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Dólar reage com queda forte à ação da 'turma do deixa-disso' sobre Lula

do UOL

Colunista do UOL

03/07/2024 14h05Atualizada em 03/07/2024 18h14

A cotação do dólar terminou a quarta-feira (3) em queda, ao mesmo tempo em que a Bolsa encerrou o pregão em alta. O dólar fechou a R$ 5,57, recuo de 1,71% sobre o dia anterior. Na mínima do dia, a moeda americana chegou a valer R$ 5,54, queda de mais de 2,15%.

Pode ser um sinal de que os operadores trabalham com informações de que o presidente Lula pode baixar a bola nos ataques que tem dirigido ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Os pregões cambiais ao redor do mundo registraram queda da moeda americana nesta tarde. O recuo do dólar ante o real ficou entre os mais acentuados: de 1,71% no final da sessão. A divisa fechou o dia cotada a R$ 5,568.

Baixando a bola

Todas as indicações são de que uma força tarefa do "deixa-disso", próxima a Lula, entrou em campo para interromper o estresse em que o mercado e seus agentes se encontram.

Como revelou a jornalista Monica Bergamo, Lula se encontrou, no fim de semana, em São Paulo, fora da agenda, com o ministro da Fazenda, Haddad, integrantes de sua equipe e economistas de fora do governo para tratar de questões da economia, incluindo trajetória do dólar e relacionamento com o BC.

Para a noite desta quarta (3), está prevista nova reunião, com a mesma pauta, esta mais institucional, com a JEO (Junta de Execução Orçamentária), composta, além de Haddad, pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, a da Gestão e Inovação, e da Casa Civil, Rui Costa.

Sem medidas heroicas

Se Lula acatar os conselhos e sugestões para evitar novos embates com Campos Neto e o mercado financeiro, nenhuma medida heroica para segurar o dólar será adotada. O que Lula já ouviu a quem pediu conselhos e sugestões é que nem intervenção direta do BC no mercado cambial, nem imposição de barreiras à circulação de capitais — por exemplo, aplicar um IOF na saída de dólares — fazem sentido ou possam ser eficazes, neste momento.

Haddad e sua equipe consideram que reduzir incertezas na condução da economia que agitam o mercado financeiro seria o caminho para que os pregões voltassem a operar dentro da normalidade, e com mais base nos chamados fundamentos da economia. Reduzir incertezas é a tradução para a declaração do ministro, na segunda-feira (1), atribuindo as pressões no mercado cambial a "ruídos de comunicação".

Dissolver incertezas

Na avaliação da Fazenda, uma dessas incertezas dizia respeito à meta de inflação para anos à frente, definida em reunião do CMN (Conselho Monetária Nacional), em fins de junho. A confirmação da meta de 3% para cada ano, com adoção de um regime de avaliação contínuo — não mais no período do ano civil —, foi bem aceita.

Subsistem incertezas, reconhecidas na Fazenda, vinculadas à política fiscal. Essas incertezas promoveram uma antecipação da discussão do Orçamento de 2025, que costuma ocorrer em agosto, para o fim do primeiro semestre. O plano é ir dissolvendo-as a seu devido tempo.

Há dúvidas no mercado, por exemplo, se o governo contingenciará ou bloqueará recursos na próxima avaliação bimestral de receitas e despesas, prevista para daqui a duas semanas.

No mercado, estima-se que cortes capazes de recuperar alguma credibilidade no cumprimento da meta de déficit primário zero em 2024, terão de vir pelo menos em torno de R$ 10 bilhões, num total de cerca de R$ 30 bilhões no conjunto do ano.

Há informações de que o governo anunciará o contingenciamento sugerido, ou até maior, com vistas a reduzir a fatia que teria de ser cortada em setembro, já na proximidade das eleições municipais.

A definição de Lula sobre o indicado para suceder Campos Neto, na presidência do BC, a partir de 2025, é mais uma incerteza que o presidente está sendo instado a anunciar o quanto antes.

Também se sabe que a Fazenda redobrará esforços para convencer o mercado de que, para a obtenção do déficit primário zero, será preciso revisar gastos, mas a agenda de incremento das receitas não acabou com a devolução pelo Senado da MP (Medida Provisória) que limitava a utilização de créditos de PIS/Cofins para abatimento de impostos.

Nessa linha de argumento, são citados ajustes em benefícios previdenciários, que somaram mais de R$ 7 bilhões neste ano, e outros cortes, como um de R$ 2 bilhões no Proagro. Também é mencionada a desoneração da folha de pagamentos de 17 setores econômicos. O veto do Executivo à prorrogação do benefício foi derrubado no Senado, mas os efeitos do veto foram mantidos pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que obrigou o Senado a apresentar alternativas até agosto.

Além disso, argumenta-se no governo, que ainda há espaço para ampliar receitas, uma vez que a carga tributária está abaixo da registrada em 2022.

Crise mais política que econômica

Ainda é muito cedo para concluir que o recuo de 1,8% nas cotações do dólar, na sessão desta quarta-feira (3), se deve apenas à ausência de trocas de farpas entre Lula e Campos Neto. Mas o tombo da cotação reforça a constatação de que a atual crise nos mercados pouco tem a ver com economia.

De economia mesmo, o único ponto de influência relevante nas cotações do dólar é a demora do Fed (Federal Reserve, banco central americano) em determinar cortes nas taxas de juros de referência nos Estados Unidos, e as dúvidas sobre o ritmo e o nível desses cortes. A manutenção das taxas dos "Fed funds" em ponto mais alto aspira dólares do mundo inteiro em direção ao mercado americano, desvalorizando as moedas locais.

Na crise atual do dólar, os agentes do mercado, entupidos de dúvidas sobre a condução da economia, resolveram testar Lula e Lula replicou na mesma moeda (sem trocadilho).

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