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Amanda Paschoal: 2025 terá mais resistência do que avanço para a esquerda

do UOL

Do UOL, em São Paulo

02/11/2024 05h30

A vereadora eleita Amanda Paschoal, 32, foi a representante da esquerda mais votada da Câmara Municipal. Em janeiro, ela toma posse com o objetivo de ter protagonismo na oposição. Ela prevê um ano difícil pela frente, com a maior parte dos eleitos posicionados no campo da direita. Mesmo assim, em entrevista ao UOL, ela afirma que "não será impossível".

Apoiadora do deputado federal e candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PSOL, Guilherme Boulos, e afilhada política da deputada federal pelo PSOL Erika Hilton, Amanda diz que o prefeito reeleito precisa acertar as contas com a Justiça.

Sobre a relação com o novo prefeito da Câmara, Amanda diz que vai cobrar respeito e não vai deixar "ninguém aprovar projetos a toque de caixa".

Relação com a prefeitura

A vereadora eleita disse que a primeira coisa que Ricardo Nunes (MDB) terá de fazer como prefeito reeleito será "acertar as contas com a Justiça". Ela, como oposição, prometeu investigar os contratos públicos da administração municipal para evitar prejuízos com corrupção.

Será a continuidade de uma gestão que prefere usar dinheiro público para beneficiar amigos em contratos suspeitos ao invés de aplicar em políticas públicas eficientes.
Amanda Paschoal (PSOL), vereadora eleita

Na Justiça, existem processos que podem cassar o mandato dele e torná-lo inelegível. Temos fortes evidências de abuso de poder político e econômico durante o período eleitoral, como a pressão de funcionários em cargos comissionados para trabalhar na campanha. Sem falar no crime cometido pelo governador Tarcísio de Freitas de que o crime organizado queria votar no Guilherme Boulos, sem provas.

Como oposição, vamos ter que investigar ainda mais cada contrato, cada destinação do dinheiro público, para garantir que a cidade tenha menos prejuízo com os casos de corrupção.

Teremos muitas dificuldades para pôr em prática as políticas e os avanços que desejamos e defendemos. Será um trabalho difícil, tanto pela composição da Casa quanto pela prefeitura, mas não impossível.

'Vou cobrar respeito'

A psolista afirma que apesar das dificuldades que prevê enfrentar, quer criar o Fundo Municipal de Política LGBTQIA+, com ações nas áreas da saúde, emprego, moradia. Ela também tem como meta aumentar o número de casas de acolhimento para pessoas transgênero em São Paulo.

Não sei como vou ser recebida na Casa. Tenho que chegar lá e sentir. Vou impor respeito para ser respeitada pelos votos que tive e pelo trabalho que vou desenvolver, e para garantir que a gente consiga construir dentro do possível com resistência, não abaixando a cabeça para os dizeres do prefeito.

Pretendo fazer o fortalecimento do embate no plenário. Para as pessoas que atacarem, tanto com transfobia, quanto com racismo, vou seguir o rigor da lei para garantir que essas figuras não achem que lá vai ser uma terra sem lei.

A presidência [da Câmara] é um cargo que carrega a necessidade de organização dos trabalhos, mediação de conflitos, garantia da ordem e do direito da oposição questionar atos do governo. Vou cobrar respeito, decoro e não vou deixar ninguém rasgar o regimento para aprovar projetos a toque de caixa e por baixo dos panos.

Tudo pode ser uma surpresa, pode ter alguém de um partido de direita que vai ter uma relação cordial comigo e dentro do possível, do que não vá contra nem a lógica do trabalho da pessoa nem da minha, eu vou dialogar.

Vai ser um trabalho mais de resistência no começo do que de avanços.

Saúde mental e pautas verdes

Amanda Paschoal afirma que tem como meta continuar o trabalho de sua madrinha política, a deputada federal Érika Hilton. A candidatura de Amanda recebeu 108.654 votos de eleitores da cidade e se consagrou como a quinta vereadora mais votada. Em 2025, ela diz que cobrará respeito ao regimento da Casa do próximo presidente.

A psolista afirma que deve se reunir com membros do partido para planejar o início dos trabalhos no ano que vem. Segundo ela, suas principais propostas buscam garantir que os direitos humanos sejam respeitados.

