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Do luto à luta contra as queimadas: a história de uma brigadista pantaneira

27/06/2024 13h03

Débora dos Santos Ávila perdeu um filho bebê de cinco meses que adoeceu pelos piores incêndios registrados no Pantanal em 2020. Quatro anos depois, ela se tornou brigadista e enfrenta as chamas na maior área úmida do mundo para que sua história não se repita. 

"Na verdade, eu não gostava dos brigadistas. Eu queria culpar alguém por conta do meu filho", explica à AFP esta mulher, de 42 anos, durante uma pausa para descansar do combate às queimadas históricas que afligem a região ao sul da Amazônia.

Mas "quis entrar e estou trabalhando como brigadista tem dois anos" durante o período mais crítico dos incêndios. "Eu sei que muitas crianças sofrem com essa fumaça, como o meu filho. Eu quero fazer o que puder para diminuir a fumaça", explica.

Seu bebê adoeceu e morreu devido à fumaça inalada durante as queimadas, que em 2020 devastaram 30% da superfície do Pantanal, terra de onças, jacarés e outras espécies, e reconhecida pela Unesco como Patrimônio Natural da Humanidade.

Este ano, a situação é duplamente preocupante porque a temporada de incêndios começou mais cedo. Desde janeiro foram registrados mais de 3.400 focos, número muito superior ao do primeiro semestre de 2020 (2.523).

"Está difícil. No ano passado nesta época nós estávamos nas escolas orientando, dando educação sobre o meio ambiente, para não atear fogo, (trabalhando com) a prevenção na verdade. A gente não estava no combate direto" como agora, observa esta mulher, que no resto do ano trabalha como cozinheira em uma ONG.

De uniforme amarelo e com facão na mão, Débora, única mulher no contingente de 45 brigadistas do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PrevFogo)/Ibama, abre caminho em meio à mata fechada na direção de um enorme incêndio com cerca de 7 km de extensão, detectado na véspera na zona rural de Corumbá, no Mato Grosso do Sul.

Em seguida, ela se equipa com um soprador, dispositivo portátil movido a combustível que os brigadistas usam para dispersar a matéria orgânica que se deposita no subsolo e alimenta as chamas.

Todo cuidado é pouco, pois o calor perto do fogo é intenso e os ventos fortes fazem as chamas mudarem de direção e se alastrarem rapidamente. 

- "Penso nos meus netos" - 

Com a ajuda de aeronaves Air Tractor, cedidas pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio) e o Ibama para combater as queimadas deste ano no Pantanal, a equipe de Débora consegue controlar o fogo. Depois, os brigadistas passam um pente fino no terreno queimado e reviram a terra com enxadas para exterminar qualquer possível foco no subsolo, antes de partir para o combate do próximo incêndio, em jornadas que podem se estender de manhã cedo até tarde da noite. 

Segundo o coordenador do PrevFogo/Ibama no Mato Grosso do Sul, Márcio Yule, a partir desta quinta-feira (27) começam a chegar os cem brigadistas do Ibama vindos de diversos estados como Goiás, Rondônia, Rio de Janeiro e Bahia. Além disso, o governo federal também prevê enviar bombeiros dos estados que compõem a Força Nacional. 

Nascida e criada em Corumbá - ou "Pantaneira mesmo", como se define - , Débora admite que agora "ama" o ofício. "Quando eu estou ali, penso nos meus netos" que virão, diz esta mulher que já tem uma neta, orgulhosa de ser a primeira mulher de sua equipe.

"Meus companheiros não fazem essa diferença (de gênero). Ali (no combate aos incêndios) somos todos iguais" afirma, com um sorriso. 

mvv/app/aa

© Agence France-Presse

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