Preso político mais antigo da Europa, ex-ativista pró-palestino condenado há 40 anos será solto na França
Essa é uma decisão que entrará para a história. O libanês Georges Ibrahim Abdallah, considerado por alguns como "o prisioneiro mais antigo do mundo ligado ao conflito no Oriente Médio", será libertado após 40 anos atrás das grades na França.
O veredito foi anunciado nesta sexta-feira (15). O tribunal aceitou o 11º pedido de libertação condicional de Georges Ibrahim Abdallah, informou à AFP o Ministério Público Nacional Antiterrorista (Pnat), que anunciou que irá recorrer da decisão.
"Em decisão datada de hoje, o tribunal concedeu a Georges Ibrahim Abdallah o benefício da libertação condicional a partir do próximo dia 6 de dezembro, sob a condição de deixar o território nacional e de não mais retornar a ele", especificou o Pnat num comunicado.
O militante comunista libanês, ex-professor, fervoroso defensor da causa palestina, estava preso há 40 anos na prisão de Lannemezan, no sudoeste da França. Sob o número de registro 2388/A221, ele era considerado o "prisioneiro político" mais antigo da Europa, encarcerado por cumplicidade em assassinato.
Condenado à prisão perpétua em 1986, "Georges Ibrahim Abdallah é o prisioneiro mais antigo do mundo relacionado ao conflito do Oriente Médio", afirma seu advogado Jean-Louis Chalanset.
Cumplicidade por assassinato
Aos 33 anos de idade, em 24 de outubro de 1984, o militante cristão libanês Georges Ibrahim Abdallah, ex-membro da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), entrou em uma delegacia na cidade de Lyon para pedir proteção, acreditando estar sendo perseguido por agentes do Mossad.
Na verdade, quem o seguia eram agentes franceses, pois ele residia em um apartamento registrado em nome de uma pessoa que havia sido presa na Itália com seis quilos de explosivos.
Apesar de portar um passaporte argelino, a Direção de Vigilância do Território (DST) descobriu que ele era cofundador das Frações Armadas Revolucionárias Libanesas (FARL), um grupo marxista que defendia a realização de ações armadas no exterior contra Israel e os Estados Unidos.
As FARL reivindicaram a autoria de cinco atentados, quatro deles fatais, entre 1981 e 1982 na França, em um período marcado por uma nova ofensiva israelense no Líbano.
Preso por posse de armas
Abdallah foi preso em 1984 por posse de armas e uso de documentos falsos. Em 1985, um francês foi sequestrado em Trípoli, no Líbano, pelo grupo revolucionário. Um acordo foi então negociado entre Argel e Paris: a libertação de Georges Abdallah em troca da libertação do francês Gilles Sidney.
No entanto, o acordo nunca se concretizou, e apenas o cidadão francês foi libertado. Isso porque armas foram encontradas na residência do militante libanês em Paris ? as mesmas armas usadas para assassinar dois diplomatas em 1982 em Paris: o norte-americano Charles Ray e o israelense Yacov Barsimantov, que posteriormente foram identificados como agentes da CIA e do Mossad.
Em 1987, Georges Abdallah foi condenado à prisão perpétua, com um período mínimo de cumprimento de quinze anos, após ser considerado culpado por cumplicidade em assassinato em Paris.
Onda de atentados
O clima durante o julgamento foi particularmente tenso: Paris estava sendo abalada por uma onda de atentados e sequestros no Líbano que, como se descobriu mais tarde, não eram realizados pelas FARL, mas por grupos pró-iranianos. Além disso, a partir de 1986, os julgamentos de crimes terroristas passaram a ser conduzidos por um tribunal de júri composto exclusivamente por magistrados profissionais, em vez de jurados populares. O julgamento de Georges Abdallah foi o primeiro a ocorrer sob essa nova configuração especial.
Caso repleto de segredos e mentiras
Georges Ibrahim Abdallah era elegível para a liberdade condicional desde 1999. No entanto, todos os seus pedidos de libertação foram rejeitados, sob a justificativa de que ele nunca demonstrou arrependimento pelos crimes que sempre negou ter cometido.
A única exceção foi em 2013, quando um pedido foi aceito, desde que ele fosse sujeito a uma ordem de expulsão. Contudo, o então Ministro do Interior da França, Manuel Valls, se recusou a assinar essa ordem, impossibilitando a sua libertação, mesmo após um pedido direto do primeiro-ministro libanês, Najib Mikati, que, em visita a Paris, apelou pessoalmente às autoridades francesas pela libertação de seu compatriota, a quem chamou de "prisioneiro político".
Nelson Mandela, um dos prisioneiros políticos mais célebres do mundo, passou 27 anos e 190 dias atrás das grades. Em comparação, Georges Ibrahim Abdallah, que já ultrapassou os 40 anos de detenção, é agora considerado por muitos como um dos prisioneiros políticos mais antigos do mundo.
Pena incompatível com a Convenção Europeia dos Direitos Humanos
Um mês após o veredito, em março de 1987, o primeiro advogado de Georges Ibrahim Abdallah publicou um livro no qual confessava ser um informante dos serviços de inteligência franceses. Mesmo assim, o julgamento nunca foi revisado.
Para seus defensores, o militante libanês foi transformado em bode expiatório, vítima do Estado. Eles argumentam que ele é um prisioneiro político ? um termo amplamente utilizado pelos apoiadores de Georges Abdallah, e que continua a ser adotado por muitos advogados até hoje.
A detenção prolongada de Georges Abdallah tem sido criticada como uma violação dos princípios da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, especialmente no que diz respeito à proporcionalidade da pena e ao direito a um julgamento justo.
Seus apoiadores afirmam que a sua condenação e as sucessivas recusas de libertação condicional refletem pressões políticas, particularmente num contexto de tensas relações internacionais envolvendo Israel, Estados Unidos e França.