Quem são e o que aconteceu com os militares acusados de matar Rubens Paiva?
O filme "Ainda Estou Aqui" mostra como a família lidou com o desaparecimento do ex-deputado federal Rubens Paiva em 1971, durante a ditadura militar. Somente após 43 anos, em 2014, o MPF (Ministério Público Federal) denunciou cinco militares pelo assassinato do político, mas até o momento não houve julgamento e três deles já morreram.
Os acusados são José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos. Os oficiais foram denunciados por homicídio doloso qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e quadrilha armada, conforme documento de maio de 2014.
A Justiça Federal do Rio de Janeiro aceitou a denúncia na época e abriu processo contra eles. Foi a primeira vez que foi instaurada no Judiciário brasileiro uma ação penal contra militares por um homicídio ocorrido na ditadura militar.
O caso chegou a ser trancado e arquivado no STF (Supremo Tribunal Federal), depois encaminhado ao ministro Alexandre de Moraes, mas estava paralisado desde 2018. Em abril deste ano, a apuração sobre o caso foi reaberta pelo CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos), que fica responsável por ouvir testemunhas, pedir documentos, fazer audiências e produzir relatórios. No mês passado, Moraes pediu à PGR (Procuradoria-Geral da República) uma análise sobre o processo.
A maioria das informações sobre os militares denunciados vão até 2014, sem divulgação sobre as mortes de três deles: Sampaio, Campos e Jurandyr. A seguir, saiba mais sobre os envolvidos:
José Antônio Nogueira Belham
Ele foi comandante do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) do 1º Exército, no Rio de Janeiro, de novembro de 1970 a maio de 1971.
Rubens Paiva foi levado para o local em 20 de janeiro de 1971, após ser preso em casa por agentes do Cisa (Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica). Em depoimento à Comissão da Verdade, Belham disse que estava de férias na data e que não tinha conhecimento sobre o que ocorreu com Paiva nas dependências do departamento.
Documento apresentado para provar a informação mostra que o general reformado recebeu diária de viagem um dia antes para deslocamento sigiloso. Outro documento assinado por Belham indica que ele recebeu dois cadernos de anotações que eram de Paiva e foram apreendidos um dia antes da morte do político. Após a denúncia pelo MPF, ele se tornou réu no processo.
O ex-militar também foi chefe de outros oficiais responsáveis por crimes na ditadura, como o tenente-coronel Paulo Malhães. Em maio de 2014, Malhães admitiu, em entrevistas aos jornais O Dia e O Globo, ter recebido de Belham uma ordem para ocultar os restos mortais de Rubens Paiva em um ponto da praia do Recreio, na zona oeste do Rio, em 1973. Após a repercussão, ele voltou atrás nas declarações e morreu um mês depois.
Raymundo Ronaldo Campos
Era capitão na época do ocorrido e é um dos três militares que já morreram. Documento da Comissão Nacional da Verdade aponta que ele foi responsável pelo desaparecimento forçado de Paiva, ocultação de cadáver e homicídio doloso.
Em depoimento à Delegacia de Ordem Política e Social em 1986, ele disse que era encarregado de "operações de rua" do DOI-CODI. Contou que no final de janeiro de 1971, saiu com o político para reconhecer um local, mas como estava escuro, decidiram voltar no dia seguinte. Ao sair dali, o carro em que estavam, junto com os sargentos Jacy e Jurandyr Ochsendorf, teria sido atacado, e Paiva, fugido.
Em 2013, Campos confessou que a história era uma farsa, em declaração à Comissão da Verdade do Rio de Janeiro.
Jacy Ochsendorf e Souza
Era sargento em 1971 junto com o irmão Jurandyr. Em julho de 2014, ele foi depor na Comissão Nacional da Verdade e se negou a prestar esclarecimentos sobre sua atuação no DOI-CODI do Rio, na Casa da Morte de Petrópolis e na farsa relatada por Campos. Segundo a comissão, ele foi orientado por seus advogados a dizer "nada a declarar" a cada pergunta feita.
Em depoimento à Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal do Distrito Federal, em 1986, ele disse que no ano da morte de Paiva, atuava na brigada paraquedista e, "por determinação superior, prestava serviço no DOI-CODI em escala de 24 horas consecutivas", além de fazer serviços externos.
Jacy relatou um episódio de ataque parecido com o de Campos, mas afirma que só soube que a pessoa dentro do carro era Rubens Paiva após o caso ser noticiado na imprensa. Ainda assim, disse que não podia confirmar se era ele mesmo. Sobre torturas dentro do DOI-CODI, disse que "somente ouviu falar através da imprensa".
Jurandyr Ochsendorf e Souza
A reportagem também não encontrou informações sobre a morte do então sargento, que depôs no mesmo dia e local do irmão, em 1986. Na declaração, ele repete a história de Jacy sobre o ataque ao carro e diz não saber o nome do prisioneiro que os acompanhava.
Jurandyr afirmou que "não viu qualquer pessoa ser torturada naquelas dependências [DOI-CODI], muito embora a imprensa noticiasse contrariamente". Ele também é acusado pela Comissão Nacional da Verdade de desaparecimento forçado, ocultação de cadáver e homicídio doloso no caso da morte de Rubens Paiva.
Rubens Paim Sampaio
É um dos três militares reformados que já morreram. Em 2012, vivia num bairro de classe média alta em Resende, interior do Rio de Janeiro, conforme noticiado pelo jornal O Globo. Na ocasião, a mulher dele, Jeane Sampaio, disse que o marido "fez o trabalho que tinha que fazer naquela época. É passado e ficou no passado. Ele não tem nada a declarar".
Dois anos depois, em depoimento na Procuradoria da República em Resende, ele disse que havia sofrido um AVC em 1999 e, por isso, tinha "vários lapsos de memória".
Sobre o caso Rubens Paiva, disse que "recebeu um telefonema de uma pessoa do DOI-CODI cujo nome não se recorda informando que Paiva havia falecido de infarto". O corpo deveria ser levado ao IML, mas, ao retornar a ligação ao DOI-CODI, "a pessoa do outro lado da linha lhe disse que haviam feito um teatrinho para ocultar o corpo". Ele afirmou que não conhecia Paiva, nunca o tinha visto nem estava no DOI-CODI quando o deputado foi preso.
Na época, era major e trabalhava no CIE (Centro de Informações do Exército), onde ficou até 1976. O órgão usava uma casa em Petrópolis, chamada Casa da Morte, como local de prisão ilegal, tortura, morte e ocultações de cadáveres de opositores da ditadura. Sampaio era um dos militares que atuava ali e foi reconhecido por uma sobrevivente da casa.
*Com informações de reportagens publicadas em 26/05/2014 e 11/02/2021, da Agência Câmara de Notícias, da Agência Brasil e Estadão Conteúdo