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Venezuela se fecha para observadores em eleição presidencial mais importante em três décadas

27/07/2024 17h45

A Venezuela realiza neste domingo (28) as eleições mais importantes em três décadas para o futuro do país e também para a região. Dez candidatos concorrem à presidência, mas as pesquisas apontam uma disputa polarizada entre o presidente Nicolás Maduro, que busca um terceiro mandato, e o opositor Edmundo González Urrutia, que aspira a acabar com 25 anos de governos chavistas. O assessor especial da presidência brasileira, Celso Amorim, está em Caracas para acompanhar a votação.

Maduro, de 61 anos, sucessor do líder socialista Hugo Chávez, falecido em 2013, busca um novo mandato que o levaria a passar 18 anos no poder. Ele sobreviveu a uma crise econômica monumental e protestos da oposição que resultaram em centenas de mortes, em meio a denúncias de violações dos direitos humanos. Maduro é ameaçado de derrota por González Urrutia, um diplomata de 74 anos, inscrito de última hora pela aliança Plataforma Unitária para representar a ex-deputada liberal María Corina Machado, que está impedida de ocupar cargos públicos e tem sido a força motriz por trás da campanha da oposição.

A tensão cresceu nas útimas horas com o veto à entrada de observadores internacionais e à deportação de autoridades. Na sexta-feira (26), o presidente panamenho, José Raúl Mulino, denunciou que autoridades venezuelanas impediram a decolagem do aeroporto de Tocumen de um voo da Copa Airlines que tinha entre seus passageiros ex-governantes latino-americanos que pretendiam monitorar a votação. O grupo era composto pelos ex-presidentes Mireya Moscoso (Panamá), Miguel Ángel Rodríguez (Costa Rica), Jorge Quiroga (Bolívia) e Vicente Fox (México), todos membros da Iniciativa Democrática da Espanha e das Américas (Grupo Idea) e fortes críticos do governo de Maduro.

"O avião estava cheio, completamente cheio de venezuelanos que viajavam para votar", relatou Moscoso durante uma coletiva de imprensa. "Vimos lágrimas, pessoas chorando nos pedindo: 'Por favor, fiquem, não vão embora!'."

O ex-presidente mexicano Fox considerou o acontecimento um "mau sinal para domingo". Na quarta-feira, o poderoso dirigente chavista Diosdado Cabello adiantou que seria impedida a entrada do grupo na Venezuela.

O governo chileno, por sua vez, enviou na noite de sexta-feira uma nota de protesto à Venezuela por negar a entrada no país dos senadores conservadores José Manuel Rojo Edwards e Felipe Kast, que viajaram para atuar como observadores e foram enviados de volta ao Chile. "Isso demonstra que todas as palavras de alguns que dizem que isto é uma democracia são simplesmente uma grande mentira", afirmou Kast.

Além disso, dez congressistas e eurodeputados do Partido Popular (PP) espanhol, assim como uma parlamentar da Colômbia e outra do Equador, denunciaram sua deportação ao chegarem no aeroporto de Maiquetía, que serve a Caracas.

Esses incidentes se somam aos alertas que despertaram na região após a advertência de Maduro sobre "um banho de sangue" caso a oposição vença, palavras pelas quais os presidentes do Brasil e do Chile, Luiz Inácio Lula da Silva e Gabriel Boric, expressaram preocupação.

Diante da escassez de observadores internacionais de peso, a chegada a Caracas do assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, na noite de sexta-feira, faz do brasileiro uma figura central na votação deste domingo.

Votação tensa

Os locais de votação serão abertos às 6h locais (7h de Brasília) e fechados às 18h (19h), horários que podem ser estendidos enquanto houver eleitores na fila. Cerca de 21 milhões de eleitores estão aptos a votar, em uma população de 30 milhões, distribuídos em mais de 30 mil mesas de votação em todo o país. No entanto, de acordo com projeções de especialistas, cerca de 17 milhões de eleitores devem participar do pleito. Embora os venezuelanos no exterior tenham direito ao voto, muito poucos poderão exercê-lo, pois menos de 70 mil estão registrados nos consulados.

Nos últimos anos, a Venezuela enfrentou uma migração em massa devido a uma crise que reduziu seu PIB em 80% entre 2013 e 2020. Mais de 7 milhões de pessoas deixaram o país na última década, segundo a ONU. O salário médio no setor privado é de cerca de 150 dólares por mês, enquanto o mínimo é de apenas 4 dólares mensais, com bonificações adicionais que o elevam para cerca de 130 dólares. Analistas temem que uma vitória de Maduro possa desencadear uma nova onda migratória.

Autoridade eleitoral

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão encarregado da organização da votação, tem uma direção composta por cinco membros, três deles alinhados ao chavismo e dois à oposição. O presidente chavista do CNE, Elvis Amoroso, esteve envolvido na inabilitação de María Corina Machado e outros líderes opositores. Amoroso foi sancionado pelos Estados Unidos em 2017.

O processo eleitoral é automatizado, com resultados centralizados pelo CNE. A oposição classificou como fraudulenta a reeleição de Maduro em 2018, e boicotou o processo. Na época, os Estados Unidos, a União Europeia e vários países da América Latina não reconheceram Maduro como presidente.

As Forças Armadas

Uma das grandes incógnitas no atual processo eleitoral diz respeito à reação das Forças Armadas. O grito "Chávez vive!" se tornou uma saudação oficial entre os militares que apoiam Maduro.

Chávez, militar que liderou um golpe de Estado fracassado em 1992, chegou ao poder por meio de eleições, ao vencer a disputa de dezembro de 1998. Durante seu governo (1999-2013), ele aumentou a influência política das Forças Armadas, uma linha seguida por Maduro, permitindo que a hierarquia militar ocupasse numerosos cargos estatais, inclusive na vital indústria petrolífera. Maduro dependeu em grande parte dos militares para conter grandes manifestações de opositores, em 2014 e 2017, em meio a violentos distúrbios nas ruas.

"A Força Armada Nacional Bolivariana me apoia", reafirmou o presidente esta semana, enquanto González Urrutia pediu aos militares que "respeitem e façam respeitar" o resultado das eleições, enquanto as pesquisas o apontam como favorito.

A diplomacia

Maduro tenta normalizar as relações internacionais da Venezuela, alvo de sanções dos Estados Unidos que incluem um embargo ao petróleo desde 2019. Os governos do presidente Lula no Brasil, de Gustavo Petro na Colômbia e de Gabriel Boric no Chile têm pressionado por eleições transparentes e justas na Venezuela.

Washington mantém sua posição oficial, que vincula a suspensão das sanções a eleições competitivas. Contudo, na opinião de muitos observadores, os Estados Unidos gostariam de normalizar suas relações com a Venezuela para recuperar o país como fornecedor de petróleo, em um contexto de tensão internacional devido às guerras na Ucrânia e no Oriente Médio.

Com AFP

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