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Brasil assume representação diplomática da Argentina na Venezuela após Maduro mandar fechar Embaixada

01/08/2024 07h40

A partir da tarde desta quinta-feira (1°), quando os cinco diplomatas argentinos em Caracas, expulsos pelo regime de Nicolás Maduro, deixarem a Embaixada da Argentina na Venezuela, o Brasil vai assumir, formalmente, a representação diplomática argentina, a pedido do governo do presidente Javier Milei.

Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Provisoriamente, os seis venezuelanos membros da equipe da líder opositora María Corina Machado, asilados políticos na Embaixada da Argentina desde março, ficarão sob a custódia do Brasil. 

A informação, divulgada na noite desta quarta-feira (31), foi confirmada à RFI por fontes da chancelaria argentina em Buenos Aires e celebrada em Caracas pela líder opositora, María Corina Machado.

"Agradecemos ao governo do Brasil pela sua disposição de assumir a representação diplomática e consular da República Argentina na Venezuela e a proteção da sua sede e residência, assim como a integridade física dos nossos companheiros asilados naquela residência. Isso poderia contribuir para avançar num processo de negociação construtiva e efetiva como a que o Brasil apoiou", publicou María Corina Machado nas redes sociais.

A responsabilidade que o Brasil assume tem três objetivos: garantir os direitos de cidadãos argentinos e de empresas de capitais argentinos em território venezuelano, proteger os seis venezuelanos asilados na residência diplomática argentina e atuar como intermediador entre a Venezuela e a Argentina que ficaram sem um canal de diálogo direto após o regime de Maduro expulsar do país os diplomatas argentinos.

O corpo diplomático argentino, integrado por cinco diplomatas, deixará a Venezuela na tarde desta quinta-feira num voo a Lisboa onde ficarão até sábado, retornando à Argentina, via Madri.

O motivo do périplo via Europa é consequência da falta de voos e porque a Venezuela fechou o espaço aéreo para voos com origem e destino à Argentina.

A responsabilidade do Brasil sobre os seis asilados políticos tende a ser provisória, até que um terceiro país aceite receber esses membros da equipe de María Corina Machado, refugiados na Embaixada da Argentina desde 20 de março.

Apelo ao mundo

Ao longo dos últimos quatro meses, a Argentina tentou um salvo-conduto que permitisse a saída dos asilados do país. O regime de Nicolás Maduro negou todos os pedidos até hoje. Sem o salvo-conduto, os seis venezuelanos poderiam ser presos pelo regime chavista assim que pusessem os pés fora da Embaixada.

"Denuncio com veemência o descumprimento da Convenção sobre Asilo Diplomático por parte da Venezuela. Apesar dos repetidos pedidos do nosso país, Maduro não permitiu a emissão de salvo-conduto para estes líderes da oposição perseguidos. Eles não têm autorização para sair com segurança do território venezuelano. O inconcebível é que Maduro impeça que os requerentes de asilo saiam com os diplomatas argentinos expulsos, algo previsto na Convenção de Caracas de 1954, no artigo 19º", acusou a ministra argentina das Relações Exteriores, Diana Mondino, na noite desta quarta-feira (31) em discurso na sessão de emergência da Organização dos Estados Americanos (OEA), onde a situação na Venezuela foi tratada.

A Argentina continua a pressionar pelo salvo-conduto, com a intenção de levar os asilados a uma terceira representação diplomática em Caracas, possivelmente de um ou mais países europeus, já que, além da Argentina, Maduro também expulsou os diplomatas de outros seis países latino-americanos: Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai.

"Dada a total falta de garantias, sem proteção da liberdade ou da integridade física dos nossos requerentes de asilo, a República Argentina alerta sobre as consequências desta situação. Apelo à solidariedade de todos os países para que colaborem com os esforços diplomáticos e com a proteção dos requerentes de asilo. A Argentina solicita à comunidade internacional que se esforce pelo cumprimento das normas internacionais que regem as relações diplomáticas entre os Estados", pediu a chanceler argentina.

