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Prisão de peruano em golpe fracassado fez Bolsonaro recuar, disse militar

Do UOL, em São Paulo

27/11/2024 09h51Atualizada em 27/11/2024 13h29

Após ser abandonado por parte da cúpula militar, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) desistiu de publicar o decreto do golpe para não "embarcar sozinho" na insurreição e acabar preso como o ex-presidente do Peru Pedro Castillo, que em 2022 tentou dissolver o Congresso e terminou detido, diz relatório da Polícia Federal divulgado ontem.

Bolsonaro tem negado a participação em um plano de golpe de Estado.

O que aconteceu

Informação consta em diálogo entre militares, ao qual a PF teve acesso. A conversa foi por WhatsApp entre o tenente-coronel Sérgio Cavaliere, do "núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral", e o coronel Gustavo Gomes. No dia 20 de dezembro de 2022, Gomes pergunta a Cavaliere se havia "algo novo front", em referência à publicação do decreto golpista.

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Tenente-coronel cita diálogo com o então ajudante de ordens do ex-presidente, Mauro Cid, para dizer que "não vai rolar nada". Em áudio ele explica que Bolsonaro havia recuado porque o Exército e a Aeronáutica não aderiram ao golpe. "A Marinha aceitou, mas necessitaria da participação de outra Força (...) pois não guenta (sic) a porrada que vai tomar sozinha", afirmou Cavaliere.

O risco, diz o militar, era que Bolsonaro terminasse preso como Pedro Castillo no Peru. Em 7 de dezembro daquele ano —13 dias antes do diálogo— Castillo foi destituído e preso após dissolver o Congresso, em uma tentativa fracassada de golpe.

O presidente não vai embarcar sozinho porque pode acontecer o mesmo que no Peru. Ele está com decreto pronto, ele assina e aí ninguém vai [e] ele vai preso. Então não vai arriscar.
Sérgio Cavaliere, tenente-coronel

Pedro Castillo, ex-presidente do Peru, foi preso após uma tentativa fracassada de golpe Imagem: Reprodução

O relatório não fornece detalhes sobre Gomes, o interlocutor. Ele é citado nas fontes como um coronel do Exército que se comunicava com Cavaliere, um dos envolvidos na elaboração da "Carta ao Comandante do Exército". Gomes demonstrava conhecimento sobre os planos golpistas em andamento, mas sua relação com outros militares golpistas, além de Cavaliere, não foi revelada.

O decreto de golpe foi um documento elaborado pelo núcleo jurídico do governo Bolsonaro. O objetivo era instaurar um Estado de Defesa no Brasil, impedir a posse do presidente eleito Lula (PT) e manter Bolsonaro no poder, segundo a PF.

Veja a íntegra do relatório da PF que indiciou o ex-presidente Bolsonaro.

Outro lado

Jair Bolsonaro admitiu que estudou possibilidade de decretar estado de sítio, mas negou tentativa de golpe. "Golpe de Estado é uma coisa séria. (...) Tem que tá envolvido todas as Forças Armadas senão não existe golpe. Ninguém vai dar golpe com general da reserva e mais meia dúzia de oficiais. É um absurdo o que estão falando", rechaçou o ex-presidente, na última segunda (25), antes de o relatório da PF ter sido divulgado. Ele afirmou que analisou todas as possibilidades que existem na Constituição para "resolver o problema' e que as descartou quando "não teve como resolver".

Da minha parte, nunca houve discussão de golpe. Se alguém viesse pedir golpe para mim, ia falar: 'Tá, e o after day? E o dia seguinte, como é que fica? Como fica o mundo perante nós?' (...) A palavra golpe nunca esteve no meu dicionário.
Jair Bolsonaro, sobre investigação da PF

"Direita ainda não tem esse nível de organização sugerido pela PF. Nem para o bem e muito menos para o mal", escreveu Flávio Bolsonaro (PL). O senador criticou o relatório da PF no inquérito da tentativa de golpe de Estado.

Flávio afirmou "não haver nada" contra seu pai. "A cada pílula publicada da 'trans-investigação' da PF fico mais convicto de que não há absolutamente nada contra Bolsonaro", postou o senador.

Armas e helicóptero para fuga

O plano revelado no relatório envolvia tirar Bolsonaro do Brasil, usando armas, veículos oficiais e recursos militares. Segundo a PF, ele seria posto em prática tanto se o golpe não desse certo quanto se fosse necessário esperar seu desfecho.

Além de usar técnicas de forças especiais do Exército, a fuga contaria com a ajuda de militares. Nas tratativas do golpe, membros do Alto Comando do Exército articulavam o apoio de militares para o plano, tentando "garantir a lealdade de oficiais dispostos a desobedecer ordens do comando e protegê-lo em caso de necessidade", afirma o relatório. Esses homens organizariam a logística da fuga de Bolsonaro.

O plano de fuga envolveria a "construção de uma narrativa de perseguição" a Bolsonaro. Apoiadores usariam as redes sociais para disseminar mensagens para justificar sua fuga, descrevendo o ex-presidente como alguém perseguido e vulnerável e "criando um clima de instabilidade", segundo a PF. A narrativa já era desenvolvida por grupos nas redes que, posteriormente, seriam chamados de "milícias digitais".

Há indícios de que Bolsonaro e militares se reuniam para discutir a fuga. Os encontros no Palácio do Planalto e na Granja do Torto debateram os meios de transporte e as possíveis rotas que seriam usadas pelos militares, diz a PF.

A fuga seria bancada com recursos públicos. Para isso, os conspiradores contavam com o acesso e a proximidade de militares de confiança e o uso de aeronaves da FAB (Força Aérea do Brasil) e de outros veículos oficiais. Armas e munições guardadas em um cofre também seriam preparadas em caso de necessidade, segundo a a PF.

As informações sobre a suposto fuga foram recolhidas de um laptop de Mauro Cid. No aparelho, havia um slide que previa o uso de um dispositivo chamado "RAFE/LAFE. No jargão militar, significa Rede/Linha de Auxílio à Fuga e Evasão.

A investigação identificou um plano, adaptado da doutrina militar, para evasão e fuga do então presidente da República JAIR BOLSONARO do país, caso seu ataque ao poder Judiciário e ao regime democrático sofresse algum revés que colocasse sua liberdade em risco.
Relatório da PF

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