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Por que Boulos tem tanta dificuldade em conquistar novos eleitores?

Guilherme Boulos (PSOL) faz debate público em frente ao Theatro Municipal, em São Paulo - 18.out.2024-Eduardo Knapp/Folhapress
Guilherme Boulos (PSOL) faz debate público em frente ao Theatro Municipal, em São Paulo Imagem: 18.out.2024-Eduardo Knapp/Folhapress
do UOL

Matheus Pichonelli

Colunista convidado

18/10/2024 16h19

Menos de 24 horas após aparecer 18 pontos atrás de Ricardo Nunes (MDB) no Datafolha, Guilherme Boulos (PSOL) decidiu promover uma discussão com eleitores dele mesmo em frente ao Theatro Municipal, no centro de São Paulo.

Na véspera, ele falou sozinho no debate UOL/Folha/RedeTV!. E sozinho seguiu falando, no dia seguinte, numa área em que já levou a melhor sobre os adversários no primeiro turno.

Dessa vez, nem jornalista tinha para confrontar o candidato.

Boulos foi elogiado e seguiu livre para encantar uma plateia que já estava convertida —ao menos era o que dava para notar pela profusão de adesivos com o número de legenda do deputado.

"Nós temos nove dias para fazer a mudança vencer nessa cidade", declarou.

Oito dias, no caso. Porque a revolução não partirá da área central.

A pesquisa divulgada na quinta-feira (17), que deu a Boulos 33% das intenções de voto, contra 51% de Nunes, escancarou a dificuldade de Boulos avançar sobre território inimigo —no caso, eleitores que no primeiro turno votaram no atual prefeito ou em Pablo Marçal (PRTB).

Há explicações para isso. Uma delas é que a direita conservadora tem falado com mais encanto ao coração e mente das pessoas na periferia, onde por algum tempo os candidatos do PT triunfaram.

A convocação de Marta Suplicy (PT) para compor a chapa do psolista tinha essa função, já que ela sempre foi bem votada nas franjas da cidade. Mas as franjas da cidade não são as mesmas dos anos 2000.

A verdade é que a esquerda, com exceção de alguns momentos de trégua histórica, nunca teve hegemonia na periferia —ninguém teve, na verdade, vide a ascensão e queda da popularidade de Paulo Maluf.

Assim como nos tempos do malufismo, a máquina pública explica a força de Nunes hoje em bairros como Parelheiros.

Outra razão (mais óbvia) é o avanço das igrejas evangélicas, que hoje, via de regra, funcionam como interceptadores de discursos alinhados ao campo progressista. Estes não podem ouvir falar de linguagem neutra que chamam o pastor para exorcizar.

Marçal, que chamava Boulos de "Boules" e despontava como o candidato da Faria Lima, surpreendeu ao bater adversários em extremos da cidade, como Tucuruvi e Ermelino Matarazzo.

É para esses eleitores que o candidato do PSOL acena quando diz nos debates que quer dialogar com motoristas de Uber e microempreendedores, por exemplo. Entre as propostas dele, está a isenção desses profissionais do rodízio da cidade, liberação de publicidade em táxis e instalação de casas de apoio para motofretistas.

O problema é que os rivais também dialogam com esses grupos. Marçal, por exemplo, vendia sonhos, utopias, mesmo que no campo abstrato das promessas improváveis de prosperidade (ou enriquecimento) fácil.

A esquerda, que já fez esse papel, hoje está tão ocupada em discursar contra o retrocesso que parece ter dificuldade em falar de futuro.

E só reverbera quando fala à bolha.

Em parte, por teimosia. Em outra, por limitações claras.

Pesa contra Boulos a falta de experiência em cargos de gestão —explorada por adversários e que desativaria na hora a piada da carteira de trabalho—, a falta de musculatura do PSOL e as aparições bissextas de Lula e de figurões dos aliados do PT na campanha. Isso são dificuldades reais.

Há outras —e estas são potencializadas pela própria arquitetura das redes.

Boulos passou parte da campanha na defensiva. Teve de responder a acusações infundadas como a de que seria usuário de drogas, liberaria uso de entorpecentes na cidade e deixaria os parceiros do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) invadir as casas da classe média assombrada.

Nada disso era verdade, mas as acusações ganham tração e ecoam em velocidade de avião nas páginas onde ódio é sinônimo de engajamento —e a verdade anda a passos de tartaruga e, quando chega, já não convence nem emociona tanto quanto o absurdo.

O dilema de Boulos é o dilema de quem precisa botar o pé em disputas vencidas, quase sempre, por quem berra mais alto.

Ele até tenta fazer isso trazendo questões da vida pessoal de Nunes ao centro do debate. Não é bem seu figurino. E, neste figurino, nada indica que conseguirá avançar para grupos além daqueles já conquistados.

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