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Governo amplia gasto com políticas para mulheres, mas deve valores de 2024

Casa da Mulher Brasileira  - (Arquivo Midiamax)
Casa da Mulher Brasileira Imagem: (Arquivo Midiamax)
do UOL

Do UOL, em São Paulo

09/10/2024 05h30

O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 prevê um aumento significativo nos recursos voltados à proteção e aos direitos das mulheres em relação à lei orçamentária de 2024. Segundo análise do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), esse incremento se verifica em todos os ministérios: Mulheres, Desenvolvimento Social, Desenvolvimento Agrário e Justiça.

No entanto, mesmo com orçamento, o repasse para esses programas em 2024 enfrenta desafios, e o valor efetivamente destinado é muito baixo. O Ministério da Justiça, por exemplo, não destinou nenhuma verba para o enfrentamento à violência contra a mulher neste ano, apesar de ter previsto um valor inicial de R$ 45 milhões para a ação.

Para o Ministério das Mulheres

A ampliação dos investimentos é parte de uma reestruturação mais ampla das políticas de gênero. A criação do Plano Plurianual (PPA) 2024-2027 estabeleceu três programas específicos para mulheres sob a gestão do Ministério das Mulheres: "Igualdade de Decisão e Poder para Mulheres", "Mulher Viver sem Violência" e "Autonomia Econômica das Mulheres".

Para os programas, o Ministério das Mulheres recebeu um aumento de 56%. Os recursos para despesas discricionárias previstos no Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2025 totalizam R$ 143,7 milhões, um aumento de 56% em relação a 2024 (R$ 92,1 milhões).

Houve aumento de recursos para os três programas. "Igualdade de Decisão e Poder para Mulheres" teve um salto de 247%, passando de R$ 12 milhões em 2024 para R$ 41,6 milhões em 2025 e o programa "Mulher Viver sem Violência", registrou um crescimento de 22%, com R$ 85,2 milhões, ante os R$ 69,8 milhões projetados no PLOA 2024. Por fim, o programa "Autonomia Econômica das Mulheres", que visa promover a independência financeira feminina, viu os recursos aumentarem em 65%, passando de R$ 10,3 milhões para R$ 16,9 milhões.

Projetos para mulheres abrangem outros ministérios

Outros ministérios também ampliaram seus investimentos em programas para mulheres. O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, por exemplo, registrou um aumento de 506% no orçamento destinado ao apoio econômico de mulheres rurais, saltando de R$ 6,4 milhões em 2024 para R$ 38,7 milhões em 2025. Porém, para Carmela Zigoni, assessora política do Inesc, o recurso no ministério ainda é muito pequeno para as ações voltadas às mulheres.

A segurança pública também ganhou reforços. O Ministério da Justiça e Segurança Pública teve um aumento de 262% nos recursos para o programa "Casa da Mulher Brasileira", que combate a violência de gênero, passando de R$ 45 milhões para R$ 162,9 milhões. Além disso, um novo programa, chamado "Antes que Aconteça", foi introduzido com um orçamento inicial de R$ 810 mil para 2025.

Combate à fome também tem ações voltadas às mulheres. O programa "Apoio à Formulação e Gestão da Política Nacional de Cuidados" do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome teve um aumento de 67%. No PLOA de 2024 para ele constavam R$ 14, 9 milhões. Já o projeto enviado ao Congresso pelo governo para o orçamento de 2025 destina 25 milhões ao programa.

