Topo
Notícias

União Europeia e advogados de Angola condenam violência pós-eleitoral em Moçambique

22/10/2024 16h29

O líder de oposição moçambicano Venâncio Mondlane, dissidente do partido Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), acusou nesta terça-feira (22) as forças de segurança do país de terem assassinado seu advogado, Elvino Dias, em razão de um recurso jurídico que ele preparava para denunciar fraudes nas eleições presidenciais e parlamentares disputadas em 9 de outubro. 

Lígia Anjos e Orfeu Lisboa, da RFI, com AFP

O advogado Elvino Dias e Paulo Guambe, membro do Podemos - movimento que apoiou a candidatura de Venâncio à presidência -, foram assassinados por desconhecidos na noite de sexta para sábado (19) quando circulavam de carro em Maputo, capital de Moçambique. O carro em que os dois homens estavam foi alvo de uma emboscada envolvendo outros dois veículos, de onde saíram homens armados que mataram os ocupantes à queima-roupa. 

"Não há dúvida, foram as forças especiais que mataram Elvino com 25 tiros", disse o carismático opositor em um vídeo transmitido ao vivo, nesta terça-feira, no Facebook. "Não tem nada a ver com um caso passional, é um crime cometido pelas forças de defesa e segurança", afirmou, acusando a polícia de vincular o duplo homicídio a um acerto de contas de um marido ciumento.

Venâncio, como é chamado por seus jovens eleitores, e outros dois candidatos de oposição disputaram a presidência contra o representante do partido marxista Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), Daniel Chapo, de 47 anos. A Frelimo está no poder há meio século e enfrenta crescente insatisfação da população devido à pobreza endêmica no país.  

O dissidente do Renamo alega vitória na eleição presidencial. Com o assassinato de seu advogado, Venâncio convocou a população a paralisar o país durante dois dias a partir de quinta-feira (24), quando está prevista a publicação dos resultados do pleito. Segundo o opositor, há clima e atmosfera para "uma oportunidade revolucionária" em Moçambique. 

Repressão a protesto deixa feridos em Maputo

A segunda-feira (21) foi marcada por protestos e uma onda de repressão que deixou pelo menos 16 pessoas feridas em Maputo. Após o duplo assassinato de sábado, Venâncio convocou uma greve geral, mas recomendou a seus apoiadores que ficassem em casa. Os que foram às ruas foram duramente reprimidos com bombas de gás lacrimogênio. A sigla Renamo criticou a violência e a brutalidade policial sobre cidadãos indefesos.

"Assistimos ontem a cenas impensáveis numa democracia: cidadãos exercendo o seu direito de se expressar e manifestar sendo tratados com brutalidade e repressão policial. Quando pessoas saem às ruas para reivindicar os seus direitos, clamar por mudanças ou simplesmente expressar as suas opiniões, não estão apenas cumprindo um dever cívico, mas exercendo um direito conquistado com o sacrifício de filhos e filhas desta pátria", declarou o porta-voz da legenda, Marcial Macome.

A tensão no país tende a aumentar nesta quarta-feira (23) com o funeral do advogado Elvino Dias. Venâncio convoca os 154 distritos de Moçambique à mobilização. 

O ex-presidente Joaquim Chissano comentou o assassinato do advogado, declarando sua "profunda indignação e repúdio" pelo "crime hediondo". "Este ato de violência brutal, que mancha a imagem do nosso país, é um ataque à vida humana que é inaceitável e vai contra os princípios e valores de dignidade, respeito e de justiça que defendemos e que devem sustentar a nossa sociedade", disse o ex-dirigente moçambicano.

Nos vídeos que publica diariamente nas redes sociais, sempre vestido com uma camiseta pólo amarela e um colete sem mangas, o opositor mantém seus simpatizantes atualizados sobre a contagem paralela de votos e diz ter certeza de que sua cabeça foi colocada a prêmio. Na segunda-feira, pouco antes de iniciar sua transmissão diária pelas redes, Venâncio cancelou a fala por estar, segundo ele, em um "local inseguro".

Observadores da UE denunciam alterações na apuração dos votos

Em um comunicado divulgado no sábado, observadores da União Europeia que acompanham o processo eleitoral no país africano já haviam sublinhado que era "essencial que todos os candidatos beneficiassem de medidas de proteção rigorosas neste período pós-eleitoral".

Nesta terça-feira, abandonando o tom de cautela, os observadores europeus defenderam o "respeito pelas liberdades fundamentais e pelos direitos políticos" e afirmaram que as eleições estão sendo marcadas por "alterações injustificadas dos resultados nas seções eleitorais e distritos". 

Advogados de Angola condenam assassinato de advogado 

Dezenas de ativistas angolanos realizaram na segunda-feira uma vigília em solidariedade com o povo moçambicano, para exigir "verdade eleitoral e direito à vida", após os assassinatos do advogado de Venâncio Mondlane e de seu acompanhante.

A Ordem dos Advogados de Angola divulgou uma nota denunciando a morte do conselheiro jurídico Elvino Dias como "um crime abominável que violou não apenas a sua vida, mas também os valores fundamentais que ele defendia em prol da justiça e do verdadeiro Estado de Direito".

"Apelamos às autoridades competentes para que garantam com celeridade que os responsáveis por este crime sejam exemplarmente punidos, pois a impunidade não pode prevalecer onde a justiça é o pilar central de uma sociedade", lê-se no documento.

A Ordem dos Advogados de Angola declara apoio total à entidade representativa dos colegas moçambicanos. O comunicado ressalta o "momento importante de união entre os advogados e cidadãos para combater a injustiça e assegurar a responsabilização dos autores do crime, reconhecendo que tais situações podem ocorrer em qualquer país africano".

Notícias