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Sob iniciativa privada, cânions no Sul perdem turistas com ingresso a R$ 94

Parque de Cambará do Sul (RS) - Hygino Vasconcellos/UOL
Parque de Cambará do Sul (RS)
Imagem: Hygino Vasconcellos/UOL
do UOL

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o TAB, de Cambará do Sul (RS)

11/04/2023 04h01

Todo fim de semana, cerca de oito ônibus turísticos costumavam parar perto da padaria Dois Irmãos, em Cambará do Sul (RS), cidade de pouco mais de 6.000 habitantes que atrai um frenesi de turistas interessados nos cânions Itaimbezinho, no parque nacional Aparados da Serra, e Fortaleza, na Serra Geral. Ou melhor, atraía.

"Num dia já esgotava tudo", lembra Leonardo Oliveira da Silva, 32, que administra a padaria. Hoje, porém, o movimento da cidade caiu de 2.000 para cerca de 300 visitantes, diz o empresário. O faturamento da confeitaria despencou 50% e, pela primeira vez em quase uma década, ele passou a fechar as portas no domingo à tarde.

Para a família Silva, um dos motivos para a queda abrupta no movimento na cidade é o aumento dos ingressos para os parques, que foram concedidos à iniciativa privada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), em 2021. Hoje, o bilhete custa R$ 94; para idosos, R$ 65 — o passe dá direito a três acessos aos dois parques nacionais no período de sete dias. Antes da concessão, a entrada era gratuita.

Susana da Silva, 59, sócia da padaria e mãe de Leonardo, acrescenta outro fator: as condições das estradas. Para chegar ao parque Aparados da Serra, por exemplo, é preciso pegar um trecho de terra batida da RS-427, um percurso com pedras soltas e buracos. "O momento que estragar teu carro, tu não volta nunca mais. Tem prejuízo de R$ 2.000 e pensa: 'Na próxima vez vou a Gramado, que é tudo asfaltado'", diz Leonardo.

Os uruguaios Rita Poggi, 63, e Oracio Sardeña, 70, estiveram nos cânions do Itaimbezinho no primeiro fim de semana de abril. O casal, que pagou bilhetes para idosos, diz que o parque seria mais convidativo se os preços fossem mais populares.

O trajeto até lá também "foi complicado". "Parece que a estrada é assim para vir pouca gente", relata Sardeña. "A gente até achou que estivesse no caminho errado", complementa Poggi.

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Imagem: Hygino Vasconcellos/UOL

'Procura mínima'

O trecho de 16 km que liga a cidade ao cânions deve ser pavimentado até 2027, informa uma placa ao fim do trecho asfaltado. A obra deve custar R$ 29,7 milhões. "Quando a estrada estiver pronta, Cambará vai despontar", espera Kelly Castan, 51, proprietária da pousada Vista do Vale Chalés.

Entretanto, as obras ainda não começaram. "Inicialmente foi necessário superar uma série de entraves junto ao Ibama e ICMBio para a obtenção da licença ambiental do primeiro trecho", informa o Daer (Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem).

Há 22 anos no mercado, Giovane Klippel, 50, relata uma queda de 70% na busca de transporte turístico para a cidade. "O valor dos ingressos é muito alto. No futuro, quando melhorarem as estradas e a estrutura dos parques, aí, sim, poderia cobrar um valor alto, mas no momento teria que ser mais acessível", diz ele, que preside a Aeturcs (Associação de Empreendedores Turísticos de Cambará do Sul).

Parque de Cambará do Sul (RS) - Hygino Vasconcellos/UOL - Hygino Vasconcellos/UOL
O casal uruguaio Rita Poggi e Oracio Sardeña, no cânion do Itaimbezinho
Imagem: Hygino Vasconcellos/UOL

As agências de viagens também sentiram, diz um empresário de 35 anos que pediu anonimato por temer represálias. A empresa dele teve uma queda de 90% na procura por passeios guiados aos cânions — neles, os visitantes são levados num veículo 4x4, com água, guia e seguro, por R$ 300 o casal.

Agora, com a cobrança de ingresso, um casal gasta quase R$ 200 só para entrar no parque; com o serviço da agência, o total fica cerca de R$ 500. "A maioria das agências não está fazendo mais esse tipo de passeio, porque a procura é mínima", conta ele, que dispensou dois de seus três guias.

Já no Cambará Eco Hotel, a ocupação dos quartos teve "uma variação pequena", segundo o gerente de marketing, Emiliano Fernandes Brugnera. "O valor impacta na cidade. A gente entende que esse valor está excessivo. Poderia ser bem menos ou ter mais flexibilidade."

Kelly Castan, da pousada Vista do Vale, em Cambará do Sul (RS) - Hygino Vasconcellos/UOL - Hygino Vasconcellos/UOL
Kelly Castan, proprietária da pousada Vista do Vale, em Cambará do Sul (RS)
Imagem: Hygino Vasconcellos/UOL

'Atrativo por natureza'

Outros empresários ouvidos pelo TAB consideram a cobrança de ingresso "justa" e atribuem a queda no movimento a outros fatores.

Para Marcelo Sartori, 49, é reflexo da disputa com novos destinos turísticos nos arredores. "Vacaria, cidade vizinha, que era só de fazendeiro, já tem passeio de balão. Pessoal dispersou", opina.

Cambará do Sul virou "refúgio" para quem queria trabalhar home office no início da pandemia de covid-19, diz Claudia Dreher, 58. Segundo Sartori, entretanto, depois dessa alta, as empresas não conseguiram manter as portas abertas: "Inflou porque tinha movimento para todo mundo. Só que quando recuou, não tem como desinflar, e aí não tinha serviço para todo mundo. O que eles fazem? Reclamam que não tem serviço para todo mundo. É essa a realidade da cidade".

Também há empresárias que atribuem a crise à "situação política e econômica" do país desde fins de 2022.

A Urbia Parques, que administra a concessão, informa que não cogita reduzir o preço dos ingressos, diz o diretor comercial Samuel Lloyd.

"O que nós pretendemos fazer é aumentar a atratividade desse destino", assinala, citando como exemplos as melhorias em estruturas existentes e o investimento em estruturas temporárias, como banheiros e futuras tirolesas. "O principal atrativo já foi feito pela natureza, então nós precisamos apenas melhorar a experiência de quem vai."

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Imagem: Hygino Vasconcellos/UOL

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