Agricultores voltam a protestar em Bruxelas contra acordo comercial entre União Europeia e Mercosul
Os tratores estão de volta às ruas de Bruxelas para protestar contra uma provável e eminente assinatura do acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul. As manifestações, que contaram com cerca de uma centena de agricultores e seus apoiadores, começaram na manhã desta quarta-feira (13) em frente ao prédio da Comissão Europeia.
Letícia Fonseca-Sourander, correspondente da RFI em Bruxelas
Convocados pelo sindicato Fugea, que defende a agricultura camponesa, e a federação europeia ECVC (Coordenação europeia via campesina), os manifestantes voltaram a expressar sua rejeição contra o famoso tratado, que poderá vir a ser concluído durante a reunião do G20, no Rio de Janeiro, nos próximos dias 18 e 19 de novembro. Recentemente, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchez, afirmou que além da Cúpula do G20, outra "data-chave" para uma possível assinatura seria durante a Cúpula do Mercosul, nos dias 5 e 6 de dezembro, no Uruguai, que neste semestre ocupa a presidência pro-tempore do bloco.
Segundo um dos organizadores da Fugea, esta manifestação em Bruxelas é uma "ação simbólica" e não uma mobilização geral como a que aconteceu no início deste ano, quando milhares de tratores bloquearam as ruas da capital belga por vários dias. Mesmo assim, está confirmado que os protestos atuais vão continuar nesta quinta-feira (14). Representantes de sindicatos agrícolas vindos de toda a Europa, assim como a coalizão "Stop UE-Mercosul" liderada pelo Centro Nacional de Cooperação e Desenvolvimento CNDC, ativistas climáticos e alguns eurodeputados contrários à assinatura do acordo, também participaram dos protestos.
Medo e resistência
Os agricultores europeus, e principalmente os franceses, temem ser vítimas de uma concorrência desleal caso o acordo seja assinado. "As normas e padrões nestes países (do Mercosul) são bem inferiores aos nossos, a carne chega (na Europa) com um custo baixo e faz baixar os preços do mercado", explica ao jornal belga Le Soir, Timothée Petel, responsável do setor político do sindicato Fugea. "A Europa nos pede para produzir respeitando padrões ambientais e de qualidade sempre mais exigentes e, ao mesmo tempo, também nos pede para sermos competitivos face à pior indústria agroalimentar do planeta. Simplesmente não é possível. É preciso fazer escolhas e nos dar a possibilidade de fazer evoluir nossas práticas em relação a um máximo de durabilidade", disse.
A Fugea rejeita a ideia proposta por alguns responsáveis políticos de indenizar os agricultores europeus para contrabalançar as consequências negativas das importações de carne bovina sul-americana. "Nós não nos deixaremos jamais sermos enganados por estas indenizações. Nossos agricultores não são variáveis de ajustamento à compra ou à venda", advertiu o sindicato.
Revolta francesa
Na França, o tom de reclamação dos agricultores tem se elevado na medida que a reunião do G20 se aproxima. Menos de um ano após o movimento dos agricultores ter entrado em confronto com a polícia em várias capitais europeias, a mobilização deve recomeçar e se intensificar na semana que vem.
A aliança sindical majoritária FNSEA-Jovens Agricultores convocou ações nacionais na segunda quinzena de novembro. A Coordenação rural, segundo sindicato agrícola da Bélgica, promete uma "revolta agrícola" marcada para começar no dia 19 de novembro, com o bloqueio do frete de alimentos.
Enquanto isso em Bruxelas, o primeiro-ministro francês Michel Barnier se reuniu com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. A visita relâmpago do premiê, além de ser uma ocasião para o ex-comissário europeu defender o seu projeto de orçamento para 2025, será sobretudo para expressar a sua "total oposição" ao acordo de livre comércio com o Mercosul. Por sua vez, Von der Leyen, que recebeu o repúdio de mais de 600 parlamentares franceses ao tratado, deve desembarcar no Brasil neste final de semana, com a firme intenção de concluir o processo.
Para o jornal francês Le Monde, "o acordo UE-Mercosul já não desperta tanto entusiasmo. A participação das exportações do setor agroalimentar brasileiro destinadas aos países da União Europeia caiu entre 1999 e 2024, de 40,9% a 13.3%, principalmente em benefício da China, que hoje representa 32,6% das exportações". Le Monde ressalta que o texto para o acordo que está "em negociação desde 1999, e prevê a eliminação gradual dos direitos aduaneiros sobre 90% dos produtos comercializados entre os dois blocos, criando assim um mercado de 720 milhões de consumidores. Embora tenha sido assinada por ambos os lados em junho de 2019, a chegada ao poder do presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro (2019-2022), esfriou os europeus".