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Em meio à crise hídrica, Brasil pode ficar sem sistemas de monitoramento do cerrado

30/08/2021 17h45

O cerrado brasileiro pode ficar sem dois de seus principais sistemas de monitoramento de desmatamento devido à falta de recursos. O fim do Deter e do Prodes, ambos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), trará sérios riscos à preservação da savana mais biodiversa do mundo, que já perdeu mais da metade de sua cobertura original. O dano ambiental traria também graves consequências econômicas para o Brasil. 

Por Ana Carolina Peliz, da RFI

O cerrado é considerado a "caixa d'água" do Brasil. A bacia do rio Paraná, que alimenta a usina de Itaipú, depende diretamente de nascentes que se encontram neste bioma. O nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas no país conhece uma diminuição histórica, devido à falta de chuvas e também à destruição da vegetação da região central, como alerta Cláudio Almeida, coordenador do sistema de monitoramento da Amazônia e demais biomas do Inpe. 

Ele explica que a vegetação nativa do cerrado, de aparência pequena, tem um sistema de raízes muito extenso, como uma "floresta invertida". Essas plantas conseguem buscar água no lençol freático que se encontra em grande profundidade. 

"Quando você corta essa vegetação, você perde parte dessa capacidade de buscar água no subsolo para trazê-la para as nascentes", ele explica. De acordo com o especialista, em anos mais secos, como é o caso de 2021, isso tem impactos na disponibilidade hídrica. 

Essa falta de água influencia a capacidade do país de gerar energia e já pode ser sentida no dia a dia dos brasileiros, pelo aumento da conta de luz e pela ameaça de um apagão. 

Monitoramento em perigo

O Inpe mantém programas de monitoramento de biomas há 30 anos, voltados principalmente para a Amazônia Legal. "Há alguns anos expandimos a outros biomas. Entretanto, devido à difícil situação orçamentária que o país vive, a gente não conseguiu que houvesse uma expansão do recurso dentro do orçamento", revela o especialista do Inpe. 

Uma doação do Programa de Investimento em Florestas (FIP), administrado pelo Banco Mundial, permitiu que o monitoramento funcionasse por cinco anos, prazo que irá se encerrar em dezembro de 2021. Com isso, os pesquisadores do Inpe buscam Meios para conseguir manter o projeto. 

Para garantir a continuidade do monitoramento, Almeida pleiteia recursos no orçamento da União. "Por enquanto, oficialmente, ainda não existe nenhum aporte de recursos. Por outro lado, continuamos conversando com parceiros internacionais e doadores", ele conta.

Impactos econômicos e para a biodiversidade

O impacto de um possível apagão em um país que tenta retomar o desenvolvimento econômico em meio à crise sanitária da Covid-19 seria seriamente sentido também pelo setor rural, por falta de recursos hídricos, atingindo esse importante segmento para a balança comercial brasileira. "O agronegócio depende da disponibilidade hídrica e da ocorrência de chuvas para produzir", explica Almeida. 

Ele lembra que o monitoramento, além de controlar o desmatamento, também é usado para provar a conformidade ambiental, as práticas sustentáveis. "Hoje, cada vez mais, as empresas estão interessadas não só na qualidade do produto, mas na qualidade de onde o produto foi produzido", diz. "Ter um monitoramento oficial garante que o bom produtor, aquele que está respeitando a legislação, possa dizer que o Inpe garante que a área em que ele produz está livre de desmatamento", completa. 

Mas principalmente, monitorar o cerrado é importante por questões ligadas à preservação da biodiversidade. "É um bioma que está inteiramente dentro do Brasil, então tem espécies e ecossistemas que existem somente no cerrado. Se ele deixar de existir, eles desaparecerão", lamenta Almeida.

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