outros", disse à RFI Thomas Pierret, pesquisador especialista na Síria ligado ao Centro Nacional de Pesquisas Científicas da França (CNRS).
Esse poder de fogo, entretanto, está longe de ser comparável ao regime de Al-Assad, salienta. "Talvez tenha havido um progresso qualitativo e quantitativo significativo no uso de drones leves, com cargas explosivas bastante modestas. E também, tipos de drones pesados, mísseis de cruzeiro que não estão disponíveis em grande número, mas que parecem ter sido utilizados nas primeiras horas da ofensiva."
Regime sírio é aliado do Hezbollah, em guerra contra Israel
Rami Abdel Rahman, diretor do OSDH, considerou "estranho" ver as forças do regime sírio serem atacadas, apesar da cobertura aérea garantida pelos aliados russos. "As forças do regime dependiam do Hezbollah, que está atualmente ocupado no Líbano?", indagou, referindo-se à guerra entre Israel e o movimento libanês, aliado de Damasco, que entrou em uma trégua nesta semana.
Um general da Guarda Revolucionária, o exército ideológico do Irã, foi morto nos combates de quinta-feira, informou uma agência de notícias iraniana. Teerã, outro aliado fiel da Síria, reiterou o seu apoio a Damasco.
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O Irã envolveu-se militarmente na Síria enviando conselheiros, a pedido das autoridades locais, para apoiar o presidente Al-Assad durante a guerra civil. Graças ao conflito, o HTS, dominado pelo antigo braço sírio da rede Al-Qaeda, assumiu o controle de áreas inteiras da província de Idlib, mas também de territórios vizinhos nas regiões de Aleppo, Hama e Latakia.
Segundo o OSDH, os combates atingiram na sexta-feira a cidade estratégica de Saraqeb, controlada pelo regime e localizada ao sul de Aleppo, no cruzamento de duas rodovias. A força aérea russa intensificou os seus ataques, segundo esta fonte.
O Kremlin pediu para as autoridades sírias "trazerem a ordem o mais rapidamente possível" de volta a Aleppo. Numa coletiva de imprensa, o chefe do autoproclamado "governo" em Idlib, Mohammad al-Bashir, justificou a ofensiva de quinta-feira dizendo que o regime "começou a bombardear áreas civis, o que causou o êxodo de dezenas de milhares de civis".
Com AFP