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Alemanha mergulha no passado da Guerra Fria e condena ex-agente da Stasi, 50 anos depois da queda do muro

14/10/2024 10h48

Em um julgamento que já é considerado histórico, um tribunal alemão condenou nesta segunda-feira (14) um ex-agente da Stasi, a polícia política da República Democrática Alemã (RDA), sede do regime comunista oriental antes da queda do Muro de Berlim, a dez anos de prisão pelo assassinato de um polonês que queria fugir para o Ocidente há 50 anos.

O tribunal de Berlim está "absolutamente convencido" de que Martin Naumann, ex-agente da Stasi, de 80 anos de idade, foi o responsável pela morte a tiros do homem de 38 anos, quando ele tentava fugir pelo posto de fronteira do famoso bairro de Friedrichstrasse, em Berlim, em 1974, disse o presidente do tribunal, Bernd Miczajka.

Embora o atirador, que tinha 31 anos na época, não tenha agido "por motivos pessoais", ele "executou impiedosamente" um ato "planejado pela Stasi", a temida polícia secreta da Alemanha Oriental durante a Guerra Fria, explicou o juiz. O promotor público alemão havia solicitado 12 anos de prisão para o ex-tenente, que agora está aposentado.

Naumann rejeitou a acusação por meio de seus advogados, que estavam buscando sua absolvição com base no argumento de que não havia provas suficientes de que ele seria o atirador. 

De acordo com Daniela Münkel, chefe dos arquivos da polícia secreta em Berlim, o veredicto desta segunda-feira faz dele o primeiro ex-oficial da polícia secreta da antiga Alemanha Oriental comunista a ser condenado por assassinato.

Um gostinho amargo de Guerra Fria

Desde seu início em março, o julgamento, que está sendo registrado por seu valor histórico, mergulhou o país de volta na Guerra Fria, um período durante o qual a Alemanha foi dividida em duas pela Cortina de Ferro entre a RFA (República Federal da Alemanha), no Ocidente, e a RDA (República Democrática Alemã), no Oriente, separadas pelo Muro de Berlim.

Esse é o ponto culminante de décadas de investigação meticulosa, abandonada e depois reaberta, também pelo lado polonês. A condenação só foi possível graças ao surgimento de novas informações encontradas por dois historiadores alemães e poloneses nos arquivos da Stasi em 2016, ligando Naumann à morte do fugitivo, e à descoberta de novas testemunhas em potencial.

Czeslaw Kukuczka, que sonhava com uma vida no "mundo livre", foi uma das pelo menos 140 pessoas que morreram entre 1961 e 1989 tentando atravessar o Muro de Berlim.

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Em 29 de março de 1974, ele invadiu a embaixada polonesa na antiga Berlim Oriental comunista com uma bomba falsa para forçar sua partida para o Ocidente.

Alertada pela Polônia, a polícia secreta alemã o levou a acreditar que sua libertação havia sido aceita. Mas quando o homem pensou que tinha conseguido escapar, após passar por dois postos de controle sem incidentes, o agente Naumann o matou a tiros, um ato pelo qual mais tarde ele recebeu uma medalha.

Crimes cometidos em nome da Stasi

Czeslaw Kukuczka, funcionário de uma empresa de construção, tinha três filhos que se juntaram à ação civil, mas não compareceram ao julgamento.

O advogado de sua filha, Hans-Jürgen Förster, que considera o acusado como "o último elo de uma cadeia de comando", entrou com um pedido para que a investigação seja estendida a todas as pessoas condecoradas pelo regime pela morte de Kukuczka.

Durante a década de 1990, um total de 251 pessoas foram acusadas de crimes cometidos em nome da Stasi, conforme os arquivos do governo. Dois terços delas, incluindo muitos executores, como guardas de fronteira, foram absolvidos ou as acusações contra eles foram retiradas, principalmente por falta de provas ou testemunhos. Apenas 87 foram condenados, a maioria deles com sentenças leves.

Nem mesmo o próprio Erich Mielke pôde ser condenado por suas atividades como chefe da Stasi de 1957 a 1989, devido à falta de provas suficientes. Entretanto, ele foi condenado a seis anos de prisão em 26 de outubro de 1993 pelo assassinato de dois policiais em 1931, quando era um jovem ativista comunista.

(RFI com AFP)

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