Relatório mostra como era o processo de fabricação de fake news sobre urnas
A organização criminosa responsável pelo plano golpista também criou um processo de fabricação e disseminação de fake news, de acordo com relatório da PF (Polícia Federal).
O que aconteceu
O grupo criava e disseminava fake news para desestabilizar o sistema eleitoral e tentar um golpe de estado. A máquina de propagação de informações falsas foi divulgada pelo relatório da PF que veio à tona nesta terça-feira (26).
A equipe responsável pelo golpe criou, desenvolveu e disseminou a falsa narrativa da existência de vulnerabilidade e fraude no sistema eletrônico de votação do país", diz o relatório. A principal narrativa propagada era a da vulnerabilidade das urnas eletrônicas para fraudes e manipulações.
O plano foi criado para provocar na população a desconfiança sobre o processo eleitoral. O objetivo era promover uma reação entre os apoiadores, para que acreditassem que Jair Bolsonaro foi prejudicado nos pleitos de 2018 e 2022.
Milícia digital
Uma "milícia digital" formada por apoiadores e influenciadores ligados ao então presidente visava promover uma ruptura institucional. A milícia, como é chamada a organização pelos investigadores, encabeçada pelo deputado e pelo ministro, foi essencial para "atuação com dolo, consciência e livre vontade, na produção e divulgação, por diversos meios, de narrativas sabidamente falsa".
Deputado Filipe Barros "teria conhecimento técnico" sobre a divulgação de informações falsas, de acordo com relatório. O deputado e o então ministro Anderson Torres definiram uma espécie de metodologia a ser seguida para a manipulação pública — envolvendo cooptação de influenciadores, criação e divulgação de falsas notícias e convocações para atos.
Posteriormente, a PF apontou que as informações falsas divulgadas influenciaram nos ataques de 8 de janeiro.
A "milícia digital" também foi responsável por mandar seguidores "resistirem" na frente de quartéis. Após o resultado do segundo turno eleitoral de 2022, com a derrota bolsonarista, o grupo reforçou a ideia de que as eleições haviam sido fraudadas — seguindo a metodologia pré-definida.
Militares foram responsáveis por disseminar estudos falsos de que urnas teriam registrado votos após o horário de votação. Além disso, foi apontado pelo grupo uma inconsistência no código-fonte das urnas.
Autoridades tentaram dar credibilidade às alegações. Além dos influenciadores, o chefe do GSI, Augusto Heleno, e o ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, também engajaram a trama.
Um influenciador argentino participou do esquema das fake news. Fernando Cerimedo, com ajuda do Major da Reserva Angelo Martins Denicoli e do Tenente-Coronel Marques de Almeida, abriu uma live no dia 4 de novembro para dizer que urnas fabricadas antes de 2020 tinham uma anomalia que favorecia o candidato de número 13, Lula. Esse material falso, que na sequência foi disponibilizado em um site, foi enviado para militares que reforçaram a informação falsa.
Foi estrategista do presidente argentino de extrema direita, Javier Milei. Cerimedo trabalhou como gerente tecnológico da estratégia digital da campanha presidencial Javier Milei.
O PL, inclusive, entrou com uma ação no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) baseada nas informações falsas. A ação foi liderada pelo próprio Bolsonaro e o presidente do partido, Valdemar da Costa Neto.
As informações falsas foram replicadas constantemente em diversos canais. Ministros do STF e do TSE, oponentes políticos e o próprio sistema eleitoral foi bombardeado nas redes sociais.
A PF chega a citar "técnicas de manipulação" por parte do esquadrão bolsonarista. O objetivo era divulgar sempre publicações para gerar raiva e medo nos brasileiros. Em uma troca de mensagens com Sérgio Cavaliere, Cid chega admite que não houve manipulação das urnas, e ainda assim segue com o plano das fake news (imagem acima).
"Esse contexto serviu para indicar os seguidores do então presidente da República, o esgotamento dos instrumentos legais para reversão do resultado, devendo-se adotar uma outra forma de ação mais contundente, diante das divulgadas 'arbitrariedades' do Poder judiciário".
Relatório da PF
"A análise também identificou manifestações nos meios militares, com vistas a demarcar posicionamento da necessidade de uma declaração das Forças Armadas, acerca dos acontecimentos à época, sob pena de perda de apoio popular. As mensagens relacionadas à incitação popular contra o resultado da eleição presidencial de 2022, foram disseminadas em grande escala pelo investigado, nos mais diversos contatos da agenda, inclusive em listas de transmissão".
Relatório da PF
O relatório explica que a estrutura brasileira também foi utilizada para a propagação de informações falsas. Lives foram realizadas pelo ex-presidente e reuniões ministeriais marcadas para discutir as narrativas falsas — inclusive com o Ministério da Defesa.
"Diante da repercussão de que a fiscalização não identificou qualquer indício de ilegalidade nas eleições de 2022, o então Ministro da Defesa, GENERAL PAULO SÉRGIO NOGUEIRA DE OLIVEIRA, no dia seguinte (10/11/2022), no sentido de manter a narrativa de possível fraude eleitoral, divulgou uma nota afirmando de forma contraditória que "embora não tenha apontado, também não excluiu a possibilidade da existência de fraude ou inconsistência nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral de 2022"
Relatório da PF