Na segunda-feira (29), o regime de Maduro deu um ultimato para que todos os diplomatas dos sete países abandonassem o país em 72 horas. Os governos desses países foram acusados de "intromissão" e de "desconhecerem os resultados eleitorais".

No caso da Argentina, o ultimato limitou-se apenas aos diplomatas, sem incluir os seis venezuelanos sobre os quais há ordem de prisão.

"A permissão para sair do país abrange somente o pessoal argentino, que contará com todas as garantias para a sua retirada imediata do território nacional, e não possui nenhuma vinculação com a presença de cidadãos venezuelanos asilados nessa missão diplomática desde 20 de março de 2024", esclareceu a nota formal recebida pela Embaixada da Argentina em Caracas.

Guerra das Malvinas

Esta não é a primeira vez que o Brasil representa os interesses diplomáticos da Argentina. Em 1982, quando a Argentina e a Inglaterra romperam relações no contexto da Guerra das Malvinas, o Brasil assumiu a representação argentina em Londres, criando a Seção de Interesses Argentinos na Embaixada do Brasil, onde um diplomata argentino atendia os seus cidadãos.

Desta vez, no entanto, sem nenhum diplomata argentino em Caracas e diante da ameaça do regime de Maduro sobre os asilados, o Brasil deve assumir a Embaixada da Argentina, podendo, inclusive, erguer uma bandeira brasileira na sede argentina.

Assédio intimidatório

Desde segunda-feira (29), dia seguinte às eleições presidenciais, a sede diplomática da Argentina em Caracas foi alvo de ações intimidatórias. Um grupo de oficiais encapuzados do Departamento de Ações Estratégicas e Táticas (DAET) da Venezuela ameaçou invadir a residência da Embaixada argentina em Caracas.

No dia seguinte, o governo venezuelano cortou o fornecimento de energia elétrica da Embaixada argentina em Caracas.

"O assédio tem sido contínuo. A eletricidade foi cortada. Pessoas encapuzadas intimidaram. Todos nós vimos os detalhes. E lembro, não a esta sala, mas ao regime do Sr. Maduro, que é obrigação do Estado receptor salvaguardar as instalações da missão diplomática contra intrusões, danos e preservar a sua tranquilidade e dignidade", advertiu a chanceler argentina, Diana Mondino, durante discurso na OEA.

A pedido da opositora María Corina Machado, militantes formaram uma proteção humana ao redor da Embaixada argentina.

"Atenção! Forças policiais do regime rodeiam a embaixada argentina na Venezuela. (Fazemos) um chamado aos vizinhos para impedi-lo. Alertamos ao corpo diplomático na Venezuela", publicou María Corina Machado.

Enquanto isso, a ministra argentina pediu a ajuda do Brasil. Em Caracas, o assessor especial do Presidente Lula, Celso Amorim, intercedeu pela Argentina.

Cúmplice de Maduro

Apesar dos pedidos da Argentina, tanto de interceder perante o governo venezuelano quanto de assumir a sede diplomática, o presidente Javier Milei criticou os presidentes do Brasil, da Colômbia e do México por não condenarem o regime de Nicolás Maduro no Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA), reunido nesta quarta-feira (31) em Washington.

Pela falta de um voto, a sessão não conseguiu condenar a fraude eleitoral do regime. Brasil e Colômbia se abstiveram, enquanto o México ficou ausente. Por 17 votos a favor, 11 abstenções e 5 ausentes, a resolução da OEA não foi aprovada.

Milei acusou indiretamente os presidentes Lula, Gustavo Petro e Andrés Manuel López Obrador de "cúmplices" de Nicolás Maduro quer sejam por "ignorantes", quer sejam por "estúpidos".

"Alguns imbecis me acusaram de louco por ver comunismo em todos os lados", começou Milei a sua publicação nas redes sociais ao repostar uma mensagem que responsabiliza os três líderes pelo resultado da votação na OEA. E concluiu: "Fica claro que esses são cúmplices, seja porque são ignorantes e/ou por serem estúpidos".

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