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OPINIÃO

Escalada do dólar mostra que Lula e Campos Neto deveriam baixar a bola

do UOL

Colunista do UOL

29/06/2024 04h00

Mais um dia de alta forte nas cotações do dólar. No fim da sessão desta sexta-feira (28), a moeda americana valia R$ 5,60, com alta de mais de 1,5%, em relação ao dia anterior. No ano, o real já desvalorizou perto de 15% ante dólar. Só em junho a perda do real ante o dólar chegou quase a 7%.

Enquanto o Fed (Federal Reserve, banco central americano) vacila em definir quando iniciar os cortes na taxa de referência e o ritmo desses cortes, o dólar tem se valorizado no mundo inteiro, principalmente no cotejo com as moedas de países de economias emergentes.

Brasil é caso especial

Mas o Brasil tem sido um caso especial. O real, neste primeiro semestre, perde diante do dólar mais do que quase todas as moedas de economias emergentes. É evidente que questões internas estão influindo na acelerada marcha da desvalorização da moeda brasileira.

Nesta sexta-feira, último dia útil do mês, o vencimento de diversos ativos, a começar do real ante o dólar, é parte da explicação para a intensificação das perdas da moeda brasileira. A Ptax, taxa de referência média diária, calculada pelo Banco Central, é, como diz o nome, referência para reajustes de diversos contratos cambiais ? contratos de dólar futuro, derivativos de dólar, contratos de importação e exportação etc.

A Ptax do último dia do mês será a referência para os contratos do mês seguinte. Daí a sessão do último dia do mês movimentar mais o mercado cambial do que nos outros dias. Operadores representantes de investidores "comprados" (apostaram na alta do dólar) ou "vendidos" (apostaram na queda da cotação) tentam puxar a cotação para cima, comprando dólares, ou para baixo, vendendo dólares.

A alta da Ptax em junho, superior a 6%, dá uma boa dica de uma outra causa para a escalada do dólar ante o real: a escalada na guerra de discursos entre o presidente Lula e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Escalada de acusações

Lula já tinha atacado Campos Neto no início de seu governo, nos primeiros meses de 2023, acusando o presidente do BC de operar para manter altas as taxas básicas de juros (taxa Selic), prejudicando a economia. A partir de maio deste ano, voltou a se queixar de Campos, subindo o tom dos ataques, quando o presidente do BC indicou a interrupção do ciclo de cortes da Selic.

Campos Neto reagiu, também com discursos crescentemente agressivos, culpando Lula pela pressão sobre o câmbio. Nesta sexta-feira, Lula avançou um sinal que não deveria ter avançado, sugerindo intenção de interferir no BC em 2025, quando o presidente e a maioria da diretoria da instituição terão sido indicados por ele.

Também nesta sexta-feira, Campos Neto não só reafirmou sua avaliação da culpa de Lula pelo estresse no mercado de câmbio, como avançou, também onde não deveria ter avançado, com críticas à política fiscal do governo. Reforçou com isso os temores do mercado financeiro sobre o cumprimento das metas fiscais estabelecidas, com o consequente desarranjo da política econômica.

Bagunça institucional

A instalação dessa verdadeira bagunça institucional, protagonizada pelo presidente da República e o da Autoridade Monetária, mostra que já passou da hora de que baixar a bola. A prova de que os discursos de Lula e de Campos, ambos fora dos limites institucionais, estão provocando instabilidades na economia pode ser localizada na discrepância entre os indicadores bem razoáveis da situação econômica e a intensificação de manobras especulativas no mercado cambial.

No evidente esfriamento da fervura que a situação está pedindo, é possível que uma intervenção pontual do BC no mercado cambial seja recomendável, basicamente para conter a volatilidade — não a direção das cotações, o que é inútil. Não é raro que os mercados financeiros vivam momentos de "efeito manada".

Este parece ser um desses momentos, e interrompê-lo é tarefa dos responsáveis pela política monetária do país. Como os comunicados do Copom (Comitê de Política Monetário) recomendam em todos os seus comunicados para a condução da política de juros, o momento pede serenidade e moderação.

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