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Taxar bilionários é caminho para a justiça climática, diz Nobel de economia

Esther Duflo, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia de 2019 - Patrick Kovarik/AFP
Esther Duflo, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia de 2019 Imagem: Patrick Kovarik/AFP
do UOL

De Ecoa, em São Paulo (SP)

27/06/2024 04h00

Foi citando o show da Taylor Swift no Rio de Janeiro que a Nobel de economia Esther Duflo, 51, começou sua palestra no Sesc 14 Bis, na região de central de São Paulo, nesta quarta-feira (26).

"O aquecimento climático não é um problema do futuro, é um problema de agora", disse ao se referir ao calor extremo que marcou a passagem da artista pelo Brasil e resultou na morte de uma fã.

O que levou Duflo a ser a segunda mulher mais jovem a vencer um prêmio Nobel em economia, em 2019, foi sua pesquisa sobre a vida econômica de pessoas em situação de pobreza e vulnerabilidade.

No Sesc, ela palestrou sobre o impacto das desigualdades sociais nas mudanças climáticas.

Ninguém passa calor igual

"As pessoas que menos contribuem com as mudanças climáticas são as que mais sofrem com seus efeitos", disse Duflo enquanto expunha no telão do teatro Raul Cortez um mapa mostrando que os países mais ricos do norte do globo sofrem menos com ondas de calor que países do sul.

Países, empresas e pessoas mais ricas têm maior pegada de carbono, ou seja, emitem mais CO2 porque podem bancar um padrão de consumo maior. Para a economista, isso deveria fazer com que esses agentes fossem os responsáveis por financiar políticas de mitigação e de enfrentamento às mudanças do clima.

"Há uma desigualdade extraordinária entre emissores. Um estadunidense rico emite 122 vezes mais carbono do que alguém pobre que vive no continente africano", contou.

Para exemplificar ainda mais essa desigualdade, a economista lembrou que são os 10% mais ricos que emitem mais de 50% dos poluentes e o reflexo disso, por outro lado, é visto mais entre as pessoas vulnerabilizadas.

"As mudanças climáticas não afetam todos da mesma maneira", disse a economista diante de uma enorme fotografia que mostrava trabalhadores retirando recicláveis de um lixão em primeiro plano, enquanto grandes prédios apareciam ao fundo em um dia ensolarado.

A economista fez a plateia que a assistia lembrar que, mesmo na mesma cidade, as mudanças climáticas são sentidas de forma distinta entre as pessoas. Afinal, quem trabalha em um escritório terá um ar-condicionado disponível em dias quentes, enquanto trabalhadores mais precarizados estarão mais expostos ao calor nas ruas.

Esther Duflo, Nobel de economia, no Sesc 14 Bis - Adauto Perin/Sesc 14 Bis - Adauto Perin/Sesc 14 Bis
Esther Duflo, Nobel de economia, no Sesc 14 Bis
Imagem: Adauto Perin/Sesc 14 Bis

A dívida dos países ricos: US$ 500 bilhões

Se os mais pobres sofrem devido à pegada de carbono dos mais ricos - sejam países, empresas ou pessoas - quanto e como fazer com que os responsáveis paguem por isso?

Com essa pergunta, Esther Duflo e sua equipe do centro de pesquisa Abdul Latif Jameel Poverty Action Lab (J-PAL) decidiram calcular, primeiramente, um valor de compensação que chegou a US$ 500 bilhões.

Esse dinheiro poderia ser arrecadado por meio de tributação de carbono cobrado de empresas e pessoas bilionárias.

"Os bilionários são pouco taxados, e tributar os mais ricos é uma proposta bastante popular. Pesquisa recente mostrou que 85% dos europeus são favoráveis e 65% dos americanos também o são", comentou a economista.

Por um lado, essa seria a melhor forma de arrecadar esse dinheiro; por outro, distribuí-lo de forma igualitária seria um desafio a ser superado.

Durante a pandemia de covid-19, os países mais ricos investiram 27% do PIB em ações de combate ao vírus e distribuição de renda, enquanto os países mais pobres investiram apenas 2%, disse Duflo.

"Se os mais ricos ajudassem os mais pobres a atingir seu patamar de investimento, isso custaria apenas 10% do que eles já investiram", destacou. "Temos dificuldade em mostrar solidariedade aos países pobres".

Pensando nisso, a proposta da Nobel de economia é a distribuição direta dos valores para as famílias afetadas por catástrofes decorrentes das mudanças do clima, sem intermediação dos doadores e sem intermediação até mesmo do Banco Mundial.

"Não se trata de doação, não é caridade, os países ricos devem isso", finalizou.

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