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Reforma judicial no México reduz exigências acadêmicas e autoriza povo a eleger juízes

13/09/2024 09h33

O novo projeto será promulgado no domingo (15), dia da independência mexicana. De acordo com o governo, a implementação da reforma vai ocorrer em duas etapas, a partir de 2025. Horas depois da aprovação no Senado Federal, pelo menos 20 dos 32 estados mexicanos já haviam ratificado a mudança proposta pelo presidente López Obrador em fevereiro.

Larissa Werneck, correspondente da RFI no México

A reforma constitucional, aprovada em meio a várias polêmicas, será promulgada no próximo domingo. Entre as principais mudanças está a eleição por voto popular de juízes federais, além de outros cargos do Poder Judiciário.

A data não foi escolhida em vão. Quinze de setembro é o dia da Independência mexicana e o presidente utilizará a comemoração para celebrar a maior vitória do seu mandato, que chega ao fim no dia 1º de outubro.

Na manhã desta quinta-feira, durante uma coletiva de imprensa, Obrador reiterou a importância do projeto. "É uma reforma muito importante que reafirma que o México é uma autêntica democracia, onde o povo elege seus representantes e os servidores públicos dos três poderes".

Opositores do governo, setores da sociedade civil, organizações internacionais de direitos humanos e líderes governamentais de diversos países afirmam que a reforma judicial é uma ameaça à democracia mexicana.

Recentemente, o embaixador dos Estados Unidos no México, Ken Salazar, disse que ela pode também colocar em risco a relação comercial entre México, Estados Unidos e Canadá, prevista no T-MEC, o acordo comercial entre os três países.

"Um poder judicial fortalecido no México deve contar com juízes capazes de julgar casos complexos, como litígios e disputas comerciais. No entanto, a proposta elimina os requisitos necessários para ter os juízes mais qualificados", afirmou o embaixador.

Formação em direito, média oito e redução de tempo nos cargos

A reforma judicial modifica o artigo 95 da Constituição mexicana que estabelece os requisitos para serem eleitos ministros da Suprema Corte. Até então, eles eram nomeados pelo presidente da República e aprovados pelo senado.

Com a reforma, tanto ministros da Suprema Corte, como do Tribunal  Eleitoral, juízes federais e locais passam a ser eleitos por voto livre, direto e secreto, como ocorre nas eleições para presidente da República, deputados e senadores.

Além disso, para concorrer a funções do Poder Judiciário, será preciso ter apenas um diploma em Direito, nota oito de média nas matérias relacionadas ao cargo, cinco anos de prática jurídica e cartas de referência escritas por vizinhos ou colegas de trabalho.

Outra mudança é em relação ao tempo de permanência nos cargos. Os ministros eleitos para Suprema Corte poderão exercer suas funções por oito, onze ou catorze anos, dependendo do número de votos obtidos. Já os juízes federais e outros magistrados, como desembargadores, podem ficar nove anos no cargo, com direito à reeleição.

Segundo Carlos Mondragón, doutor em Direito Constitucional e professor da Faculdade de Direito da Universidade Nacional Autônoma do México, a reforma judicial desafia princípios fundamentais previstos na Constituição do país. Entre eles o caráter cognitivo do Poder Judiciário, ou seja, a capacidade de interpretar as leis.

"O Poder Judiciário tem duas funções principais. A primeira é resolver disputas entre cidadãos e a outra é garantir que as leis sejam aplicadas de acordo com a Constituição, inclusive pelos poderes Executivo e Legislativo. Dada essa última função, o Poder Judiciário deve ser independente e ter um processo de renovação distinto dos demais poderes do Estado", afirma o professor da UNAM.

Ele explica ainda que as interpretações judiciais têm caráter vinculante para toda a sociedade e desta forma é essencial que sejam realizadas por um órgão independente e especializado.

"A reforma judicial, ao aproximar a renovação dos juízes de cargos políticos temporários, pode comprometer a independência do Poder Judiciário e submeter suas decisões a pressões políticas. Se o Poder Judiciário perde a sua independência, enfraquece a sua capacidade de atuar como contrapeso ao poder político e de garantir que as leis sejam cumpridas de acordo com a Constituição", diz Carlos Mondragón.

Implementação será feita em duas etapas

A primeira eleição para o Poder Judiciário está prevista para junho de 2025 e será organizada pelo Instituto Nacional Eleitoral (INE). Os mexicanos vão eleger ministros da Suprema Corte, membros do novo Tribunal de Disciplina Judicial, metade dos juízes de primeira instância e desembargadores, entre outros. São cerca de 800 cargos. A outra parte será escolhida em 2027, durante as eleições para deputados federais.

Nesta quinta-feira, os ministros da Suprema Corte, que haviam suspendido os trabalhos em protesto contra a reforma judicial, anunciaram que vão retomar as atividades na próxima terça-feira (17). Outros funcionários do Poder Judiciário, que estavam em greve desde agosto, também anunciaram o fim da paralisação.

Já a presidente eleita Claudia Sheinbaum, afirmou em uma entrevista que os trabalhadores do Poder Judiciário terão os direitos respeitados, bem como o pagamento de salários e outros benefícios. "Estamos em um bom momento para que se renove o Poder Judiciário e para que ele esteja verdadeiramente a serviço do povo mexicano", afirmou a futura presidente.

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