Estamos observando um esforço de reestruturação do orçamento para a política voltada às mulheres. O governo Bolsonaro enviou um orçamento muito baixo para todo o Ministério das Mulheres. Já o novo governo, no ano passado, aumentou esse recurso. Este ano, houve outro pequeno aumento e a previsão para o próximo ano é de novos incrementos.
Carmela Zigoni, assessora política do Inesc

Apesar do orçamento, pagamento feito para as políticas é baixo

Ministério das Mulheres enfrenta desafios na execução orçamentária. O programa "Igualdade de Decisão e Poder para as Mulheres" teve R$ 19 milhões autorizados para 2024, mas apenas R$ 5,4 milhões foram pagos até o momento. Para a reportagem, o ministério alegou que "cerca de R$ 2,7 milhões estão bloqueados, pois referem-se a emendas de comissão. Há também recursos relativos a emendas parlamentares individuais (cerca de R$ 3 milhões), que serão empenhados a partir da celebração de Termos de Fomento com organizações da sociedade civil (OSCs)."

Não houve ainda nenhum repasse do Ministério da Justiça para o enfrentamento à violência contra a mulher. Com um valor inicial de R$ 45 milhões para a ação de "Implementação de Iniciativas Voltadas ao Enfrentamento à Violência Contra Mulheres", nenhum valor foi empenhado ou pago até o momento. De acordo com o ministério, o valor é referente "a contratações que ainda estão pendentes de finalização da etapa licitatória, o que não acarreta prejuízo à política dada a quantidade de recursos investidos ao longo do ano em paralelo".

Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar também enfrenta baixa execução de recursos para mulheres rurais. A ação "Apoio à Organização Econômica e Promoção da Cidadania e o Bem Viver de Mulheres Rurais" teve uma dotação inicial de R$ 7,8 milhões, mas apenas R$ 292,6 mil foram empenhados e R$ 217,4 mil pagos.

O peso das emendas

As emendas parlamentares impositivas representaram a maior parte do orçamento do Ministério das Mulheres em 2024. Dados do Inesc apontam que dos R$ 375 milhões autorizados para os programas no ministério em 2024, cerca 73% desse recurso vieram dessas emendas, somando R$ 273,7 milhões. Os 27% restantes, cerca de R$ 90,8 milhões, foram provenientes do orçamento enviado pelo Executivo, que incluiu créditos adicionais.

A dependência das emendas impositivas gera incerteza no planejamento orçamentário. Zigoni destaca a falta de previsibilidade como um dos principais problemas. "O ministério precisa executar esses recursos extras, mas não pode planejar com antecedência, pois não sabe se eles virão novamente no ano seguinte. Isso gera instabilidade", afirmou.

A limitação orçamentária do Executivo também contribui para essa dependência das emendas. Com o arcabouço fiscal restringindo o orçamento enviado pelo governo, o poder Legislativo acaba tendo maior peso na alocação de recursos. Isso resulta em um cenário em que, muitas vezes, as emendas parlamentares ultrapassam o orçamento original do Ministério das Mulheres." As emendas estão sendo direcionadas para programas já existentes, o que é um alívio, pois facilita o planejamento", conclui a assessora política do Inesc.

Além disso, valor sofre contingenciamento. Sobre esses recursos, no entanto, incide o contingenciamento de julho que limitou os gastos do Ministério das Mulheres em R$ 267,7 milhões até setembro, ou seja, R$ 107,3 milhões a menos do que o valor total autorizado.

O governo pode bloquear recursos, mas se houver desbloqueios no final do ano, o ministério pode ter dificuldade em executar tudo em pouco tempo, o que é um risco.
Carmela Zigoni, assessora política do Inesc

Outro lado

O que diz o Ministério da Justiça:

"O financiamento das ações de enfrentamento à violência contra a mulher conta com uma multiplicidade de fontes no Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e várias iniciativas estão sendo executadas neste momento. Alguns exemplos:

  • Redução de crimes e investimentos: De janeiro a agosto de 2024, houve uma queda de 9,6% nos casos de estupro, de 9,4% nos feminicídios e 6,7% nos homicídios dolosos em comparação com o mesmo período de 2023. O Fundo Nacional de Segurança Pública repassou R$ 108 milhões para enfrentamento da violência contra a mulher, um aumento em relação aos R$ 107 milhões do ano anterior.

