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PMs denunciados no Rio: o que é racismo estrutural e como ele se manifesta?

do UOL

Colaboração para o UOL*

08/07/2024 04h00

Um grupo de adolescentes, com idade entre 13 e 14 anos, foi abordado por policiais militares armados em Ipanema, Rio de Janeiro (RJ), na noite de quarta-feira (3). Ao UOL, a mãe de um dos jovens descreveu a ação como "racista" e "criminosa".

O que é racismo estrutural?

Abrange o conjunto das várias formas de racismo que estruturam a sociedade. Racismo estrutural é termo usado para reforçar o fato de que existem sociedades estruturadas com base na discriminação que privilegia algumas raças em detrimento das outras. Termo abrange o conjunto das várias formas de racismo que estruturam a sociedade e naturalizam no imaginário coletivo que o lugar do negro está ligado à servidão ou à criminalidade.

Distinção favorece os brancos e desfavorece negros e indígenas. Essa estrutura social que possibilitou a manutenção do racismo ao longo da história, inclusive do Brasil, pode ser contada a partir das próprias leis do país —algumas delas são da época em que os negros eram escravizados, é claro, mas outras vieram depois da abolição.

Erro histórico

Brasil foi o último país das Américas a aderir à libertação das pessoas escravizadas. A população negra que vivia aqui se viu livre após Lei Áurea, de 1888, porém sem opções de emprego ou educação.

Antes, em 1824, Constituição dizia que escola era um direito de todos os cidadãos, o que não incluía povos escravizados. Já em 1850, a Lei de Terras permitiu ao Estado a venda de espaços agrários a custos altos. Como as pessoas negras poderiam, em condições de precariedade total, cultivar o próprio alimento?

Objetivo de "branquear" a população brasileira. Lei previu, mais tarde, subsídios do governo à vinda de colonos europeus para viverem e trabalharem no Brasil.

Sem educação ou trabalho. Se, antes da abolição, a legislação parecia não ter relação direta com o racismo, em 1890, com as primeiras leis penais da República, isso ficou evidente. Sem terras, educação ou trabalho, os negros que eram encontrados na rua ou que praticassem a capoeira podiam ser presos. Era a chamada Lei dos Vadios e Capoeiras.

Lei Caó tornou o racismo um crime inafiançável. A primeira vez em que a legislação contribuiu, de fato, para a democracia racial no Brasil ocorreu apenas em 1989, quase um século depois, quando a Lei Caó tornou o racismo um crime inafiançável e imprescritível.

Racismo é um processo histórico que modela a sociedade até hoje. Prova disso é o contraste explícito entre o perfil da população brasileira e sua representatividade no Congresso —enquanto a maior parte dos habitantes é negra, a maioria do Congresso é branca.

Racismo é crime?

O crime de racismo está previsto na Lei n. 7.716/1989. Consiste em atingir uma coletividade indeterminada de indivíduos, discriminando toda a integralidade de uma raça. É inafiançável e imprescritível.

Injúria racial. A Lei nº 14.532, de 11 de janeiro de 2023, equiparou o crime de injúria racial, que consiste em ofender a honra de alguém valendo-se de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem, ao crime de racismo. A nova lei também prevê que crimes previstos nela "terão as penas aumentadas de 1/3 até a metade quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação".

Já o racismo estrutural, em si, não é crime. Existem situações em que você consegue compreender e identificar que esse racismo estrutural está presente. Ainda assim, por mais que o racismo estrutural não seja tipificado, em casos como o dos adolescentes no Rio de Janeiro, é possível, a partir do contexto do evento criminoso, aplicar alguns qualificadores do racismo.

A lei, porém, não é suficiente para resolver o problema. Racismo é algo maior do que discriminação ou preconceito, já que diz respeito a formas nem sempre conscientes e também coletivas de desfavorecer negros e indígenas e privilegiar os brancos.

Fontes: Irapuã Santana, doutor em Direito Processual pela UERJ; Gabriel Sampaio, coordenador do Programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas Direitos Humanos.

*Com informações de reportagens publicadas em 19/11/2019, 12/12/2020 e 09/11/2023

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