Vamos pensar no projeto 'Respeito desde a escola', que pretende combater o machismo, misoginia, racismo, LGBTfobia dentro das escolas. O projeto será para apoiar escolas e a comunidade escolar em decorrência das disseminação de fake news.

A saúde mental é outra questão muito cara, quero pensar e desenvolver um projeto que valorize a saúde mental para todas as pessoas, e garantir que a violência LGBTfóbica, o machismo, o racismo, não seja perpetuados dentro das escolas.

Minha meta é criar uma política de emergência climática, pensando em soluções verdes pautadas nos territórios. Tem também a Política Nacional de trabalho digno e cidadania para a população em situação de rua, que a gente precisa da adesão para ser implementada no município.

O que eu quero trazer é a defesa aos direitos humanos, o combate à fome, que era uma pauta prioritária, o fundo municipal de combate à fome, que ela [Érika Hilton] aprovou, foi esvaziado por Ricardo Nunes e precisa ser retomado.

Embate com Pavanato

A vereadora eleita diz que vai se posicionar contra pautas defendidas pelo vereador eleito Lucas Pavanato (PL), como o impedimento do acesso de mulheres trans a banheiro femininos. Ela diz que não tem receio do conservadorismo que deve enfrentar na Câmara e que devolver eventuais ataques "com base na lei".

É um absurdo a pessoa conseguir se eleger com propostas inconstitucionais ou pautadas apenas no ódio à comunidade LGBTQIAPN+. Quando houver qualquer excesso da parte envolvida, quando passar um pouquinho do limite do que é aceitável, do que é legal, vamos processar.

O maior enfrentamento [à direita] será a minha presença. Vou olhar para ele e dizer: 'Me tire do banheiro feminino. Me faça usar o banheiro masculino, se você acha que isso é certo'.

Vou levar os dados que mostram o Brasil como um dos países que mais matam pessoas trans e travestis no mundo e cobrar dos órgãos competentes para que esse tipo de pauta não seja colocada em votação. Vou resistir de todas as maneiras que eu puder.

Formação de novas lideranças

Diante do desempenho da esquerda nas urnas, Amanda afirma que as siglas desse campo devem repensar estratégias de comunicação para 2026. A vereadora eleita afirma que a esquerda precisa priorizar a formação de novas lideranças que, assim como ela, podem ser incentivadas dentro da política institucional.

Teremos esses dois anos para reformular, reconstruir e repensar estratégias de crescimento para o partido. É o que representa mais a esquerda hoje no nosso país para garantir que em 2026 tenhamos resultados mais promissores.

O déficit principal é na comunicação. A esquerda precisa elaborar estratégias para conseguir atingir mais pessoas, estourar mais nas redes e chegar num público que a direita consegue cooptar para que a gente não seja vitimado mais uma vez por essa onda à direita que tem tomado conta.

É importante a gente conseguir reaproximar as pessoas da política, como fez Erika Hilton. Ela conseguiu furar a bolha e aproximar pessoas que não estavam envolvidas com política.

Da assessoria parlamentar à vitória nas urnas

Amanda nasceu na zona sul de São Paulo e viveu parte da infância e adolescência em Aracaju (SE). Na capital sergipana, enfrentou discriminações de gênero e recebeu acolhimento familiar. Aos 27, já em São Paulo, se formou em Gestão de Turismo.

Em 2020, recebeu um convite para trabalhar no gabinete da deputada federal Erika Hilton. No ano seguinte, começou a atuar como assessora parlamentar, até que em dezembro de 2023 deixou a assessoria parlamentar para se lançar candidata.

Quando você se reconhece como uma pessoa trans, uma travesti, não tem como não ter um contato com a luta política, com a militância, porque a sobrevivência e o seu senso crítico são aflorados justamente por conta da hostilidade da sociedade.

Quando comecei nesse processo, pensava que eu podia também concorrer a um cargo público. Primeiro foi uma ideia minha, depois a Erika falou para mim: 'Se você tiver interesse, a gente pode pensar em você ser a vereadora, que eu vou apoiar'. A conversa foi um divisor de águas para a construção desse projeto político.

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