  • Estão sendo investidos R$ 450 milhões na construção de 40 Casas da Mulher Brasileira e R$ 33,5 milhões na doação de 300 viaturas para Delegacias da Mulher e Patrulhas Maria da Penha. Em junho, o Ministério da Justiça e o CNJ firmaram um protocolo para executar o programa "Antes que Aconteça" visando fortalecer a Lei Maria da Penha.
  • Em março de 2024, a Operação Átria aumentou em 63% os atendimentos às mulheres e resultou em 10,4 mil prisões e 68 mil medidas protetivas solicitadas. A Operação Caminhos Seguros, em maio, prendeu 775 pessoas e resgatou 197 crianças e adolescentes.
  • Em agosto, a Operação Shamar cumpriu 7.130 prisões de pessoas por feminicídio e violência doméstica, em todo o Brasil. Nesse período, 73.336 vítimas foram atendidas. O número de medidas protetivas de urgência solicitadas chegou a 49.542, e o de medidas protetivas de urgência acompanhadas foi de 956.
  • O investimento total foi de mais de R$ 2,3 milhões, por meio do aporte de diárias de policiais civis e militares para deslocamento com o objetivo de cumprir mandados de busca e de apreensão de acusados de feminicídio e de violência doméstica, sobretudo onde não há delegacia especializada. Com o recurso, também foram promovidas ações educativas de prevenção de casos de agressão em razão de gênero, como palestras e panfletagem. O que alcançou 3.895.175 pessoas.

O valor questionado (R$ 45 milhões) diz respeito a contratações que ainda estão pendentes de finalização da etapa licitatória, o que não acarreta prejuízo à política dada a quantidade de recursos investidos ao longo do ano em paralelo.

A fim de complementar a reportagem, sugere-se contatar as secretarias de segurança pública dos estados e do Distrito Federal para verificar como eles estão utilizando o valor repassado pelo Fundo Nacional de Segurança Pública para essa finalidade: R$ 107 milhões (2023) + R$ 108 milhões (2024)."

O que diz o Ministério das Mulheres: "O Programa 5661- Igualdade de Decisão e Poder para Mulheres é composto por duas ações: Ampliação da Participação Efetiva das Mulheres nos Espaços de Poder e Decisão (Ação 21GF) e Atividades do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (Ação 21GH).

Com relação ao orçamento já empenhado (cerca de R$ 11.2 milhões), parte dos recursos refere-se a convênios com estados e municípios, os quais podem ser pagos somente após o período de defeso eleitoral e de acordo com a programação financeira de cada convênio. Esses recursos incluem tanto convênios celebrados no âmbito de emendas parlamentares como investimentos em editais. Vale lembrar que em março deste ano o Ministério das Mulheres lançou o edital de Estruturação e Fortalecimento dos Organismos de Políticas Públicas para as Mulheres (OPM) com o aporte de R$ 3 milhões.

Os recursos já empenhados também incluem, entre outras despesas, investimentos em Termos de Execução Descentralizada (TEDs), cujos cronogramas de desembolso seguem os planos de trabalho de cada TED.

Com relação ao orçamento que ainda não foi empenhado, cerca de R$ 2.7 milhões estão bloqueados, pois referem-se a emendas de comissão. Há também recursos relativos a emendas parlamentares individuais (cerca de R$ 3 milhões), que serão empenhados a partir da celebração de Termos de Fomento com organizações da sociedade civil (OSCs).

Cabe ainda destacar que, além de formular, coordenar e executar políticas e diretrizes de garantia dos direitos das mulheres, a pasta atua de forma estratégica na articulação e no acompanhamento de políticas para as mulheres nas três esferas federativas. Dessa forma, para além de executar o orçamento próprio, uma das atribuições do MMulheres é atuar na articulação com outros órgãos e pastas para que desenvolvam políticas para as mulheres a partir das diretrizes da pasta."

O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar foi procurado pela reportagem, mas não se manifestou.

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