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Operações contra o Hezbollah deixam claro: o foco de Israel mudou para o norte

20/09/2024 07h25

A semana está muito movimentada na guerra atual do Oriente Médio. Cumprindo a promessa do ministro da Defesa Yoav Gallant, Israel mudou o "centro de gravidade" do conflito para o norte. Durante dois dias consecutivos, ataques a dispositivos móveis de comunicação do movimento paramilitar islâmico Hezbollah causaram quase 40 mortes e deixaram mais de 3 mil feridos no Líbano. 

Henry Galsky, correspondente da RFI em Israel

A RFI apurou que a avaliação das autoridades israelenses é que a resposta do Hezbollah não deve demorar para ocorrer. Diante disso, há um estado de prontidão das forças militares do país. Há registro da transferência de tanques e homens para a região norte do território israelense. 

Os ataques contra pagers e rádios de comunicação (walkie-talkies) do Hezbollah continuam a repercutir em toda a região. Mesmo a dois mil quilômetros de Israel, os rebeldes Houthis, do Iêmen, passaram a jogar fora alguns de seus aparelhos eletrônicos por temerem uma ação israelense similar a que ocorreu no Líbano. 

O xeque Hassan Nasrallah, líder do Hezbollah, respondeu por meio de discurso. Nasrallah classificou os ataques como  um "massacre sem precedentes" que cruzaram "todas as linhas vermelhas". Também se referiu às ações como uma declaração de guerra.  

Um ponto que chama a atenção em Israel é que ele parece ter "dobrado a aposta" ao reafirmar que vai continuar a atacar Israel com mísseis, drones e foguetes enquanto a guerra em Gaza prosseguir. Uma das fontes com as quais a RFI conversou disse que esta parece ser uma tentativa do líder do Hezbollah de "obter legitimidade internacional" para prosseguir com os disparos contra Israel.

"Deixe-me dizer ao governo israelense, ao exército israelense e ao povo israelense: Vocês não vão conseguir. Eu digo ao primeiro-ministro Netanyahu: Vocês podem fazer o que quiserem, vocês não vão conseguir. A única solução é interromper a agressão contra o povo de Gaza. Nenhuma escalada militar, nenhuma matança, nenhuma guerra total retornará seus colonos para a área da fronteira. Vocês sabem disso", declarou em discurso. Nasrallah também disse que a estrutura militar do grupo não foi afetada.

O líder do Hezbollah usa o termo "colonos" para se referir aos cidadãos de Israel de forma ampla, inclusive àqueles que vivem em território israelense reconhecido pela comunidade internacional. 

Enquanto Nasrallah fazia o seu discurso, aviões israelenses sobrevoaram Beirute a baixa altitude, quebrando a barreira do som. Israel também continuou os seus ataques aéreos no sul do Líbano, dizendo que tinha como alvo lançadores de foguetes do Hezbollah "prontos para serem usados ??imediatamente para disparar contra o território israelense". No total, afirmou ter atingido "cerca de 100 lançadores" e outras infraestruturas "representando cerca de 1.000 canhões" na quinta-feira.

Segundo a agência de notícias libanesa Ani, aviões israelenses atingiram o sul do Líbano pelo menos 52 vezes. Estes bombardeios foram os mais intensos já realizados na fronteira entre o Líbano e Israel desde outubro de 2023.

O Hezbollah, por sua vez, reivindicou na quinta-feira pelo menos 17 ataques contra 14 alvos militares no norte de Israel.

Israel se volta para o norte

As operações de ataque aos dispositivos móveis do Hezbollah ocorrem na semana em que Israel estabeleceu de forma oficial que o retorno dos moradores ao norte do país é um dos objetivos da guerra. 

Até agora, os três objetivos eram: a eliminação das capacidades militares e de governo do Hamas, a libertação de todos os reféns sequestrados pelo grupo palestino e mantidos em cativeiro desde 7 de outubro, e a criação de uma nova realidade de segurança na qual a Faixa de Gaza não represente mais uma ameaça a Israel.

