ONU diz que métodos usados por Israel em Gaza têm 'características de genocídio'
Um comitê especial da ONU determinou na quinta-feira (14) que os métodos de guerra usados por Israel em Gaza tinham as "características de genocídio", enquanto a Human Rights Watch considerou que o deslocamento forçado repetido dos habitantes de Gaza constituía um crime contra a humanidade. Israel rejeitou as acusações da HRW como "totalmente falsas", mas até o momento não comentou as conclusões do comitê da ONU.
Os Estados Unidos desaprovaram "inequivocamente" as conclusões do relatório da ONU. "Acreditamos que esse tipo de redação e esses tipos de acusações são certamente infundados", reagiu o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Vedant Patel.
Em um relatório que abrange o período de 7 de outubro de 2023, data em que começou a guerra desencadeada pelo ataque do movimento islâmico palestino Hamas contra Israel, até julho de 2024, o comitê especial da ONU expressou enorme preocupação com as "numerosas vítimas civis" e o uso da "fome como arma de guerra".
"Por meio do cerco a Gaza, da obstrução da ajuda humanitária, dos ataques direcionados e da morte de civis e trabalhadores humanitários, apesar dos repetidos apelos da ONU, das ordens vinculativas do Tribunal Internacional de Justiça e das resoluções do Conselho de Segurança, Israel está intencionalmente causando morte, fome e ferimentos graves", disse o comitê num comunicado.
Os métodos de guerra empregados por Israel "correspondem às características do genocídio", de acordo com esse comitê especial da ONU, criado em 1968 para investigar as práticas israelenses nos Territórios Palestinos Ocupados, conquistados no ano anterior por Israel (Cisjordânia e Faixa de Gaza).
Essa não é a primeira vez que Israel é alvo de tais acusações desde o início da guerra, há mais de um ano.
O relatório, que deverá ser apresentado à Assembleia Geral da ONU em Nova York na segunda-feira, afirma que a campanha de bombardeio de Israel em Gaza terá consequências de longo prazo.
"Ao destruir sistemas vitais de água, saneamento e alimentos, e ao contaminar o meio ambiente, Israel criou uma mistura letal de crises que causará sérios danos às gerações futuras", disse o comitê.
"Eles querem nos matar"
Em outro relatório publicado na quinta-feira, a ONG Human Rights Watch (HRW) afirma que as repetidas ordens de evacuação do Exército israelense na Faixa de Gaza estão levando a deslocamentos forçados da população, constituindo "um crime contra a humanidade".
Em outubro, a ONU estimou que 1,9 milhão de habitantes de Gaza haviam sido deslocados pela guerra, de uma população total estimada em 2,4 milhões no início do conflito.
"As declarações de altos funcionários com responsabilidade de comando mostram que os deslocamentos forçados são intencionais e fazem parte da política do Estado israelense e, portanto, constituem um crime contra a humanidade", diz o relatório, ressaltando que a 'transferência forçada' de civis é um 'crime de guerra' conforme o direito internacional.
As autoridades israelenses, por sua vez, alegam estar convocando os habitantes de áreas inteiras da Faixa de Gaza a se deslocarem devido a imperativos militares e, ao fazê-lo, alegam estar ajudando a proteger os civis.
"Repetidamente, a retórica da Human Rights Watch sobre o comportamento de Israel em Gaza é totalmente falsa e desvinculada da realidade", declarou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Oren Marmorstein, na rede social X.
O Exército israelense, por sua vez, rejeitou "determinadas distorções flagrantes" da realidade feitas pela HRW, que acusou de "parcialidade anti-Israel".
"Não vou fugir"
De acordo com Louise Wateridge, porta-voz da agência das Nações Unidas para os refugiados palestinos (UNRWA), uma ofensiva israelense que está em andamento há mais de um mês forçou pelo menos 100 mil pessoas das localidades mais ao norte do território a se mudarem para a Cidade de Gaza.
Iman Hamad, uma mãe de 41 anos de Beit Hanoun (norte), diz que foi deslocada mais de dez vezes. "Antes, eu achava que eles queriam nos mudar, agora percebo que eles querem nos matar e nos exterminar", disse ela à AFP na quarta-feira.
"É melhor morrer instantaneamente por um projétil do que morrer mil vezes pela humilhação de ser deslocado, pela fome e pela miséria", disse Achraf Abou Habl, um motorista de táxi de 50 anos. "Vou ficar em Jabalia (extremo norte de Gaza). Não vou fugir", acrescentou.
Limpeza étnica
De acordo com a HRW, "as ações de Israel também parecem corresponder à definição de limpeza étnica" nas áreas onde o Exército ordenou que os palestinos saíssem e para onde eles não poderão retornar.
A HRW menciona, em particular, duas áreas geralmente chamadas de corredores Neztarim e Filadélfia, que, segundo ela, foram "arrasadas, ampliadas e varridas" pelo Exército israelense para criar zonas de isolamento.
O comitê da ONU conclamou a comunidade internacional a agir com urgência para interromper o derramamento de sangue, destacando que os países continuam a fornecer "apoio militar" a Israel.
A HRW incentivou o promotor do Tribunal Penal Internacional a "investigar" todos esses fatos.
(Com AFP)