Guilherme Boulos (PSOL) não esperou amanhecer no dia seguinte para ligar a câmera do celular e mostrar nas redes sociais a situação do bairro onde mora, o Campo Limpo, em meio à chuva que derrubou árvores, fiações, semáforos e a energia elétrica em São Paulo.
"Não tem poda (de árvores). Você demora meses e meses para conseguir. E aí vem uma ventania, vem uma chuva, e o que acontece é essa situação, esse caos, a cidade parada. A cidade de São Paulo parece que não tem prefeito", disparou o candidato, quase no breu.
Foi apenas o primeiro dos 30 vídeos no Instagram com ataques ao adversário Ricardo Nunes, candidato à reeleição pelo MDB, e à Enel, a empresa italiana responsável pelo fornecimento de energia elétrica na metrópole.
No mesmo bairro, na zona sul, onde uma pessoa morreu após a queda de uma árvore, Boulos circulou de carro pela noite, ainda na sexta-feira, para divulgar o cenário pós-apocalíptico.
O deputado gravou vídeos também em sua casa, uma das muitas atingidas pela queda de energia. "Caos em São Paulo: sem luz e sem prefeito."
Boulos voltou ao ataque 12 horas depois, já na manhã no dia seguinte. "Essa é a situação de uma cidade sem prefeito e que tem uma companhia energética que a gente já sabe, é uma tragédia. Junta as duas coisas. Um prefeito que não tem pulso pra fazer a companhia garantir o básico em São Paulo e não tem competência para fazer manejo arbóreo".
Ele gravou também uma série de vídeo com moradores, registrou o caos para ser atendido pelo serviço da prefeitura para remoção de árvores, repostou reportagens, manchetes, carrossel e até desenhos associando o prefeito à defesa da privatização do serviço básico. E também de ter ido para uma corrida de Fórmula 1 quando a cidade passava por situação parecida em 2023.
O candidato do PSOL também publicou nas redes uma cópia do pedido encaminhado ao Ministério Público para investigar tanto a empresa quanto a prefeitura.
Nunes não apanhou em silêncio.
Correu para vestir o colete da Defesa Civil e gravou diversos vídeos em áreas de monitoramento da prefeitura e reuniões com o secretariado.
A ideia era mostrar a força da natureza — com chuvas e rajadas de vento, contra as quais, em tese, não tinha o que fazer. Foram 23 postagens até a manhã de segunda-feira.
Nunes ignorou Boulos, mas partiu para cima da Enel e do governo federal. O figurino era o de gestor que perde noites de sono e arregaça as mangas, em contraste com a imagem que o rival tentava colar.
"Mais uma vez a Enel dando transtorno para a cidade", disse ele num vídeo gravado na noite de sábado.
Em outro, repostou imagens aéreas da GloboNews mostrando caminhões da Enel parados no pátio da empresa.
"Olha a irresponsabilidade dessa empresa que tem a concessão do governo federal. Eu já tô pedindo desde o ano passado para cancelar esse contrato com a Enel. Isso depende do governo federal, do ministro irresponsável de Minas e Energia. Eu fui lá (a Brasilia) e ele (o ministro Alexandre Silveira) não fez nada. (O cancelamento) Depende da Agência Nacional de Energia Elétrica, que é do governo federal."
Quem entrou na briga, então, foi o ministro citado. Alexandre Silveira acusou Nunes de usar a estratégia de Pablo Marçal, candidato derrotado do PRTB, ao divulgar fake news.
No X, o antigo Twitter, ele negou que o governo Lula pretendia renovar a concessão com a empresa italiana, como sugeriu o prefeito. E questionou: "As árvores de São Paulo que caíram em cima das redes de energia também são de responsabilidade do governo federal?"
Silveira aproveitou para lembrar que a Aneel não é do governo federal. É uma agência reguladora que foi loteada durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), apoiador de Nunes. "O que anda fazendo a Aneel, agência ocupada por indicações bolsonaristas, que não dá andamento ao processo de caducidade que denunciei há meses?", questionou.
Boulos ganhava, assim, o reforço do governo federal na briga. E também do PT, cuja presidente, Gleisi Hoffmann, não perdeu a chance de criticar o modelo de privatização e dizer que São Paulo estava colhendo os frutos que "esse pessoal" (Nunes incluído) plantou.
No fim, pediu mudanças. E, claro, voto no aliado.
É com este clima — e com pólvora, munições e galhos de árvores espalhados por toda a cidade — que os candidatos iniciam uma semana decisiva de debates e enfrentamento. Mesmo que a luz seja restabelecida, o apagão não sairá da pauta eleitoral tão cedo.