Testemunhas de Jeová podem votar na eleição? Entenda interpretação bíblica
As testemunhas de Jeová são instruídas a ter uma postura neutra em questões políticas —por isso, é comum que não votem nas eleições.
Entenda a crença
As testemunhas de Jeová se mantêm neutras em questões políticas, segundo suas crenças religiosas. Seguindo uma interpretação dos ensinamentos bíblicos, é comum que não votem, não concorram a cargos públicos e não participem de ações que possam influenciar governos.
As testemunhas de Jeová dizem não interferir no direito que outros têm de votar. Sobre votar em um candidato em uma eleição, um artigo da revista A Sentinela, voltada aos praticantes da religião, diz que cada testemunha de Jeová decide o que fazer "com base em sua consciência treinada pela Bíblia e no entendimento de sua responsabilidade para com Deus e o Estado".
Essa neutralidade é vista como uma expressão de devoção ao reino de Deus. As testemunhas de Jeová acreditam que a verdadeira solução para os problemas da Humanidade está no governo divino, e não em sistemas políticos humanos. Elas se referem à frase de Jesus: "Meu reino não é deste mundo" (João 18:36) para justificar essa postura.
As publicações oficiais das testemunhas de Jeová explicam que a neutralidade não é uma novidade. Segundo a crença, os primeiros cristãos também se mantiveram distantes da política, acreditando que sua lealdade era exclusivamente ao reino de Deus. Da mesma forma, as testemunhas de Jeová, hoje, acreditam que pregar as boas novas do Reino é a missão principal, reforçando a necessidade de neutralidade.
Para a religião, a neutralidade também é uma forma de promover a paz entre diferentes grupos. Como não se envolvem em debates políticos, as testemunhas de Jeová afirmam que podem pregar suas crenças para todas as pessoas, independentemente de suas ideologias políticas. O salmo 56:11 é citado como um exemplo de que confiar no reino de Deus é o caminho para resolver os problemas do mundo.
'Lealdade a Deus'
Essa postura não é exclusiva das testemunhas de Jeová, diz o professor Antonio Celso Baeta Minhoto, especialista em direitos fundamentais. Grupos religiosos como os budistas também tendem a evitar o envolvimento com o Estado. Para ele, essa neutralidade reflete uma busca por algo transcendente, que vai além das disputas políticas humanas.
Rodrigo Moraes, teólogo e pastor batista, oferece uma visão teológica sobre a neutralidade das testemunhas de Jeová. Segundo ele, esse comportamento é um reflexo de sua lealdade ao governo divino. "Elas seguem estritamente esse princípio, mantendo-se completamente fora dos processos políticos e militares, acreditando que sua lealdade deve ser exclusivamente ao reino de Deus."
Essa postura de neutralidade pode gerar tensão em sociedades onde o engajamento político é comum. O teólogo destaca que outras denominações, como a Igreja Católica e igrejas neopentecostais, acreditam que os cristãos devem influenciar os governos para moldar a sociedade segundo os princípios bíblicos.
Violência e abuso
Especialistas ponderam sobre o dilema de se manter neutro diante de situações de violência ou abuso. "É difícil definir até que ponto a neutralidade pode ser mantida em tempos de injustiça ou opressão", diz Minhoto. Ele explica que, em contextos como o regime soviético, as testemunhas de Jeová sofreram perseguições por se recusarem a participar de atividades militares ou políticas.
A postura de neutralidade também pode ser vista como uma ameaça por alguns governos. Moraes aponta que, em tempos de crise ou guerra, a participação política é frequentemente vista como sinônimo de lealdade ao Estado. Quando grupos como as testemunhas de Jeová decidem se abster, essa atitude pode ser interpretada como insubordinação ou falta de patriotismo. As testemunhas de Jeová, no entanto, afirmam que respeitam as autoridades e as leis civis, desde que não contradigam seus princípios bíblicos. "Elas pagam impostos, obedecem às leis e seguem o conselho bíblico de orar pelos governantes, mas sua lealdade final pertence ao reino de Deus, e não aos governos humanos", diz Moraes.