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Rende pouco perto de dívidas: fuga da poupança soma R$ 230 bi em 3 anos

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto
do UOL

Alexandre Novais Garcia

Do UOL, em São Paulo (SP)

08/07/2024 04h00

A caderneta de poupança completou sete semestres consecutivos com saques maiores do que depósitos. As perdas são justificadas pela baixa rentabilidade da caderneta e o ainda elevado nível de inadimplência da população.

O que aconteceu

Os saques da poupança superaram os depósitos em R$ 2,8 bilhões no primeiro semestre de 2024. O resultado foi originado pela aplicação de R$ 2,03 trilhões e a retirada de R$ 2,04 trilhões no período.

Com a sequência negativa, a caderneta amarga o sétimo semestre consecutivo de perdas, que totalizam R$ 229,3 bilhões desde janeiro de 2021.

Caderneta só teve resultado positivo de depósitos em 12 dos últimos 42 meses, mostra Banco Central. No período, o volume de aplicações superou por mais de dois meses consecutivos apenas uma vez, entre abril e julho de 2021. A sequência limitou a perda total da poupança naquele ano para R$ 35,5 bilhões. Em 2022 e 2023, as captações líquidas foram negativam em, respectivamente, R$ 103,2 bilhões e R$ 87,8 bilhões.

Liberação do Auxílio Emergencial durante a pandemia ajuda a explicar o movimento. No ano de 2020, o benefício distribuído para as famílias de baixa renda em meio ao distanciamento social era depositado em contas-poupança, impulsionando o desempenho da aplicação. "Houve um grande fluxo de capital por parte do governo, que distribuiu dinheiro de forma muito concentrada. As sobras ficaram canalizadas, principalmente, na poupança", declara Marcelo Guterman, especialista de investimentos da Western Asset.

Com perda de R$ 33,6 bilhões, janeiro de 2023 é o pior mês de toda a série, iniciada em 1995. O movimento é reflexo da sazonalidade da aplicação, que conta com a entrada de recursos em todos os meses de dezembro devido ao pagamento do 13º salário. Para a maioria dos trabalhadores, a remuneração extra é depositada em uma conta-poupança.

Os saques recordes em janeiro estão associados aos altos gastos desse período, incluindo impostos como IPVA e IPTU, matrículas escolares, compra de material escolar e despesas de férias.
Reinaldo Domingos, presidente da DSOP Educação Financeira

Sequência de resultados negativos resulta na queda de 2,3% do saldo final das cadernetas. O volume, que permaneceu acima de R$ 1 trilhão entre setembro de 2020 e julho de 2022, voltou a superar a marca com a entrada de R$ 12,8 bilhões no mês de junho (R$ 1,011 trilhão). Ainda assim, o valor segue abaixo do recorde de R$ 1,035 trilhão alcançado em dezembro de 2020.

Baixa rentabilidade

A fuga da poupança é associada ao baixo retorno da aplicação. Com a taxa básica de juros fixada acima de 8,5% ao ano desde dezembro de 2021, a caderneta rende 0,5% ao mês + TR (Taxa Referencial). A norma faz com que a aplicação tenha um rendimento na faixa de 7% ao ano, patamar inferior à rentabilidade de opções que oferecem igual segurança e a possibilidade de resgate a qualquer momento.

População que amplia conhecimento se afasta da poupança. A educadora financeira Camilla Magrini avalia que a diversificação de conteúdos com a informação de que a caderneta não é investimento contribui para as perdas da aplicação após a pandemia. "As pessoas que buscam informação estão realmente fugindo da poupança", observa ela.

Investidores mais informados buscam alternativas com melhores retornos, resultando em saques contínuos das cadernetas de poupança.
Reinaldo Domingos, presidente da DSOP Educação Financeira

Mesmo diante do cenário, a poupança segue como queridinha. Segundo dados do último Raio-x do Investidor, da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), a caderneta é o produto financeiro mais utilizado do Brasil. Presente na rotina de quase sete em cada dez (68%) investidores, a aplicação aprece significativamente acima dos títulos privados (13%), dos fundos de investimento (12%) e das moedas digitais (10%).

A preferência por poupança se dá nas gerações mais antigas, aqueles que estão acima de 63 anos, os boomers. Se a gente pega as gerações mais novas, a preferência pela poupança vem diminuindo, com uma baixa a preferência na geração Z. Os mais novos estão adeptos a outros investimentos.
Camilla Magrini, economista e educadora financeira

Especialistas citam alternativas mais atrativas e de igual liquidez. Para driblar o baixo retorno da poupança, os potenciais investidores têm boas opções disponíveis no mercado financeiro. Entre os ativos citados, aparecem os títulos do Tesouro Direto devido à alta liquidez e segurança, os CDBs (Certificados de Depósito Bancário) diários e os fundos com baixa taxa de administração. "Se você ficar anos na caderneta, vai perder dinheiro", diz Guterman.

É fundamental que os investidores busquem educação do comportamento financeiro para entender melhor cada tipo de investimento e alinhem suas escolhas aos seus objetivos e perfil de risco. Só assim poderão tomar decisões mais informadas e estratégicas, garantindo maior segurança e rentabilidade para seus investimentos.
Reinaldo Domingos, presidente da DSOP Educação Financeira

Inadimplência

O atual nível de população com as dívidas atrasadas é outro fato determinante para a poupança. Em maio, quatro em cada dez brasileiros adultos (41,8%), percentual equivalente a 68,76 milhões de pessoas, segundo a CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas). O nível reafirma o maior número de inadimplentes de toda a série histórica da pesquisa.

Se a pessoa tem algum recurso guardado na poupança e ela está endividada, ela vai retirar para suprir o seu fluxo de caixa.
Camilla Magrini, economista e educadora financeira

Ajuda a familiares e amigos endividados também é lembrada. "Muitas pessoas acabam sacando dinheiro da poupança para ajudar parentes e amigos em dificuldades financeiras, prática comum que demonstra a falta de educação financeira", reforça Reinaldo Domingos.

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