Curso contra demônio e 'calmante por supositório': quem é o padre indiciado
Indiciado pela Polícia Federal como suspeito de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa, o padre José Eduardo de Oliveira e Silva é um crítico do movimento progressista e vende cursos na internet, alguns contra "demônios".
Quem é o padre
Oliveira e Silva tem 43 anos, nasceu em Piracicaba (SP), mas mudou-se para Carapicuíba na infância, onde descobriu sua vocação sacerdotal. Ele foi ordenado sacerdote da diocese de Osasco em 2006, segundo o site Ecclesiae. Ele é doutor em Teologia Moral pela Universidade da Santa Cruz, em Roma. A partir de 2013, tornou-se conferencista em temas como gênero, aborto, defesa da família e educação. Atualmente é pároco da Paróquia São Domingos, em Osasco.
O padre possui uma vida ativa nas redes sociais, onde posta textos e vídeos chamando a atenção para uma possível "guerra espiritual" que estaria sendo travada no Brasil. Em alguns, ele aponta características que conectam a teologia da libertação ao marxismo. Ele tem 427 mil seguidores no Instagram e é acompanhado por 137 mil pessoas no Youtube.
Oliveira e Silva ganhou notoriedade em 2017 ao postar comentários polêmicos sobre ideologia de gênero nas redes. Entre as declarações, chegou a sugerir a criação de um "calmante em forma de supositório". Também escreveu que tinha saudades "dos tempos em que o banheiro servia só para necessidades fisiológicas e não para exibicionismos de autoafirmação sexual".
Em 2023, o padre voltou a ser notícia após criticar a decisão do Vaticano que permitia a bênção de casais do mesmo sexo. Em entrevista ao portal Aleteia, ele argumentou que a Igreja poderia conceder bênçãos como estímulo à conversão, mas reiterou que casais em pecado mortal não estariam em estado de graça habitual.
Em março do mesmo ano, Oliveira e Silva foi entrevistado por Rodrigo Constantino, em seu canal no YouTube. No vídeo, ele faz críticas à esquerda, ao discutir a influência de ideologias progressistas na sociedade brasileira. Ele menciona que essas ideologias buscam desconstruir valores tradicionais, como a família e a religião, promovendo uma agenda que, segundo ele, "enfraquece os fundamentos morais da sociedade".
Cursos online
Além da presença forte nas redes, o sacerdote também vende cursos online. Um deles, "Batalha Espiritual — Aprenda a combater o mal" custa R$ 397 à vista ou pode ser parcelado em 12 vezes de R$ 39,70. Ele justifica o curso afirmando que São Paulo (o apóstolo) "nos diz que não há comunhão entre a luz e as trevas e enquanto não chegarmos no final dos tempos nós viveremos dia após dia o agravamento desse combate espiritual, quer aceitemos ou não".
Ele afirma ter condições de ensinar às pessoas técnicas de se tornar um "soldado" para melhor enfrentar essa "guerra" no plano espiritual, que tem vertentes no mundo físico através das "ideologias". Entre as aulas há "Quem é Lúcifer" e "Como Agem os Demônios".
O padre oferece uma comunidade com acesso integral aos seus cursos. Interessados podem aderir por R$ 897 à vista ou em 12 parcelas de R$ 74,75. A adesão garante acesso a uma plataforma exclusiva e a todos os cursos disponíveis.
As investigações
Em fevereiro, Oliveira e Silva foi alvo de uma operação de busca e apreensão realizada pela PF (Polícia Federal). Ele é suspeito de integrar um núcleo jurídico que teria atuado na elaboração de decretos e documentos para viabilizar um golpe de Estado no Brasil após as eleições de 2022. Documentos indicam que ele participou de uma reunião para discussão do golpe. Segundo a Agência Brasil, o padre foi submetido a medidas cautelares, incluindo a proibição de manter contato com outros investigados, a entrega de seus passaportes até o dia seguinte e a proibição de deixar o país.
O grupo jurídico investigado pelo STF inclui outras figuras de destaque. Além do padre José Eduardo, estão na lista o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o coronel Mauro César Cid, o ex-assessor presidencial Filipe Martins e o advogado Amauri Feres Saad. Todos são apontados como participantes de atividades ligadas ao planejamento de um golpe.
O padre esteve em uma reunião com Martins e Saad em novembro de 2022. O encontro ocorreu em Brasília, no Palácio do Planalto, segundo documentos investigados. Registros confirmam sua entrada e saída do local nessa data.
A investigação também aponta que o padre mantém vínculos com pessoas e empresas já investigadas em inquéritos relacionados à produção e divulgação de notícias falsas. Segundo a Agência Brasil, ele é citado em relatórios que destacam o uso de sua página pessoal para interagir com figuras envolvidas nesses esquemas.
Além do padre Oliveira e Silva, a PF indiciou nesta quinta-feira (21) Jair Bolsonaro, Braga Netto e mais 34 por tentativa de golpe. A lista tem 24 militares — 3 dos quais foram ministros, 2 policiais federais e um marqueteiro argentino.