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'Pesei 47 kg e meus pais choraram ao me ver': ele expõe jornada com drogas

do UOL

Do UOL, em São Paulo

24/10/2024 05h30Atualizada em 24/10/2024 09h35

O empreendedor Marcos Sato, 27, decidiu transformar suas redes sociais em um "livro aberto" sobre uma realidade que muitos querem esconder: o vício em drogas.

A exposição vem com um duplo resultado: por um lado, o motiva e o conecta a pessoas que querem ajudá-lo. Por outro, o faz receber convites que vão na direção oposta do que ele deseja: manter-se livre dos entorpecentes.

'Ia a festas e usava'

Ainda na adolescência, aos 16 anos, Sato experimentou o MDMA, uma droga sintética também conhecida como ecstasy e muito comum em baladas.

Desenvolveu dependência psicológica. "Não conseguia frequentar mais ambientes de festas eletrônicas, que era o grupo de que eu gostava, sem consumir isso", lembra.

A princípio, frequentava esses ambientes de três em três meses. Depois, de dois em dois meses. Até que virou mensal e chegou o momento em que eu estava me vendo todo fim de semana em festas eletrônicas e usando.
Marcos Sato

Aos 17 anos, ele experimentou cocaína e teve um percurso de dependência com esta droga até os 21 anos, quando foi para os Estados Unidos.

'Todos os dias'

Sato mudou-se para Washington para estudar direito e não sabia que, àquela altura, a metanfetamina (ou cristal/tina, como é conhecida popularmente) já era um problema de saúde pública na cidade.

"Era uma coisa muito distante da minha realidade, mas, quando cheguei, logo na primeira semana, tive contato."

A droga vinha junto com relacionamentos. "Conheci um rapaz em um aplicativo que era usuário, mas não tinha falado para mim muito abertamente sobre isso", lembra.

Ele foi me cativando, criei certa dependência afetiva e, quando nos encontramos, acabei cedendo ao que ele me ofereceu. Quando usei pela primeira vez, tinha 21 anos e passei um ano mais ou menos usando todos os dias, sem exceção.
Marcos Sato

Altamente viciante, a metanfetamina tem efeito praticamente imediato —que também acaba rapidamente. A substância aumenta a dopamina no cérebro, relacionada à sensação de prazer —o que faz com que a pessoa queira repetir a experiência.

A droga também é "popular" no sexo químico —quando pessoas usam para aguentar maratonas sexuais, se desinibir ou se sentirem bem com o próprio corpo.

"É uma droga que aumenta a libido, a euforia, faz você se sentir com autoestima alta. E muitos homossexuais têm essa questão com baixa autoestima", diz Sato.

Ela proporciona tudo o que se quer. Anestesia sentimentos negativos e te causa uma sensação de poder e bem-estar. Mas é uma falsa sensação, porque dura um tempo e quando acaba você fica no chão.
Marcos Sato

Durante todo o período em que esteve nos Estados Unidos, Sato nunca fez uma chamada de vídeo com os pais.

"Não tinha coragem de mostrar minha aparência. Quando apareci no Brasil e eles foram me buscar, a primeira reação deles foi chorar. Choraram quando me viram. Eu estava pesando 47 quilos, tenho 1,71 metro."

Mesmo após voltar para o Brasil, ele não conseguiu pedir ajuda de cara. Certa vez, teve um "choque de realidade". Em uma semana, perdeu sete quilos.

Acabei em um motel, sozinho, me olhei no espelho quando estava passando o efeito da substância, já não tinha mais nada e falei: 'Isso não está acontecendo comigo de novo, né?'. Aí eu consegui me ver.
Marcos Sato

Ele conta que usava tanto que ficava "em estado de paranoia". "Não conseguia me comunicar com as pessoas direito de tanta alucinação, muitos dias acordado, privação de sono. Tudo isso causa um problemão no cérebro, você não é funcional."

Para conseguir dar conta da vida profissional, usava mais —e isso virava um ciclo de desajustes. "Fazia estágio, o escritório era grande, com alto volume de processos. Comecei a pedir cocaína na faculdade: usava a partir das sete e meia da manhã."

Em processo de recuperação

Com o apoio da família e do noivo, Sato conseguiu buscar ajuda.

"[Uso] os recursos de terapia e psiquiatra, médico, profissionais, e um pouco de espiritualidade, que tem me ajudado bastante. Também procuro praticar esportes e atividades físicas."

Ele explica que é um adicto em recuperação —definição que faz sentido para ele em vez de dizer que está "curado" ou apenas sóbrio.

Sato enfrenta um dia depois do outro e não esconde as recaídas que teve.

'Comecei a sentir orgulho de algo que fiz'

Ele já acompanhava perfis norte-americanos que produziam conteúdo falando sobre suas jornadas enquanto pessoas adictas. Sem grandes pretensões, apoiou o celular em uma pilha de livros e fez o mesmo.

Hoje, seu perfil já tem mais de 130 mil seguidores e 7,3 milhões de curtidas.

Eu fico surpreso, às vezes nem acredito. As pessoas engajavam em meus vídeos e criaram uma empatia comigo.
Marcos Sato

A ideia era ajudar outras pessoas com histórias semelhantes, mas o empreendedor viu ali também um novo ponto de apoio para continuar sua recuperação.

Uma das surpresas positivas foi poder ressignificar sua relação com as redes sociais.

Eu me validava por fotos, por exemplo, sem camisa no Instagram. E o TikTok me mostrou uma coisa: as pessoas curtem o Marcos. A pessoa, entendeu? Eles valorizam meu conteúdo, o que tenho para falar. Pela primeira vez, comecei a me orgulhar de algo que eu mesmo fiz.
Marcos Sato

'Conhecem meus pontos fracos'

Mas nem tudo foi simples. O alcance que Sato conseguiu logo mostrou a ele que lidar com desconhecidos do outro lado da tela não seria tão fácil.

Em um de seus vídeos, ele mostrou as feridas no rosto, consequência dos efeitos da metanfetamina. E contou sobre a forma como teve acesso à droga que causou essa recaída: oferta de um seguidor.

Ele [seguidor] foi muito cara de pau, me chamou no Instagram e falou: 'Vejo seus conteúdos no TikTok, gosto muito de você, mas tenho isso, isso, isso [drogas], e o preço é tal. Você quer?'. Uma pessoa que sabia das minhas fragilidades, das minhas vulnerabilidades.
Marcos Sato

Uma das saídas encontradas pelo empreendedor para evitar esse tipo de exposição foi deixar sua mãe no controle de suas finanças. Mesmo assim, a insistência de muitas pessoas se tornou um obstáculo, especialmente quando a oferta era gratuita.

"Esse é um lado negativo", reconhece Sato. "As pessoas conhecem meus pontos fracos, os exponho porque quero ser uma pessoa real. Tenho de ser mais forte que isso e estou trabalhando em terapia e com psiquiatra."

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