Nesta quinta-feira (19), o chefe do Estado-Maior do Exército de Israel, Herzi Halevi, aprovou planos de batalha para a frente norte. Ou seja, os planos para uma guerra contra o Hezbollah. Uma fonte que pediu para não ter seu nome revelado disse à RFI que os ataques aos dispositivos móveis representam apenas parte do arsenal de ações do qual Israel dispõe e que há a possibilidade de "novas surpresas ainda serem colocadas em prática".  

O ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, conversou com o secretário de Defesa norte-americano, Lloyd Austin, e afirmou que as opções diplomáticas se esgotam, na medida em que o Hezbollah não muda sua posição fundamental desde que iniciou a guerra de atrito com Israel em 8 de outubro. O grupo aliado do Irã, que diz agir em solidariedade aos palestinos, declara de forma aberta que só irá interromper os ataques ao território israelense quando houver um cessar-fogo entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza. Nas palavras de Gallant, o Hezbollah está "amarrado" ao Hamas. O xeque Hassan Nasrallah reafirma esta posição. 

Enquanto isso, mais de 40% dos moradores do extremo norte de Israel - refugiados internos no país - dizem que não vão regressar à região mesmo após o fim da guerra.

"Não será possível devolver os residentes às suas casas sem uma mudança fundamental na situação de segurança", disse o primeiro-ministro Netanyahu em encontro com Amos Hochstein, enviado especial dos Estados Unidos e que tenta encontrar alguma alternativa diplomática para o confronto entre o Hezbollah e Israel.

França e EUA buscam acalmar as tensões

Após se reunir com o ministro das Relações Exteriores da França, Stéphane Séjourné, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, fez um apelo contra ações de escalada por qualquer uma das partes no Oriente Médio. Blinken fez referência justamente aos ataques atribuídos a Israel contra os dispositivos de comunicação dos membros do Hezbollah. 

"A França e os Estados Unidos se unem no apelo para conter e reduzir a tensão no que diz respeito ao Oriente Médio em geral e ao Líbano em particular", disse Blinken. 

O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller, diz que Washington pediria a Israel para interromper os ataques ao Hezbollah se a milícia parar de lançar foguetes contra o território israelense.

"Nasrallah poderia interromper os ataques terroristas em Israel, e eu garanto a vocês que, se ele fizer isso, nós pressionaremos Israel sobre a necessidade de manter a calma da parte deles", disse Miller aos jornalistas.

O presidente francês, Emmanuel Macron, expressou "profunda preocupação" de que os as explosões sem precedentes no Líbano contribuam para "uma perigosa escalada de tensões na região", de acordo com uma declaração oficial da Presidência Francesa.

França e Estados Unidos são dois dos principais países ocidentais que tentam há meses encontrar alguma saída diplomática para a guerra de atrito entre o Hezbollah e Israel, que já dura quase um ano. 

Israelense recrutado pelo Irã

Em meio a este ataque que utilizou meios inéditos, Israel descobriu que um cidadão do país havia sido recrutado pelo Irã. O empresário israelense Moti Maman, que viveu durante anos na Turquia, foi contratado pelo Irã para realizar atos terroristas que incluíam os assassinatos de diversas figuras políticas e da área de segurança, como o próprio primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, o ministro da Defesa Yoav Gallant, o chefe do Shin Bet, o serviço de segurança interno, Ronen Bar, o ex-primeiro-ministro Naftali Bennett e outras autoridades de Israel. As informações foram divulgadas pelo Shin Bet e pela polícia de Israel.

O empresário israelense está preso. Moti Maman tem 74 anos de idade e vivia em Ashquelon, cidade do sul do país. Segundo as investigações, ele tem dívidas de milhares de shekels, a moeda israelense.

Para realizar as missões, ele teria exigido um adiantamento no valor de US$ 1 milhão. Os iranianos também teriam pedido que ele executasse outras tarefas, como transferir dinheiro, armamento e fotografar lugares lotados.

Além disso, o empresário poderia passar a atuar como recrutador de cidadãos russos e norte-americanos que teriam como missão assassinar opositores do regime iraniano na Europa e nos Estados Unidos. Ele também buscaria um agente do Mossad, o serviço secreto de Israel, para atuar como agente duplo, ou seja, traindo os interesses israelenses.

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