Temer vira réu na Justiça do DF por caso da mala de R$ 500 mil
O ex-presidente Michel Temer (MDB) virou réu hoje por corrupção passiva, na 15ª Vara Federal do Distrito Federal, no processo que apura se ele era um dos beneficiários de propina da empresa JBS. O juiz federal substituto Rodrigo Parente Paiva Bentemuller recebeu a denúncia apresentada pelo MPF-DF (Ministério Público Federal do Distrito Federal). Leia a íntegra da decisão. O ex-presidente sempre negou todas as acusações (leia mais abaixo).
A ação ficou conhecida como "caso da mala", porque o ex-assessor de Temer e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil das mãos do executivo da companhia Ricardo Saud. O MPF afirma que, no total, os pagamentos de propina poderiam atingir o valor de R$ 38 milhões ao longo de nove meses.
Segundo o juiz que recebeu a denúncia, os relatos e documentos colhidos pela investigação "evidenciam a materialidade do crime imputado".
Verifico que há substrato probatório mínimo que sustenta a inicial acusatória, existindo, portanto, justa causa para a deflagração da ação penal
juiz federal substituto Rodrigo Parente Paiva Bentemuller
Apesar de receber a denúncia, o magistrado registrou que essa decisão não analisa o mérito da investigação. "O reconhecimento da aptidão formal da denúncia e a constatação da presença de justa causa não conduzem qualquer juízo de condenação", escreveu em seu despacho.
A denúncia foi apresentada pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot em 2017. Como Temer ainda era presidente e detinha foro privilegiado, o STF (Supremo Tribunal Federal) submeteu a investigação ao crivo da Câmara dos Deputados, que barrou a denúncia.
Com a saída de Temer, a denúncia foi encaminhada à primeira instância. Na última terça (26), o MPF-DF reiterou a denúncia na justiça federal, que aceitou hoje.
Rocha Loures já era réu nesta ação desde dezembro de 2017. Em agosto daquele ano, o ministro Edson Fachin, relator do caso no STF, desmembrou as situações do ex-deputado e de Temer.
O encontro de Temer e Joesley
A denúncia do MPF remonta a um encontro entre Temer e Joesley Batista, um dos donos da JBS, no Palácio do Jaburu, em março de 2017. Batista gravou o ex-presidente indicando que Rocha Loures era seu homem de confiança. Para a Procuradoria, Loures atuou como um intermediário de Temer, tanto na negociação quanto no recebimento da propina.
O áudio ainda tinha a frase "tem que manter isso aí" de Temer, supostamente avalizando a compra do silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (MDB). Temer alega que a declaração era apenas um conselho para Joesley manter um bom relacionamento com Cunha.
Segundo os procuradores, Temer e Batista discutiram sobre pagamentos indevidos a um juiz e um procurador da República. As investigações ainda apontam para a atuação de Loures para que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) desse uma decisão favorável a uma empresa do grupo JBS, "em suposta prática anticompetitiva da Petrobras, relacionada à aquisição de gás natural da Bolívia", de acordo com o MPF.
Mais denúncias
Além da denúncia aceita hoje, outra peça foi apresentada à Justiça pelo MP. Em outubro de 2017, a Câmara arquivou a abertura de investigação por obstrução de justiça e organização criminosa, em um inquérito também derivado dos áudios da JBS.
Nos próximos dias, o ex-presidente pode ser denunciado novamente, no caso que o levou à prisão por quatro dias na semana passada em um desdobramento da Operação Lava Jato no Rio. O emedebista é investigado por supostos contratos fraudulentos nas obras da usina nuclear de Angra 3.
Outro lado
O advogado de defesa de Temer, Eduardo Carnelós, afirmou que a denúncia aceita hoje pela 15ª Vara Federal do DF é a primeira acusação após a "sórdida operação com a qual se pretendeu depor o então presidente da República", referindo-se às investigações derivadas da gravação de Joesley Batista.
Segundo Carnelós, "como tudo que nasceu daquela operação ilegal e imoral, essa imputação também é desprovida de qualquer fundamento, constituindo aventura acusatória que haverá de ter vida curta, pois, repita-se, não tem amparo em prova lícita nem na lógica."
*Com reportagem de Alex Tajra, do UOL, em São Paulo